Portugal já retirou 12 dos 16 civis no Afeganistão e restantes sairão em breve
A grande maioria dos portugueses retirados trabalhava para a segurança da delegação da União Europeia.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, afirmou esta segunda-feira que dos 16 civis portugueses que estavam no Afeganistão, 12 já saíram do país e quatro continuam em funções operacionais no aeroporto de Cabul.
Doze portugueses “já foram retirados, a grande maioria trabalhava para a segurança da delegação da União Europeia” em Cabul, explicou à Lusa, adiantando que “falta retirar alguns portugueses que ainda estão em actividade operacional no aeroporto”.
Sublinhando que Portugal não tem, “neste momento, nenhum motivo de preocupação com essa dimensão de portugueses civis que ainda estão em Cabul”, Santos Silva garantiu que os que ainda estão naquele país “serão retirados proximamente, à medida que as actividades de controlo do tráfego aéreo no aeroporto de Cabul deixarem de ser responsabilidade da comunidade internacional”.
Portugal está ainda, de acordo com o ministro dos Negócios Estrangeiros, a fazer uma identificação dos afegãos que colaboraram com a comunidade internacional e que, “portanto, possam correr risco de vida ou de segurança”.
O ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, afirmou no domingo que Portugal vai integrar a operação da União Europeia e da NATO para proteger cidadãos no Afeganistão e está disponível para receber afegãos. Segundo Gomes Cravinho, o número de refugiados a receber em Portugal ainda está a ser avaliado, mas a força portuguesa destacada no país nos últimos anos somava “243 funcionários afegãos, mais as suas famílias”. Com este cenário, declarou, existem “cerca de mil pessoas que precisarão de sair do país”.
O ministro dos Negócios Estrangeiros referiu à Lusa que esse trabalho de identificação e ajuda aos colaboradores está a decorrer e lembrou que, “hoje, haverá uma reunião em Bruxelas ao nível dos embaixadores, no comité de política de segurança”, na qual a questão deverá ser debatida.
A situação no Afeganistão será ainda debatida na terça-feira numa reunião extraordinária dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos 27, na qual Portugal será representado pela secretária de Estado dos Assuntos Europeus, já que Santos Silva está de férias.
A hora da diplomacia
O ministro dos Negócios Estrangeiros considerou ainda inaceitável que o Afeganistão volte a ser um santuário de grupos terroristas, mas considera que é preciso usar a diplomacia para exigir aos taliban que cumpram regras nacionais e internacionais.
“O Afeganistão não pode tornar-se, de novo, um santuário de movimentos terroristas. Isso deve ser claro para todos, claro para a comunidade internacional, para a NATO, para a União Europeia e esperamos que seja também claro que as novas autoridades afegãs quando elas estiverem constituídas”, afirmou Augusto Santos Silva em declarações à agência Lusa.
O ministro lembrou que os taliban garantiram que o seu regresso ao poder não significa “risco de vida e segurança para as pessoas ou para a situação das mulheres e, em particular, do seu direito à educação” e que, de acordo com o movimento radical islâmico, não haverá um retorno da violência ao Afeganistão.
“Vamos ver se essas declarações são credíveis”, disse Santos Silva, acrescentando que é preciso ver “em que condições se faz a transição de poder”.
Para o ministro dos Negócios Estrangeiros português, agora “é hora de pôr em prática todos os instrumentos da política externa da União Europeia e da diplomacia” para que “a transição de poder no Afeganistão seja o menos problemática possível” e para que “as novas autoridades do Afeganistão cumpram a sua própria palavra”.
Questionado sobre o nível de confiança que tem nessas declarações dos taliban, Santos Silva reiterou que “agora é hora de pedir e exigir das novas autoridades afegãs que cumpram as suas responsabilidades nacionais e internacionais e de pôr toda a diplomacia ao serviço dessa causa”.
Por outro lado, adiantou o ministro, será necessário também dedicar atenção aos afegãos que colaboraram com a comunidade internacional nos últimos 20 anos.
“É preciso cuidar, em particular, dos muitos milhares de afegãos que colaboraram connosco ao longo destes anos e que estão hoje inquietos, preocupados, aflitos. É hora de apoiá-los e protegê-los”, afirmou.
Por isso, referiu, “Portugal foi dos primeiros países a assinar uma declaração” que já conta com 65 países subscritores, na qual se adverte os taliban de que devem dar mostras de responsabilidade e permitir a saída dos cidadãos afegãos e estrangeiros que queiram fugir do país.
O ministro considerou ainda que o resultado da operação que levou a NATO e a União Europeia a permanecerem no Afeganistão durante cerca de duas décadas deve ser alvo de “um debate político”.
“Uma operação de praticamente 20 anos no Afeganistão que, de facto, conseguiu resultados muito importantes - conseguiu acabar com o santuário da Al-Qaida no Afeganistão, conseguiu melhorias muito importantes nos níveis de vida e nas condições de vida dos afegãos, conseguiu avanços muito importantes no respeito dos direitos das mulheres e perspectivas de futuro para as crianças e jovens - mas não terá conseguido um dos seus resultados principais que foi capacitar as instituições do Afeganistão, incluindo as suas Forças Armadas e de segurança para defenderem o seu próprio país e civilização”, descreveu.
“Mas hoje, a esta hora — que é uma hora difícil para todos — é altura de reafirmar o nosso sistema de alianças”, afirmou, lembrando que “as forças armadas portuguesas prestaram um contributo muito importante à causa da pacificação do Afeganistão”, tendo sido, inclusive, “perdidas duas vidas”.
“Agora temos de agradecer e recordar o esforço das nossas Forças Armadas e afirmar que nós somos membros da Aliança Atlântica. Com a Aliança Atlântica entrámos, com a Aliança Atlântica saímos”, concluiu.
Depois de várias ofensivas iniciadas em Maio deste ano, na sequência do anúncio dos Estados Unidos da retirada final dos seus militares do Afeganistão, os taliban conquistaram no domingo a última das grandes cidades que ainda não estavam sob seu poder - a capital, Cabul -, tendo esta segunda-feira declarado o fim da guerra no Afeganistão e a sua vitória. O Presidente afegão, Ashraf Ghani, abandonou o país no domingo, quando os taliban estavam às portas da capital, enquanto os líderes do movimento radical islâmico se apoderavam do palácio presidencial.
A entrada das forças taliban em Cabul pôs fim a uma campanha militar de duas décadas liderada pelos Estados Unidos e apoiada pelos seus aliados, incluindo Portugal. As forças de segurança afegãs, treinadas pelos militares estrangeiros, colapsaram antes da entrada dos taliban na cidade de Cabul. Milhares de afegãos, em Cabul, tentam fugir do país e muitos dirigiram-se para o aeroporto internacional onde a situação é caótica.