Afinal, quem é considerado astronauta? Jeff Bezos e Richard Branson ainda não são
Estados Unidos apertam as regras para a obtenção do estatuto de astronauta e não consideram os fundadores da Blue Origin e da Virgin Galactic como detentores do título. Pelo menos para já.
O fundador da Amazon, Jeff Bezos, pode ter criado uma empresa privada de voos espaciais, financiado o desenvolvimento de novos foguetões e cápsulas e concretizado o sonho de ir, tecnicamente, ao espaço, mas isso não o torna num astronauta. Pelo menos para já.
De acordo com a Administração Federal de Aviação (FAA), uma das três entidades norte-americanas (além da NASA e das Forças Armadas dos EUA) que pode validar o estatuto de astronauta de um indivíduo, há três requisitos principais de elegibilidade para astronautas comerciais. E nem Jeff Bezos, que na terça-feira foi ao limiar do espaço espreitar a Terra por uma janela a 100 quilómetros de altitude, nem o empresário britânico Richard Branson, que alguns dias antes tinha feito o mesmo, podem ser chamados de astronautas.
Cada entidade tem uma definição diferente para designar alguém como astronauta. No caso da NASA e das Forças Armadas, essa distinção é habitualmente reservada para funcionários seus (e, excepcionalmente, civis) que cumpram critérios específicos.
Numa directiva que entrou em vigor a 20 de Julho, o mesmo dia do voo da comitiva da Blue Origin, a FAA definiu três requisitos principais para a elegibilidade de astronautas comerciais. Os membros da tripulação do lançamento comercial devem ser contratados por uma empresa certificada pela FAA para o realizar, o voo deve atingir uma altitude superior a 50 milhas (pouco mais de 80 quilómetros) acima da superfície da Terra e a tripulação deve realizar actividades “essenciais para a segurança pública ou que contribuíram para a segurança dos voos espaciais durante a missão”, elenca a entidade norte-americana em comunicado.
As restrições têm implicações importantes para a indústria dos voos espaciais privados e, como descreve a BBC, são um autêntico balde de água fria para os sonhos de alguns exploradores espaciais bilionários em se tornarem astronautas. Segundo estas regras, os turistas espaciais que paguem por viagens suborbitais ou orbitais não podem receber as famosas asas de astronauta. Além disso, será a FAA a decidir o que conta como actividades essenciais para a segurança pública ou para a segurança dos voos espaciais, o que poderá excluir os voos turísticos de Branson e Bezos.
O voo de Branson, a bordo do avião espacial Unity, movido por foguetão produzido pela sua própria empresa, a Virgin Galactic, foi designado como um voo de teste, algo que poderá ajudar a cumprir a exigência da FAA de que os membros da tripulação devem realizar tarefas que contribuam para a segurança dos voos espaciais humanos.
Branson e os restantes companheiros de viagem — Beth Moses, instrutora principal da Galactic, Colin Bennett, engenheiro de operações principal, Sirisha Bandla, vice-presidente de assuntos governamentais e os dois pilotos foram Dave Mackay e Michael Masucci — são todos funcionários da Virgin Galactic e, durante a viagem, atingiram uma altitude de cerca de 53 milhas, o que faria cumprir as restantes regras.
O caso do fundador da Amazon é mais complicado. Bezos viajou a bordo do foguete e cápsula New Shepard da Blue Origin com três outros passageiros: o irmão, Mark, o jovem holandês Oliver Daemen, de 18 anos, e a ex-piloto norte-americana Wally Funk, de 82 anos.
O voo da Blue Origin cumpre pelo menos um requisito: chegou às 62 milhas (100 quilómetros) ou à chamada linha de Kármán, que é usada para definir o limite entre a atmosfera terrestre e o espaço exterior. No entanto, o foguetão e a cápsula New Shepard foram projectados para voar de forma autónoma (tudo é controlado a partir da Terra), o que significa que os passageiros não realizam nenhuma tarefa essencial durante o voo. O pai de Daemen também pagou pela viagem do filho ao espaço suborbital, o que exclui automaticamente o adolescente holandês da lista de possíveis candidatos ao estatuto de astronauta.
Ainda assim, é possível que seja aberta uma excepção para Funk que, na década de 60, fez parte de um programa privado, com outras 12 mulheres, em que passou pelo treino dado aos astronautas da NASA. Nunca conseguiu ir ao espaço, no entanto, já que a NASA só admitia pilotos de teste de jactos com diplomas de engenharia, para as missões espaciais, e as mulheres não podiam, na altura, desempenhar essas funções.
E há esperança para os restantes aspirantes a astronautas. A FAA pode ainda conceder asas de astronauta honorárias a “indivíduos cuja contribuição para o voo espacial humano comercial merece um reconhecimento especial”.
As asas de astronauta foram atribuídas pela primeira vez aos astronautas Alan Shepard Jr e Virgil Grissom no início dos anos 1960 pela participação no programa Mercury Seven. No caso de Bezos e Branson, os símbolos que receberam depois dos seus voos não são oficiais e foram feitos pelas próprias empresas.