Irlanda admite juntar-se ao acordo para tributar empresas multinacionais

Ministro das Finanças irlandês afirma que ainda há “muito trabalho pela frente” até Outubro. Comissão Europeia congela trabalhos para criar imposto digital.

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Janet Yellen marcou presença no Eurogrupo e reuniu-se com Paschal Donohoe antes da reunião EPA/STEPHANIE LECOCQ

A Irlanda ficou de fora do acordo de princípio para a reforma da tributação das multinacionais, mas admite negociar nos próximos meses para acrescentar o seu nome à lista das 131 jurisdições que subscreveram o entendimento alcançado sob o chapéu da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

Depois de uma reunião de trabalho em Bruxelas na segunda-feira com a secretária de Estado do Tesouro norte-americana, Janet Yellen, o ministro das Finanças irlandês, Paschal Donohoe, afirmou que a Irlanda “continuará a participar nas negociações” até Outubro, quando se espera que os governos finalizem o acordo já subscrito por 131 das 139 jurisdições envolvidas nas discussões. E espera chegar a um “melhor” acordo.

Apesar de se ter auto-excluído neste primeiro momento, Dublin sempre deixou a porta aberta a entrar no barco. “É do interesse da estabilidade e dos princípios de que falámos hoje [segunda-feira] com a secretária Yellen que se chegue a acordo, e eu farei a minha parte para ver se a Irlanda pode participar e se podemos apoiá-lo mais tarde durante o ano”, explicou Donohoe, citado pelo Irish Times.

Dublin está de acordo com o primeiro pilar da reforma fiscal, mas opõe-se à forma como está desenhado o segundo pilar, a definição de um patamar mínimo de IRC a nível global de “pelo menos 15%”.

No primeiro são definidas regras para haver uma distribuição dos direitos de tributação sobre os lucros das multinacionais, para que os países onde os produtos são consumidos ou onde os serviços são prestados possam ganhar o direito a tributar uma parte dos resultados das maiores e mais rentáveis empresas a nível global, mesmo que as multinacionais não tenham uma presença física nessas jurisdições.

No segundo pilar, os governos pretendem travar a transferência de lucros para jurisdições de baixa ou nula tributação e conter o planeamento fiscal agressivo, através da criação de uma taxa efectiva mínima de IRC a que as multinacionais com um volume de negócios anual igual ou superior a 750 milhões de euros estarão sujeitas independentemente do local onde estejam estabelecidas.

Dublin tem reservas em relação a esta parte da reforma, porque discorda do patamar de “pelo menos 15%”.

A taxa geral de IRC na Irlanda é de 12,5% e, à boleia de regras fiscais específicas para as sociedades não residentes, há multinacionais que conseguem ficar a pagar um imposto efectivo mais baixo.

O caso da Apple tornou-se paradigmático, quando a Comissão Europeia concluiu em 2016 que a empresa norte-americana conseguira uma vantagem fiscal na ordem dos 13 mil milhões de euros porque, através de acordos fiscais, conseguiu ficar a pagar um IRC inferior a 1% durante vários anos (em 2011, pagou na Irlanda uma taxa de IRC de 0,05% sobre o total dos seus lucros anuais; em 2014, uma taxa de 0,005%).

Coordenar os 27 países da UE

Paschal Donohoe reuniu-se com Janet Yellen antes da reunião do Eurogrupo de segunda-feira, na qual a secretária de Estado do Tesouro norte-americana participou, e ouviu Yellen reafirmar o que dito em relação à reforma: os Estados Unidos defendem uma reforma que ponha fim à transferência de resultados para jurisdições de baixa tributação e aos “artifícios contabilísticos” que permitem às multinacionais pagar menos impostos.

De acordo com o Irish Times, Donohoe disse que a “troca de pontos de vista” entre os dois foi “positiva” e repetiu que ainda há “muito trabalho pela frente nas próximas semanas ou meses” para que se chegar a acordo.

A Comissão Europeia já disse que vai apresentar uma proposta de directiva para a União Europeia implementar as novas regras do IRC mínimo, mas, para que o texto avance, é necessário que todos os Estados-membros aprovem a directiva, porque se trata de uma matéria de natureza fiscal, onde é preciso haver unanimidade para a legislação estar de pé.

A Irlanda não é o único país da UE que neste momento esta de fora. Outros dois países europeus que não subscreveram o acordo preliminar na OCDE, a Estónia e a Hungria. Além destes, ficaram de fora jurisdições de outras geografias: São Vicente e Granadinas, Barbados, a Nigéria, o Quénia e o Sri Lanka.

Como a reforma inclui, na parte relativa à redistribuição dos direitos de tributação, normas que visam tributar os resultados dos gigantes digitais, a Comissão Europeia já confirmou que decidiu “suspender” os trabalhos sobre a criação do imposto digital para se concentrar na reforma da OCDE, que precisa de um “derradeiro esforço”, confirmou o porta-voz da Comissão, Daniel Ferrie.

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