Protecção das zonas costeiras unificou a contestação ao Governo esloveno

Janez Jansa é alvo de protestos literalmente desde que tomou posse. Nos últimos meses, os vários movimentos mobilizaram-se em torno do mesmo tema e de um referendo que vai ser um teste ao Governo.

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Protestos na capital da Eslovénia contra alterações promovidas pelo Governo à Lei da Água BORUT ZIVULOVIC/Reuters

A Praça Preseren já era o ponto de encontro por excelência em Ljubljana: palco de festivais, concertos ou comícios, também era o lugar escolhido para protestos. Mas desde que o primeiro-ministro, Janez Jansa, e o seu Partido Democrático Esloveno (SDS) voltaram ao poder, em Março de 2020, a Preseren passou a ser sinónimo de oposição e é ali que todas as sextas-feiras, há mais de um ano, se reúnem manifestantes motivados pelos mais diversos temas. Na última sexta-feira, a manifestação foi dedicada à protecção da água e ao referendo de domingo.

“Em muitos sentidos, esta consulta é vista como um referendo contra o Governo, a primeira oportunidade para votar contra o Governo no último ano e meio”, diz Gorazd Kovacic, cientista político. “Nós não queríamos politizar o debate. A água não é uma questão política. Mas eles [o Governo] tornaram isto numa luta política”, afirma Barbara Cencur Curk, directora da ONG Global Water Partnership na Eslovénia.

O referendo foi marcado por iniciativa da sociedade civil, para tentar derrotar as alterações promovidas pelo executivo de Jansa à Lei da Água. 

Os defensores das mudanças afirmam que estas visam permitir canalizar mais fundos para proteger a costa marítima, lagos e rios e apertar as regras para construir nestas áreas. Os promotores do referendo dizem precisamente o contrário e garantem que ficará aberta a porta à construção em zonas onde até aqui era impossível, antecipando o surgimento de restaurantes, hotéis, lojas e parques de estacionamento que vão limitar o acesso público a estas zonas, aumentar a poluição e pôr em causa a qualidade da água potável.

“Para lançar um referendo são precisas 40 mil assinaturas verificadas, o que não era fácil tendo em conta as restrições existentes por causa da pandemia”, nota Kovacic. Mas “houve muitos grupos, ONG, redes informais, que se mobilizaram” e foram recolhidas mais de 50 mil. “A mobilização para o referendo da água tem origem em vários movimentos, incluindo o movimento Verde, muito forte junto dos mais jovens, mas aqui juntaram-se todos os grupos da sociedade civil que já estavam activos contra este Governo”, explica o analista.

“A campanha foi feita pelas pessoas nas cidades e nas vilas, que escreveram aos seus vizinhos, distribuíram panfletos”, descreveu à Reuters Nina Kovac, directora da ONG feminista Instituto 8 de Março, que integrou esta campanha.

Em resposta à mobilização, Jansa e os seus ministros decidiram dificultar o voto – para que o referendo seja válido, não basta que a maioria vote nesse sentido; é preciso que pelo menos 20% dos cerca de 1,7 milhões de eleitores rejeitem as emendas. 

A consulta começou por estar prevista para o início do mês e foi adiada “para a época em que mais eslovenos costumam estar de férias, na Croácia”, nota Kovacic. Depois, os boletins para os votos por correspondência enviados aos lares, por exemplo, chegaram meio dia antes do fim do prazo para votar. “O voto presencial também foi dificultado. Em cidades onde só havia um grande centro de voto, passou a haver muitos; noutras, todos os que existiam mudaram de sítio”, enumera Cencur Curk. 

“A opinião pública percebeu que não eram erros de competência mas fruto da vontade política e isso está a mobilizar as pessoas”, diz Kovacic, enquanto a activista nota que nos dias de voto antecipado votaram mais eslovenos do que em eleições ou referendos anteriores.

Na sexta-feira, a Praça Preseren estava bem composta. Longe vão os tempos do rigor do primeiro confinamento por causa da pandemia, onde quem organizasse um protesto podia ser multado em 12 mil euros e muitos manifestantes individuais foram multados em 400 euros. 

A vontade de protestar contra Jansa era tanta que nem isso impediu os protestos à sexta-feira, que começaram por ser feitos por ciclistas, para contornar as regras que impediam a permanência na rua. Seja qual for o resultado do referendo, tanto Kovacic como Cencur Curk têm a certeza de que a contestação vai continuar.

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