Operação Lex: ex-presidente da Relação declara-se inocente em processo disciplinar

Na “operação Lex” estão em causa crimes de corrupção passiva e activa para ato ilícito, recebimento indevido de vantagem, abuso de poder, usurpação de funções, falsificação de documento, fraude fiscal e branqueamento.

Foto
Vaz das Neves MANUEL DE ALMEIDA

O ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa Vaz das Neves declarou hoje diversas vezes, durante uma inquirição disciplinar relacionada com a Operação Lex, que está inocente e que não praticou os factos de que é acusado.

Em causa está a distribuição de um processo à juíza Fátima Galante, referido no âmbito a Operação Lex, pelo qual não lhe foi deduzida acusação no processo-crime.

Vaz das Neves disse ainda na audição pública que decorreu hoje no Conselho Superior da Magistratura, que o inspector do processo disciplinar, de que é alvo por questões relacionadas com a distribuição de processos no Tribunal da Relação de Lisboa, “desconhece quem terá praticado uma alegada infracção disciplinar” e tentou adivinhar.

“Como é inquestionável, a Justiça não é feita de métodos adivinhatórios. É feita de provas e neste caso não há provas. Nem podia haver, pela simples razão de o arguido não ter praticado os factos de que aqui está acusado”, disse o juiz jubilado.

“O senhor inspector extraordinário não demonstrou a existência de qualquer ato material praticado pelo arguido que tivesse determinado ou influenciado a distribuição manual do processo aqui em causa. Nem poderia fazer, pois essa realidade, por ele ficcionada, nunca existiu”, frisou.

Segundo Vaz das Neves, a distribuição em causa foi realizada, presidida e assinada por terceiro, no âmbito da delegação de poderes então em vigor para este efeito, actos a que o arguido diz ser totalmente alheio.

O advogado do ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Miguel Matias, disse em declarações à comunicação social que a questão que foi hoje trazida “é da eventual distribuição manual de um determinado processo quando se demonstrou documentalmente que foi presidida pelo então vice-presidente Orlando Nascimento”.

Vaz das Neves acrescentou que o “senhor inspector extraordinário, perante uma mensagem sem conteúdo identificável e sem prova que à mesma se reporte ficciona uma realidade e conclui, sem provas, que foi o arguido quem procedeu aquela distribuição manual”.

“E tudo isto, à revelia do documento oficial da distribuição, junto ao processo, que atesta precisamente o contrário. E, no processo, não consta que alguém impute ao arguido a prática de tais factos”, frisou.

Sem prova, sustenta Vaz das Neves, impunha-se a não dedução de qualquer acusação pelo que considera que ao tê-lo feito o inspector extraordinário “atentou contra a honra, a dignidade e o incontornável direito à presunção de inocência do arguido”.

Nas alegações o advogado Miguel Matias sustentou que “o arguido não praticou qualquer facto relacionado com a matéria em apreciação e, como tal, não violou qualquer disposição legal” considerando também que o processo disciplinar é nulo.

“Nem o arguido praticou quaisquer dos factos alegados pelo senhor Inspector Extraordinário, nem existe -- e nunca poderia existir -- qualquer prova de tais factos por ele praticados no processo”, frisou.

Ao Conselho Superior da Magistratura o advogado pediu que “examine o que se encontra efectivamente provado e não apenas o que são ilações, especulações e juízos apriorísticos, e que foram indevidamente inseridos na narrativa do relatório que vos está presente, sem que tenham sido adquiridos em termos probatórios”.

Por outro lado defendeu que seja declarado “extinto por caducidade o procedimento disciplinar ou, caso assim não se entenda, determine o arquivamento do processo por falta dos pressupostos de facto e de Direito que são essenciais para a aplicação ao arguido de qualquer sanção disciplinar”.

A audição pública de Vaz das Neves surge na sequência da Operação Lex que envolve 17 acusados de crimes económico-financeiros, entre os quais três juízes desembargadores, um empresário de futebol, o presidente do Benfica e um advogado.

Na “operação Lex” estão em causa crimes de corrupção passiva e activa para ato ilícito, recebimento indevido de vantagem, abuso de poder, usurpação de funções, falsificação de documento, fraude fiscal e branqueamento.

A investigação centrou-se na actividade desenvolvida por três juízes desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa, Rui Rangel, Fátima Galante e Luis Vaz das Neves, que, segundo a acusação, utilizaram as suas funções para obterem vantagens indevidas, para si ou para terceiros, que os beneficiários dissimularam.

Enquanto decorria a investigação, o Conselho Superior da Magistratura decidiu expulsar Rui Rangel da magistratura e colocar Fátima Galante em aposentação compulsiva.

Vaz das Neves jubilou-se em 2016 e foi substituído por Orlando Nascimento, que também já abandonou o cargo.