Santa Casa da Misericórdia de Guimarães instaura processos disciplinares a 24 trabalhadores

Instituição diz que processos surgiram após reunião em que se registaram ameaças verbais entre trabalhadores, tendo alguns utentes ficado sem cuidados durante tempo. Trabalhadores desmentem e dizem que esta é uma resposta à greve marcada para os próximos dias.

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Para segunda-feira está marcada uma concentração em frente à sede da Santa Casa da Misericórdia Paulo Pimenta

A Santa Casa da Misericórdia de Guimarães instaurou processos disciplinares a 24 trabalhadores do lar Rainha D. Leonor. Ao PÚBLICO, fonte oficial da instituição refere que os processos surgiram após “eventos ocorridos a 11 de Maio [numa reunião], que foram gravíssimos”. “Estivemos na iminência de chamar a polícia e foram feitas ameaças a trabalhadores que resultaram em processos-crime”, acrescenta a mesma fonte.

Questionada sobre o que de facto ocorreu na reunião, a mesma fonte disse apenas que se registaram ameaças verbais entre trabalhadores e que houve interrupção de cuidados a utentes resultante da paragem de serviços por parte dos funcionários.

Mas isso, diz Manuela Araújo, delegada do Sindicato do Comércio, Escritórios e Serviços (CESP) que trabalha naquele lar há sete anos, “é totalmente mentira”. Nesse dia, conta, “os trabalhadores reuniram-se todos” para exigir que o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Guimarães, Eduardo Leite, ouvisse as suas reivindicações, como “a melhoria de condições” para os utentes. “Não houve ameaças de nada, somos todos testemunhas uns dos outros”, frisa.

Os 24 trabalhadores começaram a ser notificados acerca dos processos no dia 14. De acordo com outra trabalhadora do lar, Armanda Gonçalves, as queixas dos trabalhadores “foram reportadas por e-mail” ao provedor, que não esteve presente na reunião do dia 11, mas não se “obteve resposta”. A também dirigente sindical está de baixa médica desde Dezembro, mas assegura que se tem mantido a par de tudo o que se passa no lar e das queixas dos trabalhadores. No dia 13, diz Manuela Araújo, o provedor visitou o lar: “Falou comigo e com outra funcionária que nem esteve presente na reunião. O que nós esperávamos era que ele falasse com todos os trabalhadores, para ouvir as nossas queixas. Nessa conversa, disse-nos logo que iríamos sofrer as consequências daquele acto.” 

Contudo, na opinião das duas trabalhadoras e de Ana Paula Rodrigues, também dirigente do CESP, o “real motivo” da instauração dos processos não foi a reunião. Dias antes desse acontecimento, a 5 de Maio, foi entregue o pré-aviso de greve daqueles trabalhadores. A greve acontece entre as próximas segunda e quarta-feira. Para além da melhoria de condições, manifestar-se-ão pelo aumento dos salários — “uma promessa que se viu reduzida a nada” e cujas negociações iniciaram “há dois anos”, explica Ana Paula Rodrigues —, pela “regulação dos horários de trabalho”, pelo “fim dos vínculos precários”, pela “liberdade sindical dentro da instituição” e pelo “fim do assédio laboral que tem fustigado os trabalhadores, assumindo formas como repressão, opressão, censura e perseguição”, lê-se em nota de imprensa do CESP. No mesmo documento, a associação sindical indica que a administração da instituição vimaranense moveu as dezenas de processo “perante a marcação de greve”.

Por sua vez, a Santa Casa da Misericórdia de Guimarães afirmou, ao PÚBLICO, que “estes processos não têm nada que ver com a greve” e que a instituição “respeita esse direito dos trabalhadores”. Em comunicado, a mesma fonte repudiou “todo e qualquer tipo de falsas notícias, difundidas com o único objectivo de ofender o bom nome” da instituição. “Não será através de comunicados de teor manifestamente falso e difamatório, de autoria desconhecida, e que nem sequer revela a opinião da maioria dos colaboradores, que esta Mesa Administrativa deixará de zelar pelo cumprimento das suas obrigações enquanto Instituição de cariz social”, lê-se ainda.

Trabalhadores estão “exaustos e desanimados”

Na mesma nota de imprensa, a instituição aponta que tem tido uma “conduta reconhecidamente exemplar no combate à pandemia”, que obrigou a adoptar “um estrito plano de contingência” e a “proceder a cerca de uma centena de novas contratações”. Mesmo assim, tem vindo a ser “sucessivamente ameaçada com greves, com queixas aos serviços da Autoridade para as Condições do Trabalho e ao Instituto da Segurança Social, I.P., apesar da absoluta falta de fundamentos de quem recorre a esses meios”.

Para Manuela Araújo, motivos não faltam para os trabalhadores se queixarem: “Por vezes saíamos das nossas áreas para fazer limpezas nas entradas. Há pouco pessoal, mas continuam a dizer que temos pessoal que chegue. Os trabalhadores estão exaustos e desanimados.” Armanda Gonçalves diz mesmo que os trabalhadores do lar são “humilhados e desrespeitados”. “Isto vem de há muito tempo. O senhor provedor e a mesa administrativa nunca fizeram nada.” “Cheguei a fazer noite e a ter de ficar até às 15h porque não havia quem cuidasse dos utentes”, acusa.

A dirigente sindical diz ainda que, na sua valência, “todos os utentes estiveram infectados” a certa altura; quando isso aconteceu, havia quem trabalhasse 12 horas por dia. “Aquilo era do pior. Fazíamos tudo, éramos nós a medir o oxímetro, por exemplo. Mandei e-mails para a directora da valência e para o senhor provedor e não obtive respostas”, acrescenta. Para além do comunicado por si assinado, o provedor “não prestará” mais declarações sobre o assunto, disse a Santa Casa da Misericórdia de Guimarães ao PÚBLICO.

Apesar de avançarem para a greve, os trabalhadores do lar garantem a prestação dos serviços mínimos aos utentes. Para segunda-feira está marcada uma concentração em frente à sede da Santa Casa da Misericórdia. Pelas 17h30 do dia seguinte, os trabalhadores reunir-se-ão no Largo do Toural para uma vigília. Para as 10h de quarta-feira está marcado um desfile que contará com a presença da secretária-geral da CGTP, Isabel Camarinha.

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