Marcelo pede reflexão sobre “lições de Odemira” e admite “qualquer coisa de criminoso” nessa situação

Presidente está preocupado com trabalhadores agrícolas no concelho alentejano e adverte que a mão-de-obra imigrante deve ser tratada com “dignidade, como vem na Constituição”.

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Marcelo Rebelo de Sousa durante a visita à escola secundária Carolina Michaelis LUSA/FERNANDO VELUDO

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, declarou nesta quarta-feira que “vale a pena, desde já, começar a reflectir sobre algumas lições de Odemira” e pede que se apure se há qualquer coisa de ilegal nesta “realidade subterrânea” ou até mesmo “qualquer coisa de criminoso”.

Marcelo Rebelo de Sousa mostrou preocupação com o que se está a passar com os trabalhadores agrícolas no concelho de Odemira, nomeadamente em duas freguesias, e adverte que a mão-de-obra imigrante deve ser tratada em termos humanos e com “dignidade, como vem na Constituição”.

“Em relação a Odemira, começou por ser aos olhos dos portugueses um caso sanitário, um caso mais grave de saúde pública que exigia medidas graves e depois foi-se descobrindo que havia realidades sociais por baixo desse caso sanitário. Vale a pena desde já começar a reflectir sobre algumas lições de Odemira”, afirmou o Presidente da República no final de uma longa sessão dedicada ao Dia Mundial da Língua Portuguesa, que decorreu na Escola Secundária Carolina Michaëlis, no Porto, onde foi muito aplaudido pelos alunos. “A língua portuguesa é doce”, defendeu Marcelo.

As lições

Para o Presidente da República, “a primeira lição a tirar é a da importância dos imigrantes para a economia e para a sociedade portuguesa. De vez em quando, ouvimos umas vozes muito contra os imigrantes. Ora, o que se veio a descobrir e já sabíamos é que há milhares e milhares de imigrantes que estão a contribuir para a economia portuguesa, subterrâneos, legalizados ou clandestinos. Essa é a realidade”, sublinhou.

“A segunda realidade é que infelizmente pode haver mais clandestinos do que pensávamos, nessa realidade subterrânea, é preciso apurar o que há de ilegal e, se, eventualmente, há qualquer coisa de criminoso. Não basta apenas explorar a mão-de-obra imigrante, é preciso tratá-la em termos humanos, tratá-la com a dignidade que vem na Constituição para os portugueses e para aqueles que vivem em Portugal.”

O Presidente da República apontou uma terceira realidade que está também a colocar-se em Portugal e sobre essa disse: “Nós já a conhecíamos.” “Tem que ver com as condições de habitação, não são só de imigrantes mas também de muitos portugueses em Portugal que depois tem efeitos sanitários. Já tínhamos ouvido falar disso no Verão passado, por exemplo, em algumas freguesias da periferia em Lisboa onde havia trabalhadores que nunca confinaram — muitos deles imigrantes e que viviam em condições de sobrelotação com as consequências de contágio que nós compreendemos que são maiores”, apontou.

“É muito bonito dizer-se que os imigrantes (...) dão jeito para trabalhar a fazer aquilo que os portugueses não fazem, mas já não dão jeito para terem os direitos que lhes deviam corresponder”, disse, apelando a que se apure se “em relação à situação de imigração de maior rotação há legalidade ou não há legalidade”.

Quanto à questão da habitação, o Presidente reconhece que neste caso do concelho alentejano esse problema foi “mais patente”, mas aproveitou para dizer que se trata de um “problema social e nacional mais vasto”. Do ponto de vista sanitário, disse esperar que em Odemira haja uma “evolução positiva”, sendo para isso “preciso encontrar fórmulas de quebrar as cadeias de contágio”.

“Aquilo que se pode dizer é que a pandemia pôs a nu fragilidades sociais, umas já conhecíamos, outras desconfiávamos, mas não conhecíamos a exacta extensão e ficaram mais evidentes como se fica sempre quando abre choque na vida colectiva”, acrescentou o chefe de Estado.

Bom nível

O Presidente pronunciou-se ainda sobre os fundos no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência para dizer que a Europa está no “bom caminho” e disse que é preciso que Portugal tenha “uma taxa de execução do PRR elevada”. “Vamos no bom caminho a nível europeu para termos da parte dos 27 estados luz verde para a utilização dos fundos do PRR. Por outro lado, referiu que a execução do PRR “não pode deixar de ser descentralizada” em vários aspectos, bem como ter em conta o “conhecimento que as estruturas mais próximas têm da realidade a nível regional e a nível local”.

Sobre o tema que o trouxe ao Porto, o chefe de Estado defendeu a necessidade de haver “mais condições para se ler mais português”, considerando que, se tal não for feito, “o português tenderá não a crescer, mas a morrer”. E disse por várias vezes que “é preciso haver mais condições para se falar mais e se ler mais o português”. Ao mesmo tempo, realçou a importância de se dar “uma vida nova ao Plano Nacional de Leitura, às escolas, às famílias e comunidade em geral.

A escolha da Escola Secundária Carolina Michaëlis, no Porto, para comemorar o Dia Mundial da Língua Portuguesa teve alguma simbologia para o Presidente da República. Há 64 anos, o seu pai, Baltazar Rebelo de Sousa, reinaugurava aquela escola na qualidade de subsecretário de Estado da Educação Nacional.

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