Deputados do Brasil aprovam projecto que revoga lei do período da ditadura
A lei agora revogada foi mais usada desde a chegada ao poder de Jair Bolsonaro: foi a base para 77 inquéritos em 2019 e 2020, quando nos quatro anos anteriores tinham sido apenas 44.
A Câmara dos Deputados do Brasil aprovou na terça-feira um projecto que revoga a Lei de Segurança Nacional, em vigor desde 1983, período em que o país vivia sob ditadura militar, e que tipifica crimes contra a democracia.
“Os deputados fizeram história na mudança de um conceito antigo que precisava de ser revisto sobre todas as normas dos estados e do Estado Democrático de Direito. Parabéns a esta casa parlamentar”, afirmou o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.
A relatora do projecto, a deputada Margarete Coelho (do partido Progressistas), declarou que o texto aprovado pelo plenário pode não ser o ideal, mas sublinhou que se trata de um avanço.
“Mais do que retirar uma lei que não se coaduna com o nosso sistema jurídico e político, é trazer uma lei que cumpre o dever que nos foi dado pelo legislador constituinte originário de termos uma lei de defesa do Estado Democrático de Direito”, advogou a relatora.
A Lei de Segurança Nacional tem sido bastante usada nos últimos dois anos, após a chegada ao poder do Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, em Janeiro de 2019.
De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, a Polícia Federal brasileira abriu, pelo menos, 77 inquéritos com base nessa lei em 2019 e 2020, número que supera o valor registado nos quatro anos anteriores, quando a corporação disse ter instaurado 44 inquéritos.
A norma tem sido utilizada pelo Ministério da Justiça contra críticos de Bolsonaro.
Também o Supremo Tribunal Federal brasileiro usou, recentemente, a mesma lei para deter o deputado “bolsonarista” Daniel Silveira e outros organizadores de manifestações antidemocráticas.
Para o deputado de esquerda, Marcelo Freixo, a actual legislação tem sido usada para perseguir políticos e activistas. Na avaliação do parlamentar, a Lei de Segurança Nacional era a estrutura legal da ditadura militar.
“Derrubar a Lei de Segurança Nacional é fundamental para quem tem compromisso com a democracia. Esse painel é muito ilustrativo daqueles que defendem a democracia e daqueles que defendem a ditadura, defendem a tortura e que precisam ser derrotados neste plenário e na vida política brasileira. É disso que se trata”, argumentou Freixo, numa referência a deputados do Partido Social Liberal, antiga formação política de Bolsonaro, que tentaram obstruir a votação.
Além de revogar a Lei de Segurança Nacional, o projecto aprovado pela Câmara dos Deputados e que segue agora para avaliação do Senado, define ainda crimes contra o Estado Democrático de Direito.
O projecto prevê, por exemplo, até cinco anos de prisão para quem contratar empresas para disseminar notícias falsas que possam comprometer o processo eleitoral no país.
Tipifica dez novos crimes: atentado à soberania, atentado à integridade nacional, espionagem, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, interrupção do processo eleitoral, comunicação enganosa em massa, violência política, sabotagem e atentado a direito de manifestação.
Se o crime for cometido por funcionários públicos, a pena será aumentada em um terço e o profissional perderá o cargo.
O texto também estabelece pena de três a seis meses de prisão, ou multa, para quem incitar publicamente a animosidade entre as Forças Armadas, ou entre estas e os demais poderes, as instituições civis e a sociedade.