Sigamos o Smart Fish em Peniche
Quem quiser, em Peniche, comer peixe de acordo com o princípio da sustentabilidade poderá, em breve, procurar os restaurantes aderentes ao conceito de Smart Fish. O cherne e outros “finórios” estão fora do programa: aqui só participam a cavala e o carapau, com preparações para todos os gostos.
O título de embaixadora da cavala e do carapau é perfeito para Patrícia Borges porque está, desde 2012, a demonstrar aos consumidores, alunos de diferentes escolas e donos de restaurantes que estes peixes baratos e em bom estado de stock (em particular o carapau) transformam-se em pratos variados e saborosos, quer em versões clássicas quer em versões vanguardistas.
A professora da Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar, em Peniche, já perdeu a conta às receitas de cavala e de carapau que fixou em livros ou criou para eventos de toda a forma e feitio, mas, sempre que alguém lhe liga a pedir qualquer coisa nova sobre a matéria – e isso acontece com alguma frequência – nunca recebe um “não” como resposta, esteja ela em Ílhavo, Setúbal ou Lagos, à procura de pratos esquecidos que os pescadores comiam no mar. E como se tudo isso não bastasse, a investigadora acaba de lançar o projecto Smart Fish, que tem como objectivo reunir um conjunto de restaurantes de Peniche que aceitam nas suas ementas receitas desenvolvidas por si – ou não – para cavala e para o carapau.
Atendendo à reabertura recente da restauração, Patrícia Borges passa os dias em diferentes cozinhas de Peniche, em acções de formação, pelo que a lista final dos restaurantes só será conhecida nas próximas semanas. “Quero, acima de tudo, garantir o compromisso por parte dos empresários de que terão em permanência os pratos acordados na carta. Havendo peixe disponível, claro.”
O pensamento de Patrícia é este: “Se vamos a uma terra que não conhecemos – como cidadãos nacionais ou turistas –, acho que deveríamos saber que produtos dessa região estão integrados no conceito de sustentabilidade e lhe dão identidade própria. Identidade essa que tem de ser transformada em riqueza para toda a fileira do sector das pescas, em especial, para os pescadores.” De facto, apesar de o preço pago aos pescadores por estas duas espécies ser baixo, a verdade é que, desde 2012, e por iniciativa de campanhas da Docapesca, os preços registam subidas graduais. Ligeiras, mas, anda assim, subidas.
Financiado pelo programa operacional Mar 2020, o Smart Fish nasce em Peniche, mas poderá – deverá, mesmo – estender-se a outras regiões urbanas inseridas comunidades piscatórias, com adaptação do conceito em função das espécies sustentáveis que são descarregadas nos respectivos portos. O biqueirão, por exemplo, é uma das espécies que Patrícia gostaria de trabalhar no norte do país.
Recentemente, uma equipa do PÚBLICO entrou pela cozinha do XaKra Beach Bar, restaurante de praia em Peniche que já ostenta o selo Smart Fish, provocando um susto à cozinheira Rosa Ribeiro, que andava atrapalhada com clientes que começam a almoçar ao meio-dia. Ainda assim, e com os pedidos a caírem na cozinha, Rosa cozeu e temperou uma cavala salgada (tradição em Peniche), escalou um carapau que foi à grelha só com sal grosso (todo a gente deveria provar algo assim) e ainda teve tempo para transformar outro em ceviche.
E foi à volta destes pratos que, em jeito de provocação, perguntámos a Patrícia Borges se ela achava que os clientes do XaKra, perante uma montra vistosa com robalos, douradas e uma data de peixes vermelhos, iriam optar por cavalas e carapaus. “Se calhar não serão muitos, reconheço, mas eu não estou, desde 2012, só a pensar no presente. Estou, acima de tudo, a trabalhar para o futuro. É só isso que me interessa.”