Covid-19: estafetas das plataformas online trabalham entre “sustos” e contas

Seja um part-time ou emprego fixo, os estafetas das plataformas online de entrega de alimentos não deixam de trabalhar, mesmo quando os clientes não cumprem as normas de higiene. O investimento inicial tem de ser pago.

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Rui Gaudencio

Os estafetas das plataformas online de entrega de alimentos revelaram à Lusa que, apesar de haver clientes no Porto sem cuidados sanitários, continuam na profissão para pagar o investimento inicial que, nalguns casos, atinge os 2500 euros.

Três estafetas de diferentes plataformas falaram com a Lusa sobre a actividade, como é sobreviver em tempos de pandemia, oferecendo a perspectiva de que, quando tudo parece mal, há um caminho positivo para percorrer.

Lucas Vale, brasileiro de 29 anos, está em Portugal desde 2015 e há um ano acumulou a função de motorista de uma empresa electrónica de transporte de passageiros com o trabalho de estafeta de uma loja de conveniência online que tem parceria com uma plataforma de entrega de alimentos.

“Na questão de facturação, com a chegada da pandemia, ficou melhor para os estafetas, porque houve mais pessoas a recorrer ao serviço de entregas. Mas a questão da segurança foi afectada, pois muitas vezes as pessoas exigem a entrega à porta de casa e atendem-nos sem máscara, não mostrando o mesmo cuidado que temos para satisfazer o pedido”, relatou.

E tem mesmo de ser assim, a facturar, porque, explicou, “o investimento inicial para começar a actividade pode chegar aos 2500 euros, entre compra de motorizada, capacete, capa para a chuva, mochila, suporte do telemóvel, entre outras coisas”.

A juntar a isto, o facto de “mensalmente fazer cerca de 5000 quilómetros, o que desgasta a motorizada e obriga a revisões mais frequentes”, disse.

Os cálculos da facturação são feitos à semana, dependendo, no caso de Lucas, o número de dias em que trabalha dez horas do valor auferido nesse período. Para Lucas, “uma boa semana é quando se ganha entre 300 e 350 euros até ao quinto dia de actividade”.

Ricardo Palhares, de 38 anos, é assistente técnico no Hospital São João e há dois anos que dedica o final dos dias a trabalhar como estafeta numa plataforma de entrega de alimentos.

“Até ao início da pandemia trabalhava entre dois e três dias por semana, abrangendo o fim-de-semana. A situação mudou quando a minha esposa, que trabalhava na restauração, ficou sem trabalho, passando a estar online quase todos os dias entre as 19h e as 22h”, descreveu.

E numa cidade que, por força de dois confinamentos, passou muitos dias “fechada”, as refeições são feitas por muitos colegas “junto às motorizadas, enquanto esperam por chamadas, por exemplo, à porta de restaurantes com serviço de take-away, sendo que “maioritariamente comem sandes”. Os restaurantes em take-away para quem trabalham “normalmente facilitam o acesso à casa de banho aos estafetas”, contou Ricardo Palhares.

O mesmo estafeta recorda que, há cerca de dois meses, quando foi entregar um pedido perto da Foz, pensando que era para um segurança porque no mapa indicava ser zona de armazéns, quando lá chegou deparou-se com “jovens a conviver em plena pandemia e sem máscara”.

Carlos Silva, de 26 anos, trabalha para uma companhia aérea a operar no aeroporto Francisco Sá Carneiro e é estafeta de uma cadeia de restauração desde Setembro de 2020, um extra ao qual dedica 24 horas por semana, contou.

“Já fui a sítios mais difíceis da cidade e nunca tive problemas, mas é verdade que me aconteceu imensas vezes entregar a encomenda a pessoas que aparecem à porta de casa sem máscara”, contou.

Assegurando “nunca ter sido apanhado pelo vírus”, o jovem de Gondomar admitiu à Lusa que o retorno da aposta feita no final do verão de 2020 superou as expectativas.

“O que estou a conseguir como extra superou as minhas expectativas. Vou manter-me assim porque já me habituei a uma realidade diferente e não quero perder o que consigo fazer a mais. É a diferença entre ter pouco mais de 700 euros ou mais de mil euros ao final do mês”, enfatizou Carlos Silva.