Há professores que vão ter de voltar para a escola para acompanhar alunos sem computador

Denúncia foi feita pela Fenprof esta sexta-feira. Mário Nogueira critica silêncio do Ministério da Educação e diz que professores com filhos menores são duplamente prejudicados.

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Ensino â distância regressa na segunda-feira Daniel Rocha

Existem casos de professores a receberem ordens para voltar às escolas na segunda-feira e prestar apoio presencial aos alunos que não têm meios tecnológicos para acompanhar as aulas por videoconferência. A denúncia foi feita por Mário Nogueira, secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (FENPROF), esta sexta-feira. De acordo com o dirigente, o regime de ensino em várias escolas do país será feito de forma “mista”: uma pequena percentagem dos alunos estará na sala de aula com os professores, enquanto os restantes permanecem em casa e acompanham a aula online.

“Desta forma, o ensino não é nada”, lamenta Mário Nogueira, relembrando que os casos mais críticos são os dos docentes que têm a cargo filhos menores que, em muitos destes casos, têm de acompanhar o professor para a escola por não terem possibilidade de ficarem em casa. “O que estamos a ver é uma confirmação da falta de condições das escolas para um momento como este, a impreparação completa dos responsáveis de educação e a falta de planeamento visível por parte da tutela. A opção é uma improvisação ou ‘desenrascanço'”, critica o dirigente da Fenprof.

Admitindo que a decisão de enviar os professores para os estabelecimentos de ensino não é responsabilidade directa do Ministério da Educação — que relegou para as escolas o planeamento do ensino à distância —, Mário Nogueira critica o silêncio da tutela relativamente a esta imposição: “Isto acaba por prejudicar todos os alunos. O ensino neste contexto misto é o pior que pode a acontecer para todos. É pior que [só ter] o ensino à distância”, reitera.

A opção de as escolas receberem os alunos que ainda não têm meios tecnológicos — computador ou internet — tinha sido avançada na quinta-feira por Manuel Pereira, da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, em declarações ao PÚBLICO. “Alguns dias por semana, queremos que esses alunos possam ser acompanhados pelos professores”, adiantou o responsável. Portugal espera a chegada de 335 mil portáteis, cuja entrega foi atrasada por problemas do fabricante. Esta quinta-feira, o Governo procedeu à compra de 15 mil dispositivos adicionais, tendo já entregado 100 mil computadores a alunos carenciados do ensino secundário. 

Pelo facto de grande parte destas queixas terem chegado ainda esta sexta-feira, Mário Nogueira diz não ter existido tempo para contabilizar o número de escolas e profissionais que regressarão às escolas na segunda-feira para este regime “misto”. Contudo, o responsável sindical avança que a maioria dos casos tem origem na região Norte, destacando o distrito do Porto e Braga. Na zona Sul, há casos pontuais em Lisboa, prossegue.

Apesar de se mostrar contra este regresso dos professores, Nogueira deixa claro que a Fenprof não irá colocar entraves ao regresso do ensino. “A Fenprof não vai lançar uma palavra de ordem a dizer ‘não há condições não trabalhem’. Não é que o Governo ou o Ministério da Educação não o merecessem. Mas sim porque os nossos jovens e as famílias não merecem. Os professores não vão abandonar os seus alunos”, garantiu.

Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, salienta que o número de professores nesta situação será “residual”, dizendo que para estes estabelecimentos de ensino não terá “sido possível encontrar outra solução”. Contudo, Filinto Lima solidariza-se com a questão levantada por Mário Nogueira relativamente aos docentes com filhos com menos de 12 anos. “Isso é o que está mal. Não percebo porque é que os professores não podem ser considerados trabalhadores essenciais”, afirma.

Quase 53% das escolas com casos de covid-19

O primeiro tema debatido na conferência de imprensa da Fenprof foram os dados fornecidos pelo Ministério da Educação, depois de a federação sindical ter recorrido judicialmente pelo acesso a estes números. Em causa estava o número de escolas públicas em que registaram casos de infecção por covid-19 no primeiro período lectivo. 

“Foi necessário recorrer aos tribunais para termos uma informação que não devia ter sido escondida. O número de escolas com [casos de] covid-19 no primeiro período lectivo foi de 2933, conforme consta na lista que conseguimos em tribunal. É um número muito acima, o triplo, daquelas que tínhamos identificado e confirmado, que era 926”, afirmou Mário Nogueira.

A Fenprof relembra que há, no total, 5568 estabelecimentos de ensino públicos no país, o que significa que se registaram casos de infecção por SARS-CoV-2 na maioria das escolas portuguesas. O secretário-geral aproveitou os dados para criticar a actuação política nas escolas. “Estes números vêm desmentir as afirmações dos governantes que repetiram durante o primeiro período que as escolas não eram espaço de infecção. Esconderam os números e nunca aceitaram ao longos dos últimos meses realizar rastreios para que se percebesse a situação nas escoas, preferindo culpar os portugueses e o Natal, sacudindo a culpa”, finalizou.

Foi ainda conhecido esta sexta-feira que o Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), a quem o Ministério da Educação entregou a responsabilidade de preparar o estudo de diagnóstico sobre o impacto do ensino à distância, só conseguiu avaliar 23 mil alunos, dos quais 4800 do sistema privado. A informação foi veiculada pelo instituto em nota informativa, com a justificação de que a interrupção lectiva e encerramento das escolas impediram o cumprimento do objectivo. O Governo propunha-se fazer chegar avaliação a 30 mil alunos do 3.º, 6.º e 9.º anos de escolaridade, com os resultados a serem conhecidos em Março. 

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