Morreu António Cordeiro, o carismático detective Claxon, o vilão de Major Alvega

Deixou sobretudo marca na televisão, mas também trabalhou no cinema com João Mário Grilo ou Joaquim Leitão e foi ao teatro que mais se dedicou ao longo da sua carreira. Padecia de paralisia supranuclear progressiva, uma doença degenerativa rara, e estava afastado da actividade.

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Herói pouco canónico em Claxon, vilão em Major Alvega (na foto), António Cordeiro começou pelo teatro e trabalhou em teatro até ao fim da carreira fernando veludo/arquivo
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António Cordeiro nas filmagens da série Major Alvega, em 1999 fernando veludo/arquivo
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António Cordeiro na pele do carismático detective Claxon dr

O actor António Cordeiro morreu este sábado, em Lisboa, aos 61 anos, informou a Academia Portuguesa de Cinema. “É com tristeza que informamos que nos deixou hoje [sábado] o actor António Cordeiro”, escreveu a academia na sua página no Facebook, recordando prestações de António Cordeiro no cinema e na televisão, ao longo de uma carreira de mais de 30 anos.

Revelado num pequeno papel em Duarte & C.ª, em 1987, acabaria por encarnar algumas personagens secundárias dessa série de culto até ao final da mesma, dois anos depois. Naquele universo cómico e burlesco com três detectives nada canónicos como protagonistas, António Cordeiro foi surgindo brevemente perante os espectadores, ao longo dos episódios, como barman, cowboy ou médico psiquiatra.

Formado na Escola Superior de Teatro e Cinema, assumiria aquele que é porventura o seu papel mais recordado numa série que, tal como Duarte & C.ª, tinha detectives e o submundo do crime como centro da narrativa. O ambiente em que se desenrolava Claxon era, porém, bastante diferente. Estreada em 1991 na RTP, a série que António Cordeiro protagonizou, dando corpo ao detective com o mesmo nome, inspirava-se no film noir e na literatura policial clássica, que moldaram não só o ambiente nocturno em que a acção decorria, com espaços saturados de fumo de cigarros, mulheres fatais, criminosos do bas-fond e das altas esferas sociais, mas apareciam também sinalizados no nome das personagens que habitavam aquele universo: o pouco convencional Joe Claxon tinha como fiel secretária Ruby Tuesday (Margarida Reis), como ajudante incansável o jornalista Rick Planeta (Ricardo Carriço) e como irritante rival o inspector de polícia Bob Caroço (António Paulos).

Realizada por Henrique Oliveira a partir de argumento escrito a quatro mãos por António Avelar Pinho e o próprio António Cordeiro, Claxon, série para o pequeno ecrã mas com espírito cinematográfico, foi um marco na televisão portuguesa. Exibida em horário nobre, aos sábados, revelou-se um sucesso de audiência e o seu imaginário marcou as gerações que a acompanharam naquele ano de 1991 (ao todo, foram 13 episódios, emitidos entre Março e Junho). A série está toda disponível online, nos RTP Arquivos.

Alguns anos depois, em 1998, encontraríamos António Cordeiro novamente na televisão, e a investir uma vez mais num imaginário clássico, neste caso o da banda desenhada. Desta vez, porém, o seu papel foi o de vilão. António Cordeiro era Helmut von Block, o coronel das SS que enfrentava o oficial da Royal Air Force Major Alvega, interpretado por Ricardo Carriço. A série que adaptou para televisão, conjugando animação com filmagem real, a banda desenhada Major Alvega, de grande sucesso no Portugal dos anos 1960 e 1970, cuja acção se passava durante a Segunda Guerra Mundial, teve duas temporadas, emitidas entre 1998 e 1999.

Para além dos papéis televisivos, António Cordeiro trabalhou também em cinema, nomeadamente nos filmes de João Mário Grilo O Processo do Rei (1990) e Os Olhos da Ásia (1996). Mais recentemente fez Índice Médio de Felicidade (2017), de Joaquim Leitão, e Um Gato, Um Chinês e o Meu Pai (2019), de Paco R. Baños. A telenovela Espelho d'Água, da SIC (2017/18), está entre os seus últimos trabalhos.

Uma carreira de teatro

O percurso de António Cordeiro iniciou-se porém no teatro, onde desenvolveu trabalho regular desde os anos 1980, com companhias como a Cassefaz e a Persona –​ Teatro de Comédia, grupo de que foi fundador e com quem fez O Circo dos Desenganos, sobre textos de Miguel Rovisco, e Auto da Índia e d'Outras Andanças, a partir de Gil Vicente.

Na década de 1990, o seu trabalho nos palcos passou sobretudo por companhias de Lisboa, como a Escola de Mulheres e o Teatro Aberto, com as quais interpretou autores como Henrik Ibsen, Bertolt Brecht e Botho Strauss. Desse período destacam-se os desempenhos em Danças a um Deus Pagão, de Brian Friel, e Sétimo Céu, de Caryl Churchill, como actor convidado da Escola de Mulheres –​ Oficina de Teatro.

A colaboração com o Novo Grupo  Teatro Aberto estendeu-se pelos anos 2000, em peças como Top Dogs, de Urs Widmer, Lucefécit, de Conor McPherson, A Última Batalha, de Fernando Augusto, A Visita, de Eric-Emmanuel Schmitt, Peer Gynt, de Ibsen, Demónios Menores, de Bruce Graham, O Bobo e a Sua Mulher Esta Noite na Pancomédia, de Botho Strauss, e Homem Branco, Homem Negro, de Jaime Rocha.

No Teatro Aberto interpretou ainda duas peças de Brecht: Galileu e A Ópera de 3 Vinténs, com a música de Hanns Eisler e Kurt Weill. A antiga Companhia Teatral do Chiado contou com António Cordeiro para Hedda Gabler, de Ibsen. No Teatro Nacional D. Maria II, fez Cenas de Uma Tarde de Verão, de Jorge Guimarães, com encenação de Antonio Rama, e Harper Regan, de Simon Stephens, com Ana Nave.

Em 2004, entrou em Portugal - uma comédia musical, de Nuno Artur Silva e Nuno Costa Santos, com encenação de António Feio, que esteve em cena, no Teatro São Luiz, em Lisboa. Como encenador, António Cordeiro dirigiu Perdi a Mão em Spokane, de Martin McDonagh, que pôs em cena no Teatro Villaret, em 2012.

António Cordeiro padecia de paralisia supranuclear progressiva, uma doença rara, degenerativa, e encontrava-se afastado da actividade.

O funeral do actor realiza-se a 8 de Fevereiro, disse à agência Lusa fonte próxima da família. Nessa segunda-feira, o corpo estará na Capela de Nossa Senhora do Rosário, no Barreiro, a partir das 11h15. O funeral sairá depois para o complexo funerário da Quinta do Conde, em Sesimbra, onde o corpo será cremado às 15h45. Devido à pandemia de covid-19, a última homenagem a António Cordeiro será reservada a familiares e amigos, num máximo de 10 pessoas.

Notícia actualizada com informação sobre o funeral.