Portugal em estado de emergência, Governo em estado de “calamidade” ou de “negação”
Só PS e PSD votaram a favor da renovação do estado de emergência por uma semana. Fecho dos restaurantes às 13h e situação nos lares foram principais críticas lançadas pelos partidos
Foi aprovada no Parlamento a renovação do estado de emergência por mais uma semana (até dia 15), apenas com os votos favoráveis do PS, PSD e da deputada não inscrita Cristina Rodrigues. A proposta para a declaração de um período mais curto deste regime constitucional prende-se com a necessidade de obter informação mais aprofundada sobre a evolução da pandemia de covid-19, o que só acontecerá na reunião no Infarmed da próxima terça-feira. A aprovação acabou por acontecer no dia em que Portugal registou um recorde de casos de infecção e no dia em que a conferência de líderes reservou duas datas para eventuais debates sobre futuros estados de emergência (a 13 e a 27 de Janeiro).
A votação desta tarde foi idêntica à anterior renovação do estado de emergência: PCP, PEV, Chega, IL e a deputada Joacine Katar Moreira votaram contra, o CDS, PAN e BE abstiveram-se e só as bancadas do PSD, do PS e a deputada não inscrita (ex-PAN) Cristina Rodrigues votaram a favor.
Mesmo que seja apenas por uma semana, e com a justificação de que é preciso tempo para obter informação mais aprofundada sobre o impacto do período das festas, a renovação do estado de emergência e algumas das suas medidas não colhem a simpatia de muitos dos partidos com assento parlamentar.
O encerramento dos restaurantes e centros comerciais às 13h aos fins-de-semana e a situação dos surtos nos lares foram dois dos pontos críticos apontados pelo CDS, BE, PCP, PEV e pelos deputados André Ventura e Cristina Rodrigues. Esta deputada não inscrita explicou que o seu voto favorável não significa concordância com todas as soluções, nomeadamente com o encerramento dos restaurantes às 13h aos fins-de-semana “sem que se percebam os resultados”. “Às tantas já ninguém sabe o que se pode ou não fazer”, disse a ex-deputada do PAN.
A bancada social-democrata manteve a posição favorável à renovação do estado de emergência como sinal de apoio ao Governo no combate à pandemia mas não sem criticar os partidos que se abstêm na votação. Hugo Carvalho acusou-os de fugir às responsabilidades e de anteverem “ganhos eleitorais” com essa posição. Mas foi para o Governo que o deputado do PSD guardou as mensagens mais duras ao dizer que “o ano de 2021 começa com ano de 2021 em estado de emergência” e com o “Governo em estado de calamidade”.
“Dia após dia, caso após caso, o Governo escolhe segurar ministros em vez de segurar ministérios”, disse, considerando que tem o “demérito de se fragilizar a si próprio” e que “tem a falta de humildade de assumir as suas falhas”.
O deputado do CDS, João Almeida, usou outra expressão para atacar o executivo: “Se o país está em emergência, o Governo está em negação. Mantém em funções sem condições um ministro da Administração Interna e uma ministra da Justiça”. Questionando como é que o primeiro-ministro reiterou a “confiança em ministros que já não a têm”, João Almeida retirou uma conclusão: “É uma evidência de um pântano institucional. Não podemos tolerar que assim seja. É uma incompetência não é aceitável. O CDS não passa cheques em branco a governos com ministros sem confiança”.
As críticas do deputado do CDS às medidas que levam a “filas intermináveis” nos centros comerciais aos sábados de manhã por causa do encerramento das lojas às 13h e a “falha” das brigadas de resposta rápida nos lares de idosos já tinham sido ouvidas nas bancadas da esquerda. João Oliveira, líder da bancada do PCP, defendeu a necessidade de medidas urgentes no SNS, na contratação de pessoal para os lares e no apoio aos desempregados.
Pelo Bloco, Moisés Ferreira exigiu que o Governo “não fique pela metade” nos recursos que forem precisos para enfrentar a pandemia. O deputado recordou as palavras da própria ministra da Segurança Social que se queixou de falta de meios para os lares e desafiou: “Que contrate, que requisite”.
Os surtos de covid-19 nas instituições que acolhem idosos foram também o exemplo dado pela ecologista Mariana Silva para sustentar a sua posição contra o regime restritivo constitucional: “As notícias que nos chegam dos lares também nos dizem que o estado de emergência não chegou para eles”. Joacine Katar Moreira, deputada não inscrita, falou nos “idosos desamparados”, além da necessidade de subir “o salário mínimo para os 900 euros”.
Os casos nos lares também foram referidos pelo porta-voz do PAN, André Silva, que, no entanto esteve ao lado do Governo na defesa do estado de emergência como um “mecanismo juridicamente essencial” para o combate à pandemia.
Numa intervenção final, em defesa do estado de emergência, o ministro da Administração Interna confrontou com os deputados que se assumem contra este regime restritivo – interpelando directamente João Cotrim de Figueiredo, da IL – questionando sobre qual seria a alternativa.
Eduardo Cabrita ignorou todas as críticas que lhe foram lançadas durante o debate e os pedidos de demissão não só por parte do CDS mas também de André Ventura, do Chega, que sugeriu a saída do Governo das ministras da Justiça e da Saúde e até do próprio primeiro-ministro depois das presidenciais de dia 24 deste mês.
Na próxima semana, dia 13, e no dia 27 deste mês, há dois agendamentos (com carácter preventivo) sobre eventual debate e votação da renovação do estado de emergência.