Ana Gomes acusa Marcelo de “menorizar” presidenciais e João Ferreira enaltece importância dos debates
João Ferreira considera que actual Presidente da República não tem em conta na sua actuação o cumprimento da Constituição da República. Ana Gomes não ficou surpreendida com recandidatura de Marcelo.
Dois adversários, à esquerda, de Marcelo Rebelo de Sousa, comentam criticamente o discurso de recandidatura, do actual Presidente da República. A candidata Ana Gomes acusou esta quarta-feira Marcelo de “menorizar” as eleições de 24 de Janeiro ao anunciar a recandidatura numa pastelaria quando o país estava em confinamento. Por seu lado, João Ferreira pede um outro exercício de poderes do Presidente.
“Acho que a pastelaria Versailles de Belém, ainda por cima uma pastelaria em dia de confinamento, em que as outras pastelarias deveriam estar fechadas, sem sequer permitir o acesso de jornalistas, sem sequer permitir perguntas e respostas do candidato, parece-me que foi uma forma de menorizar umas eleições que são importantes para a democracia em Portugal”, afirmou Ana Gomes. A candidata referia-se, assim, ao local e forma como foi anunciada a recandidatura.
Em declarações aos jornalistas, à margem de uma sessão de cumprimentos na Câmara Municipal do Porto, a candidata presidencial disse não ser “apologista que se menorize a importância de eleições presidenciais”.
“Acho que as eleições presidenciais são importantes, bem bastam as restrições que decorrem da crise sanitária”, afirmou. A ex-eurodeputada socialista admitiu não ter ficado surpreendida com o anúncio de recandidatura e mostrou-se disponível para debater com todos os candidatos às presidenciais.
“Ainda bem que o Sr. Presidente finalmente assumiu que se recandidatava”, disse, acrescentando, no entanto, que mantém a convicção de que a posição tomada por Marcelo no caso Camarate “é pôr em causa as mais altas instituições do Estado”.
“A posição do professor Marcelo Rebelo de Sousa em relação ao que se passou em Camarate, pelos visto ele não acredita no que está no relatório oficial e nada fez como Presidente da República para que, de facto, o Estado não esteja a propor uma versão que, segundo ele, não corresponde à verdade. Do meu ponto de vista, isto é pôr em causa as mais altas instituições do Estado”, considerou.
Ana Gomes acrescentou que Marcelo Rebelo de Sousa é “o principal artífice” do acordo do Chega nos Açores, considerando que isso “não o faz cumprir e fazer cumprir a constituição” e que o acordo é “altamente desestabilizador da República e da democracia”.
Da importância dos debates
Já o candidato presidencial João Ferreira sustentou também esta quarta-feira que no actual contexto de pandemia é preciso um Presidente da República que defenda o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a valorização dos salários.
João Ferreira, membro da Comissão Política do PCP e candidato às presidenciais, apoiado pelo seu partido e pelo PEV, assumiu esta posição após ser questionado sobre o discurso de recandidatura desta segunda-feira. Na resposta aos jornalistas à sede da Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas de Portugal, em Lisboa, salientou que Marcelo Rebelo de Sousa invocou o actual contexto de pandemia e consequente crise económica e social ao anunciar a decisão de se candidatar a um segundo mandato.
Para o candidato presidencial do PCP, essas são “boas razões” para “um outro exercício dos poderes do Presidente da República”, que seja “efectivamente alinhado com o juramento que ele faz no momento da tomada de posse: defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição”.
João Ferreira referiu-se em concreto à defesa do SNS e à valorização dos salários, matérias em que, no seu entender, “nem sempre aconteceu nos últimos anos” um exercício das funções de Presidente da República correspondente ao que estabelece a Constituição.
“Precisamos de alguém que tenha em conta na sua acção aquilo que dispõe a Constituição: é que o direito à saúde se assegura através de um SNS geral, universal, tendencialmente gratuito. Não é esta visão que tem propriamente prevalecido a partir do exercício dos poderes do Presidente da República, que tende muito mais a acolher aquelas visões que normalmente põem em pé de igualdade o SNS e aquilo que eu chamaria o negócio da doença, o negócio que alguns grupos económicos fazem com a doença”, sustentou.
O candidato apoiado pelo PCP e pelo PEV recordou que o Presidente há um ano, ao promulgar o aumento do salário mínimo nacional para 635 euros em 2020 considerou tratar-se de “uma solução razoável, a pensar na economia e na sociedade portuguesa”.
“Este é um valor que hoje arrasta para a pobreza milhares de trabalhadores que têm este salário mínimo nacional. Ele, quando foi criado, permitiu retirar da pobreza milhares de trabalhadores - o problema é que se desvalorizou ao longo dos anos. E a Constituição que foi aprovada em 1976 aponta para a necessidade de valorização desse salário mínimo nacional como dos outros”, argumentou.
Interrogado sobre a disponibilidade manifestada por Marcelo Rebelo de Sousa para debater frente a frente com todos os candidatos às presidenciais e sobre a importância que atribui a esses debates, João Ferreira respondeu: “Espero que possam ser momentos importantes de esclarecimento e de mobilização para o voto”.
“No contexto que estamos a viver, em que acaba por nos impor alguns constrangimentos, algumas limitações àquilo que normalmente faríamos numa campanha eleitoral, ganha ainda maior importância a cobertura que os órgãos de comunicação social possam fazer das diferentes candidaturas e também os debates televisivos”, acrescentou.