No Brasil, as mulheres entraram nas câmaras municipais — e, com elas, a diversidade

Apenas uma em cada dez candidaturas a prefeito é de uma mulher, e nenhum partido apresentou mais candidatas do que candidatos. Ainda assim, numas eleições municipais que abriram a porta à diversidade, houve mulheres trans, negras, anti-racistas e “faveladas” eleitas. Reunimos algumas das novas vereadoras.

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As eleições municipais, que aconteceram este domingo, 14 de Novembro, no Brasil, significaram um fracasso para os candidatos apoiados por Bolsonaro e mostraram que os eleitores voltaram a preferir os partidos tradicionais. Pelas câmaras municipais de todo o país, mulheres assumiram cargos e trouxeram novas promessas: pela comunidade trans, negra e das favelas. E pelas mulheres, num país onde apenas uma em cada dez candidaturas a prefeito é de uma mulher e onde elas não dominaram as listas de nenhum partido. Damos a conhecer seis que se tornaram vereadoras.

Erika Hilton, mulher trans

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Tem 27 anos e é a primeira mulher negra trans a sentar-se na Câmara Municipal de São Paulo. Candidata pelo PSOL, foi a sexta mais votada, com 50508 votos, e ocupa o cargo de vereadora ao mesmo tempo que Thammy Miranda, candidato do PL, também trans.

A sua eleição, disse ao Folha de São Paulo, é uma “resposta ao fascismo que Bolsonaro e o bolsonarismo” levaram para o Brasil. “Nós nos sentimos muito acusadas e amedrontadas com a eleição do Presidente e percebemos que, se não nos organizássemos e nos colocássemos dentro das Casas Legislativas para tomadas de decisão, talvez nós continuássemos sendo aniquiladas de forma bárbara”, referiu, na mesma entrevista.

Propõe-se a melhorar e ampliar o projecto Transcidadania — de reintegração social para travestis, mulheres e homens trans em situação de vulnerabilidade — e a reforçar as casas de acolhimento para “pessoas trans em situação de rua”.

Mônica Benício, viúva de Marielle

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Viúva de Marielle Franco, assassinada em 2018, Mônica Benício chega à Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro com uma promessa: “Marielle não será interrompida.” Com 22 mil votos, a candidata conseguiu a eleição e afirmou, em entrevista ao G1, que vai defender os moradores de favelas, a luta LGBTQA+, o anti-racismo e as mulheres.

“A minha história jamais poderá estar desentrelaçada da memória da Marielle. O que eu tenho com Marielle, além do amor, é a afinidade política”, referiu. Por isso, o seu compromisso é, “além de representar todos os projectos que Marielle colocou” no discurso político, conseguir “uma cidade comprometida com a vida das mulheres, com a luta LGBT e com a pauta anti-racista”. Pelo caminho, vai assegurar-se de que “a favela e o favelado” vão para “o centro do debate da política pública”.

Duda Salabert, mulher trans

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Foi a vereadora mais votada da história de Belo Horizonte. E também a primeira mulher trans eleita na capital de Minas Gerais. Duda Salabert, professora há 20 anos, compromete-se a actuar nas áreas da educação, social e ambiental — e voltar a conquistar o título de “cidade jardim” para o município, até porque se comprometeu a plantar uma árvore por cada voto que recebesse.

“É uma vitória dos direitos humanos, porque eu faço parte de um grupo que foi historicamente excluído e marginalizado na sociedade, que é o grupo das pessoas travestis e transexuais. Mas é, sobretudo, uma vitória da educação”, disse ao G1.

Beatriz Caminha, a mais jovem

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Com 21 anos, Beatriz (ou Bia) Caminha tornou-se na candidata mais jovem eleita para a Câmara Municipal de Belém. Estudante de arquitectura e urbanismo, vice-presidente do PT, bissexual e feminista: assim é a nova vereadora que afirma que é prioritário pensar a cidade, o saneamento básico, a habitação e que quer que as políticas públicas tenham como ponto de partida as desigualdades.

É uma das seis mulheres eleitas para ocupar os 35 lugares na Câmara Municipal de Belém e disse ao G1 que espera trabalhar ao lado de outras mulheres negras eleitas em Belém porque, acredita, “quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela: todas as estruturas de opressão têm como base as mulheres negras, então isso já é um primeiro passo para a gente conseguir empoderar as meninas negras, conseguir se ver nos espaços de representação e também pensar cada política a partir das mulheres negras”.

Benny Briolly, mulher negra trans

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“Vai ter mulher preta travesti na Câmara de Niterói”: foi assim que Benny Briolly celebrou a vitória no Twitter. Mas a sua auto-definição vai além disso: “Mulher preta travesti favelada, feminista, ecossocialista, do movimento negro e LGBTI+, militante de direitos humanos e do PSOL.”

Ao Globo, a candidata agora eleita referiu que é preciso “derrotar o bolsonarismo” e “superar o fascismo, o autoritarismo, o racismo, machismo, LGBTfobia e esse capitalismo predatório”. Para isso, propõe-se a priorizar a “assistência social e direitos humanos para o povo preto, favelado, mulheres e LGBTIA+”.

Dani Portela, advogada negra anti-racista

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A candidata pelo PSOL foi a mais votada no Recife e tornou-se, assim, na segunda mulher a ocupar o cargo, sucedendo a Michele Collins, eleita em 2016. “Um desafio histórico é a resposta do Recife (…), a terra que queria também colocar pessoas negras na centralidade desse poder”, referiu a anova vereadora eleita ao Diário de Pernambuco. A sua agenda política é, precisamente, a comunidade negra — em especial as mulheres: “Somos sub-representadas, as mulheres negras não chegam a 2% desses cargos. Então eu entendo que estar no lugar de ser a mais votada é uma retoma dos territórios políticos.”

Dedicou a vitória a Marielle Franco, com quem diz ter estado dois dias antes do seu assassinato. “Eu não estou sozinha. Tem muitas que vieram antes de mim. Então é justamente por isso que eu acho importante a representação que tem uma mulher negra, de esquerda, de um partido socialista, diante da conjuntura nacional desse país.”

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