Tripulantes saem da reunião na TAP com “uma mão cheia de nada”
Viemos de lá tal como chegámos”, afirmou ao PÚBLICO o presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), Henrique Louro Martins, referindo-se ao primeiro encontro ligado ao plano de reestruturação da empresa que está a ser ultimado.
Com um plano de reestruturação prestes a ser ultimado, o presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), Henrique Louro Martins, diz que saiu da reunião desta quinta-feira, marcada a pedido da empresa, com “uma mão cheia de nada”. O SNPVAC é um dos 14 sindicatos que a transportadora convocou para hoje e amanhã, além da comissão de trabalhadores, para partilhar “os principais indicadores e variáveis que afectam o plano” de reestruturação a ser entregue em Bruxelas até 10 de Dezembro. Foram apresentados dados referentes à empresa, e à indústria, mas de carácter técnico, e de forma confidencial.
Sobre a redução da frota, e cenários em cima da mesa, nada foi dito, de acordo com Henrique Louro Martins, e muito menos sobre objectivos de descida de custos com pessoal, e da redução do número de trabalhadores. “Viemos de lá tal como chegámos”, afirmou ao PÚBLICO o presidente do SNPVAC, acrescentando não perceber a estratégia da empresa, até porque não foi calendarizada nova reunião. Fica, diz, “o receio de que seja imposta uma solução”. Destacando que o encontro com os representantes da TAP acabou por ser “um pouco frustrante”, adiantou que uma das ideias-chave da reunião foi a de os responsáveis pelo plano não querem “uma TAP pequena”.
Em comunicado, o SNPVAC afirmou que, “a menos de um mês da apresentação do Plano à DG Comp (Directorate-General for Competition)”, contava que hoje lhe fossem apresentadas “as medidas concretas que decorrerão da implementação do plano de reestruturação”. “Surpreendentemente (ou não) a apresentação feita centrou-se na descrição da actual situação da empresa, assim como do sector da aviação em geral, adiantando apenas os pressupostos gerais sobre os quais assentará a construção do plano, nomeadamente no que refere os cenários da IATA e do EuroControl”, afirma o sindicato. “No entanto”, acrescenta, “o SNPVAC considera que para além dos pressupostos e dos cenários macro, urge saber quais as medidas concretas que terão impacto nos tripulantes de cabine”.
Os sindicatos e a CT não estão a reunir-se com elementos da administração, mas sim com responsáveis da Boston Consulting Group (BCG), a consultora que está a ajudar a elaborar o plano de reestruturação, com o director de recursos humanos, Pedro Ramos, e com Miguel Malaquias Pereira, ligado ao plano como project management officer.
Esta é a primeira vez que os sindicatos são convocados depois de ter sido anunciado que o grupo ia ser alvo de um processo de reestruturação, na sequência das ajudas prestadas pelo Estado - para este ano estão previstos 1200 milhões de euros.
No final do ano passado, a frota do grupo era composta por cerca de 105 aviões, dos quais perto de 90 ao serviço da TAP SA e os restantes da Portugália. Recentemente, o ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, afirmou no Parlamento que algumas encomendas estavam a ser canceladas e que a empresa estava “a negociar a devolução de alguns aviões”.
Empresas apostam no corte de custos com trabalhadores
Em 2019, ano em que o grupo teve um prejuízo de 105,6 milhões de euros, os gastos com pessoal foram a segunda grande rubrica de gastos do grupo TAP, no valor de 751,9 milhões de euros, 7% acima de 2018. O combustível para aeronaves chegou aos 789,6 milhões. Olhando apenas para a TAP SA, a companhia área subiu os custos com pessoal em 11,7%, para 678,6 milhões de euros. Em 2015, ano da privatização, a TAP SA contava com 7284 trabalhadores, número que passou para 9006 no final de 2019.
O corte de custos com pessoal tem sido uma medida aplicada pelas companhias aéreas a nível global, incluindo as que receberam ajudas de Estado como é o caso da Lufthansa. No final de Outubro, a associação mundial do sector, a IATA, divulgou uma pequena análise na qual afirmava que era necessário um enorme corte nos custos fixos e semifixos para tentar recuperar a rentabilidade, num quadro de queda abrupta de receitas.
De acordo com essa análise, o adiamento na entrega de novas aeronaves e a retirada antecipada de aviões do mercado vão subir “significativamente” no ano que vem, depois de um grande aumento este ano. Além disso, uma reorientação para os voos de médio curso também pode ajudar as companhias a limitar os custos com a frota.
De resto, a IATA destaca que as despesas com o aluguer com aeronaves estão a descer, mas “devagar”, que os custos com as taxas dos aeroportos estão mais baixos devido à redução dos voos, e que o combustível, apesar de ser a maior factura, é um custo variável (além de que já esteve mais elevado).
Para a associação que representa as principais companhias aéreas, a única opção para cortar despesas, com um peso relevante, é a que está ligada à força de trabalho, seja ao nível dos salários seja ao nível do número de pessoas. Sem isso, e tendo como base os indicadores de 2019, no ano que vem a produtividade das empresas teria uma redução de 40%. A IATA adianta, no entanto, que mesmo um “grande corte dos custos laborais” não consegue garantir o equilíbrio financeiro, e que as companhias aéreas precisarão de mais apoios para parar de perder dinheiro.