Portugueses continuam a sair de casa durante o dia, mas cumprem o recolher obrigatório
Na última semana, quase um terço da população não saiu de casa durante os dias de semana. Há mais gente em confinamento, mas os números estão bem abaixo dos registos do primeiro estado de emergência.
Com o novo estado de emergência imposto pelo Governo já em vigor, os portugueses têm continuado a sair de casa durante o dia, mas cumprem as orientações que obrigam o recolher obrigatório nocturno, com 97% da população a permanecer em casa entre as 23h e as 5h na segunda e terça-feira desta semana. A percentagem está ao nível dos valores de Abril.
As conclusões são de um relatório da consultora PSE, especializada em ciência de dados, que mostram que houve uma “antecipação do confinamento mesmo antes de ser declarado este novo estado de emergência”, logo a partir da semana de 11 a 17 de Outubro.
“Quem tem hipótese de trabalhar remotamente começou a fazê-lo antes da obrigatoriedade do teletrabalho. Mas nem toda a população pode teletrabalhar e quem tem de desempenhar actividades que obrigam a deslocações está a fazê-lo”, explica ao PÚBLICO Nuno Santos, coordenador do projecto da PSE.
De 2 a 6 de Novembro, o valor médio de portugueses em confinamento foi de 32,7%; apenas mais 0,2% do que a média da última semana de Outubro (as restrições nos 121 concelhos mais afectados entraram em vigor a 4 de Novembro). Uma variação reduzida, especialmente se olharmos para os valores da primeira quinzena de Outubro, em que se registou um confinamento médio de 32,5% em dias úteis.
Durante os fins-de-semana, o confinamento sobe – no passado fim‑de‑semana, 45% das pessoas ficaram em casa.
Os indicadores estão longe do que se verificou durante o primeiro estado de emergência, em que o confinamento médio semanal chegou a ultrapassar os 60%.
Portugueses não saíam de casa à noite; agora saem ainda menos
O relatório da PSE enviado ao PÚBLICO realça, no entanto, que uma parte da população já tinha tendência a ficar em casa antes da pandemia, um “confinamento natural” que em média variava entre os 25 e os 28%.
A consultora conclui que a antecipação às medidas de restrição nos 121 concelhos mais críticos se reflectiu “num aumento de confinamento adicional de cerca de 6%, que correspondeu ao movimento de cerca de 420 mil portugueses”, efectuado em maior parte pela população activa entre os 25 e 45 anos.
A análise da PSE indica também que 96% da população não saiu de casa entre as 23h e as 5h nos dois primeiros dias do actual estado de emergência (segunda e terça-feira), “os mesmos valores do primeiro estado de emergência”, em Abril. Ainda assim, a consultora sublinha que os portugueses “já têm confinamentos elevados” durante este período nocturno, com valores entre 88 e 90% ainda antes da pandemia – e durante os meses deste Verão.
A população tem, por isso, cumprido o recolher obrigatório, mas continua a desenvolver as suas actividades “com normalidade”. Durante a semana passada, 90% das pessoas saíram pelo menos uma vez de casa, e até esta terça-feira 77,4% dos portugueses já o tinham feito. Nestas saídas enquadram-se os mais diversos motivos, desde viagens para o trabalho até uma ida ao supermercado.
Condicionar mais a mobilidade para ter menos transmissão
A PSE antecipa uma percentagem de portugueses na rua a rondar de novo os 90% esta semana, alertando que o impacto do novo pacote de medidas “está limitado pela população que pode confinar e desenvolver simultaneamente a sua actividade”.
As medidas até agora aplicadas não condicionaram de forma muito significativa a mobilidade dos portugueses, em parte porque opções mais restritivas causam quebras na economia. Nuno Santos considera que a solução pode passar por voltar a implementar o regime de vídeo-aulas nos alunos mais velhos, mais concretamente a partir do terceiro ciclo.
“Para reduzir interacções, contágio e mobilidade, a medida com menor impacto na actividade económica é o fomento do ensino online nos escalões etários mais autónomos”, reconhece o analista de dados.
Além desta medida, a PSE entende que os inquéritos epidemiológicos devem incluir a recolha do perfil de mobilidade das pessoas, de forma a “identificar potenciais supertransmissores”, consoante a sua maior ou menor mobilidade.
“Como indicador avançado, o perfil de mobilidade das pessoas pode ser um indicador para detectar focos futuros”, explica Nuno Santos.
A recolha de dados da PSE é feita a partir de uma aplicação em smartphones (com recolha de dados contínua através de monitorização de localização e meios de deslocação via aplicação móvel) e abrange pessoas com mais de 15 anos das regiões do Grande Porto, Grande Lisboa, litoral norte, litoral centro e distrito de Faro. Ainda que se trate de uma amostra representativa da sociedade portuguesa, os responsáveis do projecto referem que uma das limitações do estudo é o facto de não incluir as regiões do interior e do Alentejo.
Para um universo de 6.996.113 indivíduos residentes nas regiões estudadas a margem de erro imputável ao estudo é de 1.62% para um intervalo de confiança de 95%.