Lukashenko admite partilhar o poder na Bielorrússia
O Presidente cujo poder é contestado foi discursar perante trabalhadores em greve, que o apuparam. Afasta a possibilidade de novas eleições. Charles Michel convocou reunião extraordinária do Conselho Europeu para quarta-feira.
Confrontado com uma greve geral, o Presidente bielorrusso, Aleksander Lukashenko, disse estar disposto a alterar a Constituição para partilhar o poder – “mas não sob pressão”, afirmou.
Segundo a agência noticiosa Belta, citada pela Reuters, Lukashenko disse, num discurso perante trabalhadores em greve numa fábrica de máquinas agrícolas, que já estão a decorrer acções para alterar a Constituição, sem especificar quais. “Não podemos entregar esta Constituição sabe Deus a quem. Porque aconteceriam desastres”, disse. Os trabalhadores gritaram-lhe “vai-te embora” e ele terminou o discurso dizendo “obrigado”.
No entanto, Lukashenko afastou qualquer possibilidade de realizar novas eleições, uma vez que há suspeitas de grandes irregularidades nas de 9 de Agosto. “Não, até que me matem”, declarou, segundo relatos dos media bielorrussos. “Já tivemos eleições. Até que me matem, não haverá outras eleições”, disse o Presidente bielorrusso citado pela Tut.by, um dos portais de notícias independentes mais famosos na Bielorrússia.
Numa mensagem a partir da Lituânia, onde está exilada, Svetlana Tikhanouskaia, garantiu estar pronta para liderar o país de forma interina e apelou à criação de mecanismos legais para garantir a realização de novas eleições que possam ser livres e justas.
“Estou pronta para assumir a responsabilidade e agir como líder nacional durante este período, para que o país possa acalmar e voltar a um ritmo normal, para que possamos libertar todos os presos políticos o mais rápido possível e para que nos possamos preparar para novas eleições presidenciais”, disse Tikhanouskaia, citada pelo Guardian.
Entretanto, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, convocou uma reunião de emergência para a próxima quarta-feira, às 12h00. “O povo da Bielorrússia tem o direito a decidir sobre o futuro e eleger livremente o seu líder. A violência contra manifestantes é inaceitável e não pode ser permitida”, escreveu Michel no Twitter.
I will call a meeting of the members of the European Council this Wednesday 12h00 to discuss the situation in #Belarus
— Charles Michel (@eucopresident) August 17, 2020
The people of Belarus have the right to decide on their future and freely elect their leader
Violence against protesters is unacceptable and cannot be allowed
Com a contestação a Lukashenko a evoluir rapidamente, os 27 Estados-membros da União Europeia acompanham com preocupação a resposta do regime. Nesta reunião, segundo referiram fontes europeias ao PÚBLICO, os líderes da UE querem enviar uma mensagem de solidariedade ao povo bielorrusso, sublinhado que este “tem o direito de determinar o seu futuro e escolher os seus líderes livremente”. A UE defende, por isso, o fim da violência, a diminuição da tensão e o diálogo, “sem interferência estrangeira”, como solução para sair da actual crise.
The violence against peaceful protesters in Belarus is appalling. The UK does not accept the results of this fraudulent Presidential election & calls for an urgent investigation through @OSCE into its serious flaws & the grisly repression that followed. https://t.co/VPJ4yrTCXZ
— Dominic Raab (@DominicRaab) August 17, 2020
Bruxelas já referiu que as eleições do último dia 9 de Agosto não foram livres nem justas e que, por isso, não reconhece os resultados. Além disso, exige a libertação de todos os manifestantes pacíficos que ainda estão detidos, condenando a violência “desproporcional e inaceitável” exercida pelas autoridades.
Na reunião, que decorrerá por videoconferência, acrescenta a Reuters, estará em cima da mesa a discussão de um fundo para as vítimas da repressão do regime, o financiamento de projectos para apoiar o pluralismo nos media, novos mecanismos para facilitar o intercâmbio de estudantes bielorrussos e a entrada de trabalhadores bielorrussos na UE.
Na última sexta-feira, numa reunião extraordinária, os ministros dos Negócios Estrangeiros da UE deram luz verde à elaboração de uma lista de figuras do regime bielorrusso a quem deverão ser impostas sanções.
“A violência contra manifestantes pacíficos na Bielorrússia é apavorante. O Reino Unido não aceita os resultados das eleições presidenciais fraudulentas e pede uma investigação urgente através da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa”, disse esta segunda-feira Dominic Raab, ministro dos Negócios Estrangeiros britânico.
#BREAKING! In #Minsk, #Belarus, workers of the state TV reportedly joined the nationwide strike in #protest against rigged election results & police brutality.
— Alex Kokcharov (@AlexKokcharov) August 17, 2020
This is what this morning's state TV show looked like:pic.twitter.com/IonISHw8bh
No domingo, uma manifestação de 200 mil pessoas em Minsk exigiu a demissão de Lukashenko, após uma semana de contestação nas ruas.
Para esta segunda-feira, a oposição na Bielorrússia convocou uma greve geral, depois de, no final da semana passada, vários sectores industriais – outrora bastiões de apoio a Lukashenko – terem começado a contestar o regime e a juntar-se aos manifestantes que exigem a saída do actual Presidente, que governa o país há 26 anos.
É expectável que a greve se estenda a outros sectores, incluindo refinarias, fábricas de tecidos e fertilizantes, bem como aos media, numa altura em que cada vez mais jornalistas queixam-se das restrições que lhes têm sido impostas na cobertura dos protestos. A emissora estatal BT entrou em greve, depois de vários jornalistas e funcionários se terem juntado aos manifestantes na semana passada. Durante a manhã, antes do noticiário, foram transmitidos programas antigos e, nas redes sociais, circulam vídeos de redacções vazias, com música de fundo.
Pressionado interna e externamente, Lukashenko virou-se para a Rússia durante o fim-de-semana para pedir ajuda e alertou que a escalada de contestação poderia chegar a Moscovo. Do Kremlin, recebeu a garantia de que os "problemas serão resolvidos em breve", tendo Vladimir Putin mostrado abertura para enviar ajuda militar.