Facebook diz que “todos ganham” com cabo de Internet que dá a volta a África
O engenheiro responsável pelos investimentos de conectividade do Facebook explica os benefícios do novo cabo submarino com 37 mil quilómetros que passa por Portugal e dá a volta a África.
Em Maio, o Facebook desvendou planos para construir um enorme cabo de Internet submarino que começa no Reino Unido, passa por Portugal, contorna o continente africano — passando por Madagáscar, Djibuti, Omã e pela Arábia Saudita — e termina em Espanha. O objectivo é aumentar o acesso e a qualidade de Internet no continente africano onde mais de metade da população ainda não tem acesso ao mundo online.
Em entrevista ao PÚBLICO, Ibrahim Ba, engenheiro responsável pelos projectos de conectividade do Facebook em mercados emergentes, descreve o investimento como “significativo”, mas mostra-se confiante dos benefícios do cabo para a rede social e o continente africano a longo prazo. Com 37 mil quilómetros de comprimento, o 2Africa será quase capaz de dar a volta ao planeta.
“Não podemos revelar valores exactos, mas trata-se de um investimento bastante significativo. Há várias entidades a trabalhar no projecto numa altura em que investir em conectividade torna-se cada vez mais importante”, sublinhou Ibrahim Ba. “A pandemia da covid-19 mostrou a importância de boa Internet.”
O projecto, que deverá estar concluído em 2023, resulta de uma parceria entre o Facebook e operadoras de telecomunicações nos vários países por onde o cabo passa como a MTN, Vodafone, Djibouti Telecom, Orange e China Mobile — que formam o consórcio 2Africa.
Quando estiver concluído, o cabo passará por 23 países, ficará a três metros da superfície (para não ser afectado por actividades de pesca, por exemplo) e permitirá a transmissão de até 180 terabits de dados por segundo em algumas regiões — uma velocidade idêntica à dos cabos modernos que ligam, por exemplo, os EUA à Europa.
Esta capacidade será uma base importante para permitir fazer crescer a velocidade de transferência de dados no continente africano. A título de exemplo, a velocidade média de download na rede fixa em Angola ronda os 14,5 MB/s, segundo o Global Index da Speedtest (dados de Abril de 2020) — em Portugal, a média é de 99,7 MB/s.
"Todos ganhamos"
Ibrahim Ba não nega que a construção do cabo poderá aumentar o número de potenciais utilizadores do Facebook. Em 2020, mais de 60% da população no continente africano ainda não tem sequer acesso à Internet de acordo com dados apresentados no site Internet World Stats que são compilados pelo grupo de marketing Miniwatts.
“É uma ‘win win situation’ em que todos ganhamos”, reconhece o engenheiro. “A verdade é que o Facebook vai melhorar a conectividade dos habitantes do continente africano quer estejam, ou não, nos canais do Facebook”, frisa Ba. “Ao mesmo tempo, nós [Facebook] temos muitos utilizadores na África, Europa e Médio Oriente que podem beneficiar de melhor conectividade. Todos ganhamos”, explica Ibrahim Ba. “E os países europeus por onde o cabo passa, como Portugal, serão um polo de conectividade ainda maior.”
A empresa afasta a ideia de que o cabo vai beneficiar a rapidez de navegação o Facebook em detrimento de outros serviços online. “Estamos a trabalhar com empresas de telecomunicação, e o cabo passa por 23 países”, lembra Ba. “O que o cabo vai assegurar uma maior diversidade de rede”, explica o engenheiro. “Falo na capacidade do cabo continuar a funcionar se existirem problemas numa zona. Como o cabo não depende de uma só entidade, se houver um corte a Este de África, continuará a existir internet no Oeste.”
A rapidez do cabo resulta do investimento em novas tecnologias como a SDM1 (sigla ingesa para Spacial Division Multiplex), que permite aumentar o número de fibras nas redes de comunicação ópticas que são responsáveis pelo transporte de dados na Internet. Assim, em vez dos tradicionais oito pares de fibras dos canais de Internet subterrâneos, o cabo 2Africa terá 16 fibras ópticas.
“As 16 fibras ópticas, o facto de o cabo ficar a uma profundidade 50% maior que o habitual e a enorme diversidade geográfica são alguns dos elementos que lhe dão destaque”, repete Ibrahim Ba.
Ambições além de África
África, porém, não é a única região onde o Facebook está a tentar “levar Internet”. Além de vários cabos que ligam os EUA à Europa, em 2017 o Facebook anunciou a criação de um cabo de 13 mil quilómetros entre Hong Kong, na China, e os EUA que permitiria acesso seguro aos centros de dados na Ásia. Tratava-se de uma parceria com a Google, mas a actual guerra comercial entre os EUA e a China impediu que o projecto avançasse. Entre 2014 e 2018, o Facebook também tentou criar um drone gigante, movido por energia solar, chamado “Aquilla”, para distribuir Internet em zonas remotas.
“Queremos continuar a trabalhar em infra-estrutura para melhorar a Internet”, diz Ibrahim Ba. É uma estratégia partilhada por outras gigantes tecnológicas, com a Google a anunciar o seu próprio projecto ara levar Internet em África em Junho de 2019 – menos ambicioso que o 2Africa, o Equiano, liga Portugal, Nigéria e a África do Sul.
“No Facebook tentamos investir numa infraestrutura global porque temos de servir utilizadores em diferentes pontos do mundo... Na Ásia, na África, e na Europa”, recorda Ibrahim Ba. “O actual foco em África, deve-se ao facto de parte do continente ainda não ter acesso a boa conectividade. É uma prioridade.”
O cabo do Facebook deverá estar terminado entre 2023 e 2024. Para já, não se prevêem atrasos devido à pandemia da covid-19. “Estamos a monitorizar. Pode haver um impacto, mas ainda não sabemos”, nota Ibrahim. “A vantagem é que a primeira parte deste projecto são estudos, inquéritos e trabalho que se pode fazer da secretária.”