Bruxelas avança com plano europeu de combate à lavagem de dinheiro
Vice-presidente executivo, Valdis Dombrovskis, diz que a Comissão aprendeu com os problemas do passado e tirou consequências dos escândalos recentes, como o “Luanda Leaks”
Sem querer “nomear e envergonhar” nenhum dos Estados-membros da União Europeia, o vice-presidente executivo da Comissão Europeia, Valdis Dombrovskis, reconheceu que o novo plano de acção para uma política global de combate à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, aprovado esta quinta-feira, foi desenhado para responder às fragilidades dos sistemas nacionais expostas em recentes escândalos financeiros — caso do chamado “Luanda Leaks”, que teve forte impacto em Portugal.
“Fizemos uma análise muito cuidada de todos os casos que foram reportados”, afirmou aquele responsável ao PÚBLICO, após a apresentação do novo plano de acção europeu, que inclui várias medidas que o executivo prevê lançar durante os próximos 12 meses para fortalecer a aplicação das normas, melhorar a coordenação das Unidades de Inteligência Financeira dos Estados-membros e promover a partilha de informação.
“Temos estado a aprender com os problemas do passado, e a tirar consequências dos vários escândalos de corrupção e branqueamento com que nos confrontamos nos últimos tempos”, garantiu o vice-presidente executivo da Comissão.
Sem querer referir-se especificamente ao caso de Portugal — que foi um dos oito países que se atrasou na transposição da última (a quinta) directiva europeia contra o branqueamento de capitais (AML ou Anti-Money Laundering), adoptada em Maio de 2018 — Dombrovskis constatou que os Estados-membros têm uma interpretação “muito divergente” das normas, e uma aplicação “muito variável” e “pouco uniforme” das regras.
“Essas lacunas no sistema podem facilmente ser exploradas pelos criminosos”, observou, em esquemas como os que foram revelados pelos consórcios internacionais de jornalistas como os casos “Panama Papers” e “Luanda Leaks”.
Por isso, a Comissão vai propor, no início de 2021, um “conjunto único e harmonizado” de regras, bem como a instituição de um novo supervisor ao nível da UE, cujo modelo ainda está em discussão.
“Podemos criar uma nova agência europeia, para actuar de forma directa; podemos acrescentar esta supervisão às competências da Autoridade Bancária Europeia”, apontou Valdis Dombrovskis, que também anunciou um novo mecanismo de coordenação e apoio às Unidades de Informação Financeira dos Estados-membros, e a publicação de um novo quadro de orientações para a aplicação das disposições do direito penal e partilha de informações judiciárias e policiais ao nível da UE.
“A iniciativa que adoptámos reforçará as nossas defesas na luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo”, acredita o vice-presidente da Comissão, acrescentando que o executivo está empenhado em eliminar todos os “elos fracos” que facilitam a circulação de dinheiro de origem duvidosa.
A título de exemplo, mencionou o esforço, que decorre em paralelo, de avaliação do regime de Vistos Gold, um sistema que, segundo frisou, a Comissão “gostaria que fosse descontinuado”.
UE revê a lista de países de alto risco
Entretanto, a Comissão Europeia actualizou com 12 novas entradas, e seis saídas, a sua lista de jurisdições com regimes deficientes de detecção e combate do branqueamento de capitais, depois de um “refinamento” da metodologia utilizada para identificar os países terceiros de alto risco cujas fraquezas estratégicas ao nível da transparência representam uma ameaça para a integridade do sistema financeiro e comprometem o funcionamento do mercado interno da UE.
“Estamos a apertar o sistema de combate ao branqueamento de capitais por todos os ângulos, para fechar todas as brechas à infiltração de dinheiro sujo”, disse Dombrovskis, justificando a decisão de rever os critérios utilizados pela Comissão Europeia para avaliar o risco e identificar os países cujos sistemas de combate à lavagem de dinheiro são classificados como problemáticos.
Segundo explicou, o “aperfeiçoamento” da metodologia seguida pela UE (que passará a ter uma maior correspondência com os critérios de avaliação adoptados pelo GAFI, Grupo de Acção Financeira) era uma necessidade, tendo em conta as consequências práticas, nomeadamente em termos de financiamento europeu, para os países que figuram na “lista negra”.
“Quando os países aparecem na lista, os bancos e outros agentes ficam obrigados a aumentar o escrutínio sobre todas as operações financeiras e transacções. Ao nível das instituições, deixa de ser possível a canalização de fundos europeus para esses países, excepto se for para a execução de projectos nesses territórios”, referiu Dombrovskis, que assinala ainda os “danos reputacionais” de ser classificado como um país de alto risco.
Na lista actualizada da UE passaram agora a figurar Baamas, Barbados, Birmânia, Botsuana, Cambodja, Gana, Jamaica, Maurícia, Mongólia, Nicarágua, Panamá e Zimbabwe, tudo países também classificados pelo GAFI como.
As medidas encetadas por seis países, no sentido de maior transparência, levaram a Comissão a propor a retirada da Bósnia-Herzegovina, Etiópia, Guiana, Laos, Sri Lanka e Tunísia da lista de países de alto risco.