Covid-19. Mais de metade dos internados em cuidados intensivos estão no Norte
De acordo com dados do Ministério da Saúde, dos 218 doentes que estavam, até ao final do dia 13, internados em cuidados intensivos, 58,8% estavam-no em hospitais da zona do país com mais casos positivos até ao momento. Ordem dos Médicos questiona distribuição de material na zona centro.
Foi a região norte que registou os primeiros casos de infecção de covid-19, é aquela que tem mais casos positivos, mais mortes registadas até ao momento e também a que tem mais doentes internados em cuidados intensivos. De acordo com dados do Ministério da Saúde, enviados ao PÚBLICO, dos 218 doentes que estavam, até ao final do dia 13, internados em cuidados intensivos, 58,8% estavam em hospitais do Norte. A região de Lisboa e Vale do Tejo era a segunda com mais casos internados em cuidados intensivos (31%), seguida do centro (5,8%), do Algarve (3,5%) e do Alentejo (0,9%).
O boletim da Direcção-Geral da Saúde (DGS) daquele dia dava conta que estavam, além das 218 pessoas internadas em cuidados intensivos, outros 1227 doentes internados nos hospitais. Também deste total a maior percentagem estava em hospitais do Norte do país: 67,3%. Seguia-se a região de Lisboa e Vale do Tejo com 19,8% dos internados e a região centro atrás com 10,3%. O Alentejo tinha 1,4% destes internamentos e o Algarve 1,2%.
Segundo os dados do boletim da DGS publicado esta quarta-feira, o número de internados e de internados em unidades de cuidados intensivos desceu em relação ao dia anterior — menos 27 para um total de 1200 internados e menos dez para um total de 208.
Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, referiu que os casos de internamento, seja em enfermaria ou em cuidados intensivos, “não parecem estar muito elevados” e “reflectem a distribuição de casos positivos no país”. Sem informação de que tenha havido necessidade de transferência de doentes a precisar de cuidados intensivos entre regiões, disse que lhe parece que “a distribuição do material está a ser feita em função da procura”.
Quanto aos casos positivos no país, “não houve um aumento exponencial e isso é positivo, mas ainda não estamos claramente a descer”, alertou. “Há uma estabilização”, disse, referindo que será importante acompanhar o impacto que a Páscoa poderá ter tido. “Pode ter havido menos notificação de casos e maior mobilidade.”
O Governo partilhou mapas da distribuição que fez, até ao dia 11, do material que chegou ao país: testes, equipamentos de protecção individual e ventiladores. A maioria adquirido centralmente pelo Ministério da Saúde, que explicou ao PÚBLICO que a “identificação das necessidades pelas entidades e a capacidade de expansão das camas em cuidados intensivos são os critérios que estão na base da distribuição”. Questionado sobre a região centro, que tem o terceiro maior número de casos positivos e o segundo maior número de mortes (valor absoluto) por covid, e recebeu 12 ventiladores, assegurou que a distribuição foi feita “de acordo com as necessidades identificadas”.
Em resposta por escrito, disse que tem procurado “satisfazer todas as necessidades de máscaras identificadas” e que os testes “são distribuídos tendo em conta as necessidades identificadas em cada momento”. Sobre a distribuição de testes às regiões autónomas explicou que foi decidida uma remessa com maiores quantidades, pois o transporte de reagentes obriga a condições especiais. “Em qualquer outra região de Portugal continental, o transporte por via terrestre é sempre mais facilitado.”
Esta quarta-feira, o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, afirmou que Portugal tem um milhão e 35 mil testes em stock e que “foram distribuídos esta semana mais 265 mil testes pelas cinco administrações regionais de Saúde e as duas regiões autónomas”. O Norte recebeu 45% dos kits e Lisboa e Vale do Tejo cerca de 30%.
“É irrisório o que tem sido distribuído no centro”
Carlos Cortes, presidente da Secção Regional Centro da Ordem dos Médicos, considera que a região não tem merecido a devida atenção. “É irrisório o que tem sido distribuído no centro. Não estou a dizer que os ventiladores são insuficientes, o que digo é que estão a chegar menos do que deviam e do que as necessidades”, disse, pensando numa eventual segunda vaga da pandemia e recordou que já aconteceu existirem doentes transferidos entre hospitais.
Lamentou igualmente que tenham chegado poucos testes àquela região e que a falta de reagentes também tenha limitado o número de pessoas que fizeram testes até agora” – o que faria descer a taxa de letalidade, já que o número de casos positivos provavelmente aumentaria. Por essa razão, olhou para mortalidade tendo em conta a população residente no centro. “Não está mal. O que se deveria tentar perceber é o que está acontecer em Lisboa e Vale do Tejo que tem levado a que morram menos pessoas.” Apontou ainda as “desigualdades de resposta que existem entre concelhos”, uns com hospitais de campanha e hotéis para acolher pessoas que não precisam de internamento e outros sem esta oferta. “Há uma grande falta de coordenação do Ministério da Saúde que devia ter respostas de forma a atenuar estas desigualdades no país”, defendeu.
O bastonário dos Médicos também admitiu que “a região centro pudesse ter mais alguns ventiladores”, embora lhe pareça que a distribuição está de acordo com a realidade do país. “Parece-me acertado que as regiões com mais infectados, que terão mais internados, tenham tido um reforço”, disse, defendendo que toda a informação sobre a disponibilidade dos vários materiais e equipamentos deve estar numa plataforma.
Miguel Guimarães não tem dúvidas de que, se “as coisas estão a correr bem, é por causa da pressão da sociedade civil”. Salientou os movimentos solidários criados para a aquisição de material para ajudar os profissionais de saúde, e não só, e defendeu o uso de máscaras que para os profissionais é decisivo. “Defendemos que devem existir encomendas fortes, porque as máscaras protegem-nos. Podem parecer muitas máscaras, mas devidamente usadas dez milhões de máscaras cirúrgicas dão para cerca de 15 dias”, exemplificou.
A bastonária da Ordem dos Enfermeiros também afirmou que se devidamente usados “o seu gasto é uma brutalidade”. E por isso foi taxativa: “Os equipamentos têm de chegar todas as semanas.” Apesar “da percepção de que a chegada de material está mais bem calendarizada”, Ana Rita Cavaco considerou que “continua a “haver racionamento de material” e afirmou que nem todos os profissionais estão a fazer testes.
Quanto aos ventiladores, afirma: “Não estou preocupada com o número de aparelhos, mas com o número de profissionais para mexer neles.” Esta é a uma área que exige formação específica. A Ordem pediu aos enfermeiros com formação que se mobilizassem: “A primeira bolsa tinha 400 nomes e esta cerca de 300.”