Covid-19: circo parado na Figueira da Foz vive da solidariedade dos cidadãos

Os camiões estão parados num terreno de brita do Ginásio Clube Figueirense que, face à situação, abdicou do pagamento da sua ocupação.

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LUSA/PAULO NOVAIS

O Circo Nederland chegou à Figueira da Foz no início de Março para animar a Páscoa, mas ficou parado à espera que a pandemia acabe. É a solidariedade de quem por lá passa que permite aos artistas sobreviver por estes dias.

Instalados junto ao Ginásio Clube Figueirense, as 12 pessoas deste circo chegaram àquela cidade do distrito de Coimbra a 06 de Março, contando fazer o fim-de-semana seguinte, de 13 a 15. Porém, a declaração de estado de emergência deixou-os parados, sem sítio para onde ir.

“A nossa casa é isto”, diz Eva Van den Berg Monteiro, apontando para os camiões parados num terreno de brita do Ginásio Clube Figueirense que, face à situação, abdicou do pagamento da sua ocupação.

Sem “casa de pedra” ou “terreno” próprio, vivem e trabalham no circo, explicou a mulher de 59 anos, “mais portuguesa que holandesa”, que fundou o Circo Nederland com o seu marido há cerca de 40 anos.

“Antes de virmos para aqui as pessoas já estavam com medo de ir ao circo. Por isso, há quase três meses e meio que não tínhamos dinheiro de bilheteira. O poucochinho que tínhamos guardado foi embora”, conta.

Sem sítio para onde ir e sem rendimentos, valeu ao circo a solidariedade das pessoas da Figueira da Foz, após a situação ter sido relatada na imprensa local e nas redes sociais.

Há quem traga leite, arroz ou carne, caixas de peixe da lota, ração para os seus cães e gatos ou até “bolinhos de côco e doces da Páscoa”, afirma à agência Lusa Eva Monteiro, num momento em que chegava um carro ao local com mais um saco com comida.

“Estamos a viver do que as pessoas nos trazem. O circo é alegria, é brilho, é luz, é sorrisos e aplausos. E agora o circo está nesta situação em que tem que viver do que as pessoas nos dão. É triste, mas por outro lado fico feliz por sentir esta onda de solidariedade”, salienta.

Apesar de preocupada com o futuro, Eva Monteiro realça que a vida para as pessoas do circo nunca foi fácil e que, infelizmente, “sempre passaram por crises”, embora nenhuma como esta.

“Isso faz das pessoas do circo pessoas fortes e positivas”, vinca a agora apresentadora do circo, que já não tem idade para “andar lá em cima”. No entanto, não sabe quando poderá abrir o circo e também não sabe se as pessoas estarão dispostas a ir àquele espaço.

“Quando abrirmos, haverá muitas pessoas que perderam o trabalho, pessoas que estão a pensar como vão manter o seu negócio. Isso tira-me um pouco o sono. Tenho medo do que vai acontecer no futuro”, admite.

Também Cláudio Custódio, que faz “um pouco de tudo” - desde palhaço a malabarista -, mostra receio em relação aos próximos meses.

“Será que vamos sair no verão? Eu não tenho conseguido dormir. Já há dois dias que ando para cá e para lá a pensar se isto vai abrir, se vai sobreviver”, desabafa, referindo que este tempo parado é também “aborrecido” para quem está habituado “à adrenalina de montar, dar o espectáculo e viajar”.

Porém, quando a agência Lusa pergunta se há a possibilidade de o Circo Nederland fechar, Eva Monteiro é peremptória: “Não, não, não”.

“O circo nunca termina. Infelizmente, já não há tantas crianças a dizer que querem ir ver os palhaços e muitas companhias fecharam, por isso é preciso ter muito amor para continuar a lutar. Agora, enquanto conseguirmos retirar um sorriso e umas palminhas, estaremos aqui para continuar”, sublinhou.

Também Cláudio Custódio vinca que enquanto “houver crianças o circo existirá sempre” e assume esperar por melhores dias para voltar a pintar a cara de palhaço.

Por agora, as 12 pessoas deste circo apenas podem esperar, tendo já como certo que, quando o estado de emergência for levantado e puderem voltar a fazer espectáculos irão fazer “uma bonita festa, aqui na Figueira, para agradecer às pessoas que trazerem comida, apoio e um abraço”.