Estados Unidos acabaram com a equipa de controlo de pandemias em 2018
Trump continua a dizer, contra todas as evidências, que não desmantelou a unidade de resposta a pandemias. Em Fevereiro, afirmava que o vírus desapareceria em Abril, com o calor, quando o exército previa 80 mil a 150 mil mortos. Hoje, a Casa Branca aceita que morrerão nos EUA 100 mil a 240 mil pessoas.
A Administração de Donald Trump diminuiu a capacidade de resposta do país a epidemias ao acabar com a unidade de pandemias do Conselho de Segurança Nacional (NCS, na sigla original) em 2018. A reorganização no NCS, imposta pelo então conselheiro John Bolton, levou, na altura, à demissão do contra-almirante Timothy Ziemer, o oficial que estaria a cargo de coordenar as operações.
Vários responsáveus alertaram o Governo federal para o perigo. Um tweetpremonitório de Maio de 2018, publicado por Stephen Schwartz, analista nuclear do Bulletin of the Atomic Scientist, tem vindo a ser amplamente partilhado agora.
Com o link para um artigo do Washinton Post, Schwartz escrevia a 10 de Maio de 2018: “Quando a próxima pandemia chegar (e não tenham dúvidas de que vai chegar) e o Governo federal for incapaz de responder de maneira coordenada e eficaz para proteger a vida dos cidadãos dos EUA e outros, será por esta decisão de John Bolton e Donald Trump.”
Na quinta-feira, depois de Trump ter acusado o ex-Presidente Barack Obama de lhe ter deixado “maus testes” para um vírus que não existia quando o seu antecessor deixou a Casa Branca, John Roberts, da Fox News, referiu-se ao desmantelamento da equipa de resposta a pandemias no NCS e, antes de garantir que a história era “falsa”, o chefe de Estado atacou o jornalista.
“Dizem que acabou com o gabinete de pandemias do NCS”, introduziu o jornalista, antes de ser interrompido por Trump. “Não fizemos nada disso. Isso acabou por se demonstrar que era uma história falsa. O que estás a fazer, a trabalhar para a CNN?”, perguntou sarcasticamente o Presidente, de acordo com o The Intercept.
O mês passado, no Congresso, Anthony Fauci, o principal especialista em doenças infecciosas nos EUA que tem estado a aconselhar Trump nesta pandemia, em resposta a uma pergunta do congressista democrata Gerald Connoly, não quis classificar a decisão de desmantelar a unidade do NCS como um erro, mas “teria sido bom se o gabinete ainda existisse”.
Connoly é o mesmo que, em 2018, juntamente com o congressista Ami Bera, enviou a seguinte mensagem a Bolton: “Receio que as decisões tomadas agora deixem os Estados Unidos vulneráveis a pandemias e nos obriguem a uma estratégia de triagem se uma acontecer.”
O senador Sherrod Brown mostrou o mês passado no Twitter uma carta que enviou em Maio de 2018, poucos dias depois de a Administração “ter despedido toda a equipa de pandemias da Casa Branca”, a questionar o Presidente sobre o assunto. O senador democrata sublinhava a necessidade de ter uma pessoa no NSC “que possa coordenar o trabalho das agências para assegurar que temos os recursos necessários para nos precaver e responder a qualquer surto que ameace os Estados Unidos”.
Apesar das sucessivas chamadas de atenção por parte da comunidade científica de que o risco de uma pandemia era elevado, a Casa Branca nunca agiu nesse sentido. Em Fevereiro, andava o Presidente norte-americano a minimizar o impacto do coronavírus e o exército projectava que no pior dos casos “entre 80 mil e 150 mil pessoas poderiam morrer”, de acordo com um documento do US Army-North citado pelo Daily Beast.
Esta semana, a Casa Branca admitiu que a pandemia poderá matar 100 mil a 240 mil pessoas, no melhor dos casos. As previsões são sempre falíveis, mas estão baseadas em premissas como padrões de evolução da doença em outros países, capacidade de resposta, meios e liderança e, no topo disso tudo, vontade política. E Trump, ainda esta sexta-feira, em conferência de imprensa, em vez de dar o exemplo e usar a protecção recomendada pela autoridade de saúde pública, recusou. “O Centro de Prevenção e Controlo de Doenças aconselha tapar a cara com um tecido como uma medida voluntária de saúde pública. Isto é voluntário. Acho que não vou fazer isso.”