Câmara desocupou 11 casas no Bairro Alfredo Bensaúde mas famílias dizem não ter sido avisadas
As famílias tinham ocupado casas há vários anos. Acusam a autarquia de ter procedido às desocupações, sem aviso prévio, no entanto, esta assegura que “todas as situações de fragilidade social foram devidamente encaminhadas para a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa”.
A Câmara de Lisboa procedeu à desocupação de 11 casas municipais do bairro Alfredo Bensaúde, na freguesia dos Olivais, que estavam ilegalmente ocupadas. No entanto, pelo menos nove famílias queixam-se de terem sido despejadas, sem terem sido previamente notificadas e acusam a autarquia de não lhes ter dado qualquer alternativa de alojamento, nem permanente nem temporário.
As desocupações, que decorreram numa operação conjunta que envolveu forças de segurança e a Gebalis (que gere o bairro), iniciaram-se ainda na semana passada e empurraram para a rua cerca de 70 pessoas, onde se incluem crianças e bebés, que estão dormir em carrinhas, tendas ou nos patamares dos prédios do bairro. Fonte oficial do Comando Metropolitano (Cometlis) da PSP confirmou terem existido duas operações de desocupação de imóveis, promovida pela Gebalis com a colaboração da Polícia Municipal de Lisboa, na qual a “PSP interveio no estrito objectivo da manutenção da ordem pública durante a operação, a qual decorreu dentro da normalidade, sem incidentes ou detenções a registar”.
Ao PÚBLICO, a câmara de Lisboa refuta as críticas enunciadas pelos moradores e insiste que as desocupações só foram executadas “depois de cumpridos todos contactos, notificações e demais tramitações legalmente definidas”, assim como “acompanhamentos em termos sociais”. A autarquia nota ainda que “todas as casas desocupadas estavam afectas a outras famílias, que estavam legitimamente à espera de resposta habitacional em função de candidatura feita e verificada” ao abrigo do Regulamento Municipal de Habitação.
A grande maioria das famílias diz ter ocupado aquelas casas, que estariam vazias há vários anos, por falta de alternativa habitacional. “Tenho uma bebé de dez meses e outra com cinco anos. A mais nova está com bronquiolite, com máquina a vapor. Estamos a viver no patamar do prédio”, conta Dulce Maia, 21 anos, que vivia com o marido naquela casa há três anos.
“Estamos a falar de muitas famílias, que estão na rua neste momento a pernoitar em carros ou debaixo de lona junto ao bairro. Não houve qualquer detenção ou violência policial, mas houve a violência dos despejos sem quaisquer alternativas e sem qualquer análise social das situações”, observa Rita Silva, da associação Habita, que está a acompanhar a situação.
O município diz ainda que “todas as famílias que ocupavam ilegalmente estas casas têm alternativa habitacional no mesmo bairro, em outros alojamentos onde viviam anteriormente” e que “todas as situações de fragilidade social foram devidamente encaminhadas para a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa”. Nota ainda que só recorre às desocupações “quando se esgotam as possibilidades de diálogo com as pessoas para uma resolução de comum acordo e encaminhamento para resposta social adequada” e que “até agora nenhuma ficou sem alternativa”.
A autarquia esclarece ainda que algumas das casas desocupadas estavam envolvidas em providências cautelares, interpostas por moradores para travar despejos, que já foram “sentenciadas pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa com indeferimento, sendo todas as acções administrativas contra a decisão municipal consideradas improcedentes”.
Algumas das famílias ouvidas pelo PÚBLICO disseram que estão há vários anos a tentar legalizar a sua situação junto da Câmara de Lisboa, e que estão também inscritas em programas de apoio à habitação. Temem agora que as casas desocupadas sejam novamente fechadas a assim permaneçam por mais “mais dez ou 15 anos” — quando poderiam estar a ser habitadas. A câmara refuta contudo esta visão, admitindo que as “obras para a recuperação destes fogos, para serem entregues em condições de habitabilidade, começaram imediatamente”.
O que as famílias pedem agora é que a câmara volte atrás na decisão e possa iniciar a legalização das suas casas, para que possam pagar uma renda. O regulamento das desocupações municipais prevê que, em alguns casos, a situação das famílias com casas ocupadas possa ser regularizada, mediante o “pagamento de um valor pecuniário por cada ano de ocupação, sem o qual a ocupação não será regularizada”. Ainda na tarde desta quinta-feira, um grupo de moradores, com a associação Habita, esteve nos Paços do Concelho a tentar obter mais esclarecimentos junto da autarquia, mas sem sucesso.
Notícia actualizada às 15h28: Acrescenta resposta do Cometlis