Trazidas pelo clima, seca e moscas destroem laranjas no Algarve

A laranja pequena pode ser “sexy” e saborosa, mas não entra nos mercados das grandes superfícies de distribuição. No negócio dos citrinos, dizem os produtores, só os grandes têm lugar.

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Andreia Patriarca

Os pomares de citrinos do algarve estão a ser atacados pela mosca do Mediterrâneo, - uma praga conhecida em Portugal desde XIX,  e que este ano está especialmente activa,  a picar a fruta. As alterações climáticas, admitem os técnicos, estarão a criar condições para que a espécie se multiplique de forma descontrolada. A falta de chuva, e as temperaturas anormais para época, criam o ambiente propício à criação de novas gerações, reproduzindo-se cinco a oito vezes por ano.

O combate químico a este tipo insecto está revelar-se cada vez menos eficaz. Em alternativa (ou em complemento aos produtos fitofarmacêuticos), existe também a luta biológica, através da instalação de armadilhas de captura (atracção e morte da mosca) - e ainda uma forma engenhosa de controlo da natalidade: em bio-fábricas são produzidos machos estéreis, que têm capacidade para seduzir as fêmeas mas não fecundam.

Durante este fim-de-semana, Silves apresenta-se como a “capital da laranja”, dando a conhecer os melhores variedades de citrinos da região. Neste encontro, aberto ao público em geral, haverá ainda lugar a debates onde se fala das dificuldades que este sector atravessa – incluindo as doenças e a seca no topo das preocupações. “A mosca do Mediterrâneo (Ceratitis capitana) reproduz-se sem fim à vista.”, diz o director regional de agricultura e pescas do Algarve, Pedro Monteiro, acrescentando que já apresentou à tutela um programa de “controlo e de combate” a este insecto, elaborado em colaboração com a direcção-geral de alimentação e veterinária (DGAV).

Por seu lado, o presidente da Cooperativa de Citrinos do Algarve (Cacial),  José Oliveira, enfatiza: “Os produtos fitofarmacêuticos estão a revelar-se cada vez menos eficazes ”. No próximo dia 20, de novo, este assunto estará em debate, num seminário a realizar na Direcção Regional de Agricultura e Pescas (DRAP), com a participação de técnicos, produtores e investigadores do Algarve e da Andaluzia. Nesta matéria, diz o chefe de divisão de sanidade da DRAP, Celestino Soares, “os espanhóis têm uma larga experiência”, quer no uso das biotécnicas, como na utilização dos fitofarmacêuticos. Em Portugal, acrescenta, a ilha da Madeira- outra das regiões que está rota da Ceratitis capitana- abriu um biofábrica de produção de machos estéreis, em 1995 que, entretanto, encerrou.

Pequenina e sexy

A feira dos citrinos, em Silves, funciona como uma montra desta fruta, emblemática da região. “Vamos também dar a conhecer a laranja feia”, diz José Oliveira, procurando desfazer alguns preconceitos relacionados com o visual da laranja. As manchas epidérmicas que a fruta possa apresentar, diz, não passam de uma questão estética. “Pode não ser tão bonita por fora, mas é tão doce e gostosa como as de maior calibre”, enfatiza. Pedro Monteiro acrescenta: “As manchinhas são como pequenas sardas na pele”. José Oliveira, também dirigente da AlgarOrange – uma associação, formada há pouco mais de um ano, e que reúne os nove maiores produtores da região - destaca um outro problema, o calibre da fruta: “a laranja pequena, por imposição das normas comunitárias, não entra no mercado”. Por conseguinte, o preço desses citrinos “cai para valores mínimos, por só ter aproveitamento na indústria”.

Tamanhos e visual à parte, Pedro Monteiro remata: “A laranja do Algarve é sexy, seja pequenina ou grande”. Embora a mosca do Mediterrâneo esteja a prejudicar a produção de citrinos, José Oliveira lembra que a laranja do Algarve continua a ser uma marca de referência nos mercados internacionais, sobretudo no norte da Europa: “Não conseguimos conseguir competir pela quantidade, mas marcamos pontos na qualidade”, enfatiza. O que faz a diferença com o produto espanhol, diz, é o “equilíbrio entre a acidez e o doce, devido à particularidade do clima da região”. Por outro lado, diz, “começa a existir um consumidor, com preocupações ecológicas, que não olha para a fruta só pelo aspecto que apresenta”. Para lá do brilho que reflecte nas vitrinas dos supermercados, prossegue, “está o percurso [pegada carbónica] que a fruta fez para chegar até à mesa do consumidor”.

Segundo a DRAP, o Algarve produz em 16 mil hectares cerca de 350 mil toneladas de citrinos, sendo à volta de 25 por cento vendida para exportação.  Do outro lado da fronteira, na região de Andaluzia, só a província de Huelva soma 11 mil hectares de citrinos em plantio extensivo. No mercado global, conclui José Oliveira, “somos pouco mais do que um gota no oceano”. Embora a Espanha seja um dos grandes produtores, diz, tem como concorrentes a África do Sul, Egipto e Marrocos, entre outros.

Em 2018, refere, a União Europeia importou mais de um milhão de toneladas de laranja. “Este é um negócio de cêntimos, onde os pequenos produtores estão condenados a desaparecer”. Um quilo de laranjas, actualmente, é pago ao produtor por um preço que varia entre os 20 e os 27 cêntimos, dependendo da variedade. Mas só a apanha custa seis cêntimos/quilo. Por isso, não é de estranhar ver os pomares tradicionais com o chão coberto de fruta a apodrecer.

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