Bloco de Esquerda lembra referendo ao aborto e diz que a realidade desmente “os arautos do apocalipse”
Esta terça-feira assinalaram-se 13 anos desde que o “sim” venceu o referendo à despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
Em dia de debate público sobre a existência — ou não — de um referendo sobre a eutanásia, o Bloco de Esquerda quis recordar à Assembleia da República as conquistas para a saúde da mulher que, em seu entender, a despenalização da interrupção voluntária da gravidez representou. A bloquista Sandra Cunha assinalou os 13 anos completados esta terça-feira desde que o “sim” venceu com 59% dos votos, declarando que foi a partir desse dia que se acabaram “os tempos obscuros da perseguição social e judicial às mulheres”.
A deputada bloquista criticou as “crenças conservadoras completamente desfasadas da realidade da vida de tantas mulheres”, numa declaração que teve a solidariedade das bancadas do PS e PCP. Para trás, disse, ficaram os “interrogatórios e exames ginecológicos forçados, os processos criminais, as condenações, por não se aceitar o direito à autodeterminação da mulher” e os abortos clandestinos “realizados em clínicas de vão de escada”.
“Ao contrário dos que vaticinavam o desastre, de que seriam filas sem fim de mulheres à espera de abortar ou que as mulheres deixariam de ter filhos e que o aborto seria transformado num método contraceptivo, como se as mulheres fossem desprovidas de razão e consciência, a lei foi um sucesso”, avaliou.
Depois, virou-se para os centristas e deixou até um recado ao Presidente da República, que “acenava com o espectro da liberalização total”, acusando Marcelo Rebelo de Sousa de preferir “a hipocrisia do ‘é proibido, mas pode-se fazer’”.
O Bloco assinalou que entre 2011 e 2018, as interrupções voluntárias de gravidez decresceram 24,2% e as realizadas apenas por opção da mulher até às dez semanas diminuíram 27,1% e sublinhou que Portugal está abaixo da média europeia desde 2015. “Ao contrário do que anunciavam os arautos do apocalipse, não só nada piorou como o que temos hoje é mais informação, mais acompanhamento, mais saúde e mais segurança”, disse.
Sandra Cunha recordou também que, até 2008, o aborto clandestino era a terceira causa de morte das mulheres em Portugal e que, desde 2012, não houve mais nenhuma vítima identificada.
No entanto, avisa que o trabalho não está todo feito e que o caminho deve ser feito no sentido de garantir que o Serviço Nacional de Saúde tem as condições necessárias. E alertou para as carências em algumas unidades de saúde, como o hospital de Santarém, hospital Garcia de Orta (Almada) e o hospital de Beja.
Sandra Cunha afirmou que “a propaganda conservadora perdeu no passado e perderá no presente”, uma vez que a matéria continua a ser alvo de “ataques e tentativas de retrocessos”,
Em 2015, o PSD e o CDS tornaram obrigatório o aconselhamento psicológico e social antes do aborto e a existência de uma consulta de planeamento familiar depois da interrupção. Mas a justificação dada à data pela direita não convenceu a esquerda, que considerou que as medidas aprovadas tinham como objectivo arrastar o processo até ao ponto em que fosse ultrapassado o prazo legal para se realizar o aborto.