Desafios e oportunidades não mudam por causa do “Brexit”, dizem líderes da UE

A poucas horas da saída do Reino Unido da União Europeia, os dirigentes das instituições esforçaram-se por mostrar a sua unidade e compromisso com o projecto europeu. Mas acabaram por reconhecer que será um dia triste. “É uma ferida para todos nós.”

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Michel, Sassoli e Von der Leyen hoje em Bruxelas Reuters

Os presidentes das três instituições europeias, Comissão, Conselho e Parlamento, compareceram juntos, esta sexta-feira de manhã, para sublinhar a importância e o valor da sua União a 27 e perspectivar a sua resposta aos desafios futuros já sem a participação do Reino Unido, um dos maiores e mais poderosos membros que deixará de pertencer ao clube ao bater da meia-noite.

“Os nossos desafios e as nossas oportunidades não mudaram por causa do ‘Brexit’”, vincou a líder do executivo comunitário, Ursula von der Leyen, que fez questão de os apontar um a um, destacando dois: a digitalização, porque “a soberania tecnológica é consistente com um mercado aberto”, e o novo Pacto Ecológico Europeu, que não só é “a nossa nova estratégia de crescimento” mas também “o nosso projecto mobilizador, que tornará a União Europeia numa líder e autoridade mundial”.

A mesma mensagem foi repetida pelo presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel. “A história não acaba aqui. A União Europeia continua a ter a sua agenda política. Este projecto continua a acrescentar valor todos os dias. Estamos convencidos que este momento é também uma oportunidade para reforçar o nosso mercado único, não para ter a primazia, mas para demonstrar que é possível mudar o nosso modelo de desenvolvimento, tornando-o mais sustentável e diminuindo as desigualdades”, afirmou.

Os três líderes vieram com o refrão afinado e a lição bem estudada para responder às incertezas do “Brexit”, numa declaração conjunta feita, entre bandeiras e mapas da UE, num salão do “Parlamentarium”, o museu do Parlamento. Oportunidades, desafios, digitalização, alterações climáticas, crescimento económico, migrações, parcerias, alargamento foram as palavras que mais repetiram, quase sempre acompanhadas de outras, que os bons entendedores saberão interpretar: unidade, mobilização, solidariedade, confiança…

No capitulo dos desafios está a negociação da parceria futura com o Reino Unido durante os próximos onze meses de transição, em que o país já estará fora da União e de todas as suas instituições mas ainda dentro do mercado comum e da união aduaneira. “Queremos que a nossa relação futura seja o mais próxima possível, mas sejamos muito claros. Por melhor que seja, a nossa relação nunca será tão boa como a participação na União. Pertencer à UE conta: é muito diferente ser um membro e não ser”, vincou Ursula von der Leyen.

Antecipando as dificuldades das negociações com Londres, que já manifestou a sua intenção de se afastar totalmente do quadro regulatório europeu, a líder do executivo prometeu ser inflexível na defesa dos interesses do bloco. “Só quem cumpre as regras do mercado único pode estar no mercado único”, avisou. “Quanto mais o Reino Unido divergir dos standards europeus, menos acesso terá ao mercado europeu”, completou Charles Michel.

Mas apesar de já se estarem a traçar as linhas vermelhas — esta segunda-feira, o negociador da UE, Michel Barnier, apresentará as orientações políticas para a negociação — o processo só arranca em Março. No ar, esta sexta-feira, pairava ainda a incredulidade ou a descrença pela saída iminente do Reino Unido da UE, e a tristeza ou o desapontamento pelo caminho escolhido pelos britânicos. “O dia de hoje é uma ferida para todos nós”, lamentou o presidente do Parlamento Europeu. “Fizemos tudo o possível para fazer compreender aos cidadãos britânicos o valor da sua presença e a importância de estarmos juntos”, acrescentou.

De mote próprio ou instados pelos jornalistas, de forma mais contida ou mais emocionada, os três dirigentes europeus lá acabaram por revelar os seus sentimentos a poucas horas do “Brexit”. “Nunca é um momento feliz quando alguém se vai embora. Os meus sentimentos são contraditórios. Mas o que domina é a consciência da importância de proteger os valores do projecto europeu neste momento em que abrimos um novo capítulo”, confessou Charles Michel. 

Ursula von der Leyen recorreu a uma frase que encontrou na véspera, num retiro que os três presidentes realizaram na casa de Jean Monnet, nos arredores de Paris, para dar conta do seu estado de espírito. “Não estou pessimista nem optimista, estou determinada”, declarou, recordando o momento em que o Reino Unido entrou na então Comunidade Económica Europeia. “Eu andava na escola e no clube havia seis membros. Amanhã seremos 27. Ganhámos ímpeto económico e tornámo-nos uma poderosa casa política. A experiência mostrou-nos que a força não vem do isolamento mas da união”, disse.

Numa reflexão que até arrancou um aplauso envergonhado da plateia composta maioritariamente por jornalistas, David Sassoli respondeu à pergunta com uma interrogação pessoal — ou melhor, uma série delas. “Por que há tanto interesse e tanto empenho em dividir-nos? O que procuram estas forças que querem fragilizar a UE? Qual a sua motivação?”, questionou-se, avançando uma explicação. “Porque nós europeus construímos o mais importante espaço económico do mundo, com regras para podermos viver melhor e proteger os mais fracos”, referiu. “Há forças que parece que têm medo de viver num mundo com regras, mas nós europeus saberemos mostrar como elas são importantes”, concluiu.

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