Porto recorre aos “apanhados” para mexer com a forma como se lida com o lixo
Campanha O Porto é a Nossa Casa tenta mudar comportamentos dos cidadãos portuenses em relação aos resíduos urbanos.
Se um contentor de “lixo”, algures no Porto, o abordar de viva voz, antes de se espantar com o caixote-falante o melhor é pensar no que terá feito de errado. A empresa municipal Porto Ambiente quer mexer com o comportamento dos cidadãos, em relação aos resíduos, e contratou uma equipa de actores para pregar uns sustos a transeuntes mais distraídos ou menos empenhados na separação dos desperdícios, ao jeito dos programas de apanhados da TV.
Décadas depois de um chimpazé ter aparecido na televisão a separar correctamente o “lixo”, demasiados portugueses ainda são apanhados em falso a fazer uma errada gestão dos resíduos que produzem – como o demonstra o aumento incipiente da reciclagem, a nível nacional. No Porto, cidade integrada no sistema intermunicipal Lipor, os resultados até têm sido, nos anos mais recentes, mais positivos do que a média nacional, mas ainda assim a empresa municipal decidiu avançar com a campanha “O Porto é a Nossa Casa”, numa tentativa de puxar o lustro à auto-estima pela via da correcção de comportamentos.
Mupis com o alerta “Não deite Dinheiro ao Lixo: evite as multas, resíduos dentro do contentor”, são o primeiro sinal, tentativa de induzir “um sentimento de culpa”, desse desafio aos portuenses. Mas o lado mais activo desta campanha é mesmo a interpelação directa a transeuntes apanhados a deixar sacos de lixo na rua ou a pôr recicláveis num contentor de indiferenciados, por exemplo. Como se de um grilo falante se tratasse, a intervenção do contentor – que redunda, a seguir, numa abordagem pessoal, a ser filmada – “é, apesar de tudo, descontraída, pois o objectivo não é punir e sim formar pela positiva”, garante a autarquia, no seu site.
A campanha O Porto é a Nossa Casa já esteve no Largo dos Lóios, na Rua das Flores e na Praça de D. Filipa de Lencastre. E segundo o município está previsto surpreender quem se abeire de outros locais, não divulgados, para não estragar parte do efeito surpresa. Quem se cruzar com as notícias sobre a iniciativa talvez escape ao susto de um caixote que fala, mas pode dar como certo que algo de errado terá feito.
Com uma mensagem próxima da agora seguida pela Câmara do Porto, a própria Lipor tem há meses na rua uma campanha com mensagens que procura associar a má gestão de resíduos por parte dos cidadãos a problemas pessoais, que, mais do que um prejuízo para o ambiente, afectam a nossa relação com os outros. A campanha, com o título genérico Recicla-te, apresenta os comportamentos “errados” como se de uma doença se tratasse. Uma doença para a qual há cura, neste caso.
Portugal está longe de cumprir as metas de produção e reciclagem de resíduos a que está vinculado, mas o Porto, como outros municípios da Lipor que se atiraram, no ano passado, a aumentar a separação e a recolha porta-a-porta de resíduos, incluindo os orgânicos, começa a ver os resultados dessa política de investimentos que diminui, drasticamente, as quantidades daquilo a que vulgarmente chamamos lixo indiferenciado. A cidade do Porto conseguiu ultrapassar ainda em 2019 os objectivos a que se havia proposto para 2020 no que diz respeito à taxa de preparação de resíduos para reciclagem, seguindo, neste campo, o exemplo da Maia, um campeão nacional.
Depois de ter iniciado, também, a recolha selectiva de orgânicos, a Maia fechou 2019 com o valor mais elevado de sempre na recolha selectiva de resíduos urbanos, batendo recordes que já eram seus. A Maiambiente enviou, para reciclagem e compostagem, 22.100 toneladas de resíduos com potencial de valorização. Um excelente resultado ao qual se soma o índice de “Retomas de Recolha Selectiva” a atingir os 72,8 kg/habitante, valor que supera os 67,20 kg/habitante, atingidos em 2018. Neste concelho, também associado da Lipor, a “Taxa de Preparação para Reutilização e Reciclagem” atingiu os 47,33%, superando, também, os valores de 2018, 45,75%, e as metas do próprio Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos, o designado PERSU 2020, que apontava para uma taxa mínima de 38% neste ano.