As greves climáticas estudantis, que têm acontecido um pouco por todo mundo, já o indicavam, mas chegou agora a validação: as alterações climáticas são mesmo a questão fundamental deste tempo para a Geração Z, que sucede aos millennials. É esta a conclusão de um estudo da Amnistia internacional, intitulado O Futuro da Humanidade, que inquiriu mais de dez mil pessoas, dos 18 aos 25 anos, em 22 países (Portugal não foi contemplado). A divulgação do documento coincide com o Dia Internacional dos Direitos Humanos, que se celebra esta terça-feira, 10 de Dezembro, numa altura onde os líderes mundiais se reúnem em Madrid para debater as alterações climáticas na COP 25.
“Para os jovens, a crise climática é um dos principais desafios desta era. Este é um sinal de alerta para os líderes mundiais, que têm de tomar medidas muito mais decisivas para enfrentar a emergência climática ou correm o risco de trair ainda mais as gerações mais jovens.” As palavras são do secretário-geral da Aministia Internacional, Kumi Naidoo, no comunicado que acompanha o estudo.
Os inquiridos foram convidados a escolher cinco temas de uma lista de 23. No final, 41% dos entrevistados apontou as alterações climáticas como a questão mais importante que o mundo atravessa. Em segundo e terceiro lugar estão, respectivamente, a poluição, com 36%, e o terrorismo, 31%. Sobre as questões ambientais em específico, o aquecimento global foi votado como a mais importante (57%), numa lista que incluía a poluição marinha e a do ar, bem como a desflorestação.
Além de questões globais, os jovens foram chamados a pronunciar-se sobre temas nacionais. Apesar da diversidade dos países de origem dos inquiridos (Índia, Alemanha, Nigéria, Brasil, Coreia do Sul, Taiwan, Espanha, só para citar alguns), os temas principais, aparentemente nacionais, repetem-se. Independentemente dos países, o estudo revela que os jovens se sentem a “viver num sistema falhado”.
“A mensagem dos jovens é clara (…) A crise climática, a poluição, a corrupção e os baixos padrões de vida são uma janela para uma verdade alarmante sobre como os poderosos exploraram o seu poder para obter ganhos egoístas e, geralmente, de curto prazo”, explica Kumi Naidoo.
Nas questões nacionais, a corrupção foi, então, a mais visada (36%), seguida da instabilidade económica e da poluição (ambas 26%), a desigualdade económica entre ricos e pobres (25%), as alterações climáticas (22%) e a violência contra as mulheres (21%).
Algumas destas conclusões vão ao encontro de protestos que ocorrem em todo o mundo, como na Argélia, no Chile, em Hong Kong, no Irão, no Líbano ou no Sudão. O estudo relembra que estes movimentos foram, “em grande parte, liderados por jovens e estudantes”, que se revoltaram contra a “corrupção, a desigualdade e o abuso de poder” e sofreram (e sofrem) uma “repressão violenta” por isso.
“Se os eventos de 2019 nos ensinam alguma coisa é que as gerações mais jovens merecem um lugar à mesa quando se trata de decisões sobre elas”, alerta Naidoo. Se tal não acontecer, continua, as “crises que o mundo testemunha só podem piorar”.
Apesar de se sentirem inseridos num sistema falhado, os jovens não rejeitam a democracia e o papel do Estado e dos governos. Pelo menos é o que leva crer outros resultados do estudo, onde se conclui que a maioria dos jovens acredita que votar e participar em greves e protestos é um “método eficaz” para “iniciar a mudança” nas questões dos direitos humanos. Os inquiridos defendem, ainda, que a garantia dos direitos humanos deve ser assegurada pelos governos (71%) — e não pelos indivíduos (15%), empresas (6%) ou instituições de caridade (4%).
A maioria dos entrevistados concordou que a protecção dos direitos humanos é essencial para o futuro dos respectivos países (73% contra 11%), os governos devem privilegiar o bem-estar dos cidadãos face ao crescimento económico (63% contra 11%), e os direitos humanos devem ser assegurados, mesmo que isso comporte consequências negativas para a economia (60% contra 15%).
Apesar das críticas ao sistema político contemporâneo, os jovens inquiridos “estão dispostos a ouvir” os líderes políticos.
Para Naidoo, contudo, o estudo mostra que esta abertura não basta: são precisas mudanças a sério. “Se os líderes do mundo estiverem dispostos a ouvir atentamente, eles perceberão que a Geração Z não está a pedir pequenos ajustes. Os jovens estão a procurar mudanças fundamentais na maneira como o mundo funciona. Se os líderes não levarem isso a sério, correm o risco de trair uma geração”, disse, pedindo aos governos que iniciem a nova década com “acções significativas” para “enfrentar as alterações climáticas, reduzir a desigualdades e implementar reformas genuínas para acabar com abusos de poder.”