Luigi’s Mansion 3 é a transformação do medo em deleite
A Next Level Games colige num videojogo cenários pejados de detalhes e carisma que são relojoaria para o jogador explorador.
Luigi’s Mansion sempre manteve uma conversa honesta com o jogador. Série embutida na história da Nintendo na Europa desde 2002, propõe um protagonista com medo de quase tudo e de todos, investindo contra fantasmas e fenómenos, assegurando que não está para aterrorizar quem joga. Está, isso sim, para ser uma aventura marcada pela colaboração entre design, humor, e mecânicas recompensadoras.
Desenvolvido pela Next Level Games em exclusivo para a Nintendo Switch, Luigi’s Mansion 3 não trai esses princípios, levando desta vez os jogadores até ao hotel The Last Resort. Luigi, Mario, Toads e a Princesa Peach foram convidados para umas férias no local, que se estende verticalmente, comportando quinze pisos que desafiam a arquitectura, a gravidade, e o convencional. O convite, como era de esperar, não precisa de muito para transformar as férias num pesadelo.
Hellen Gravely, a dona do hotel, conta com a ajuda do King Boo para aprisionar todas as personagens em quadros. Luigi escapa a este trágico desfecho e tem agora que explorar as diferentes áreas do The Last Resort, tentando encontrar e libertar os seus amigos. Contudo, o solarengo e colorido hotel transformou-se num local assombrado, onde aparições visuais e sonoras fazem Luigi tremer de medo; onde cada piso tem a sua própria temática, o que permite à produtora demonstrar músculo criativo.
Contudo, Luigi não pode explorar o hotel a seu bel-prazer. Para controlar o ritmo da aventura, os botões do elevador têm que ser primeiro recuperados, o que implica diversos confrontos contra bosses. O irmão de Mario conta, novamente, com a preciosa ajuda do excêntrico Professor E. Gadd, que preparou várias ferramentas que o auxiliarão na sua cruzada contra os abundantes espectros e influenciarão a jogabilidade do exclusivo Switch.
Luigi transporta consigo o Poltergust G-00, um peculiar aspirador que pode sugar os fantasmas. Em Luigi’s Mansion 3, contudo, essa fulcral ferramenta conta com uma nova funcionalidade, o Suction Shot. O protagonista pode disparar um desentupidor que se cola a determinadas superfícies dos cenários. Posteriormente, pode aspirar a corda anexada ao desentupidor e puxar diversos itens. Sem qualquer surpresa, esta técnica é usada avulso na hora de solucionar vários problemas impostos pela jogabilidade.
Além do Suction Shot e do seu poder de sucção, o Poltergust G-00 pode também emitir luz negra que revela partes dos cenários que não são perceptíveis a olho nu, assim com um flash de luz conhecido como Strobulb – essencial para encandear temporariamente os fantasmas e também para activar determinados interruptores. Mais: o hardware que transportam às costas pode também expelir uma lufada de ar para repelir os inimigos.
Descrita pelo próprio como “a mais recente invenção da mente brilhante do Professor E. Gadd”, graças a um viscoso material verde inserido na Poltergust G-00, a jogabilidade assenta também em Gooigi. Com um corpo maleável, o clone verde de Luigi consegue-se esgueirar por entre barras de metal ou passar pelas grades de saneamento, por exemplo. Pressionando um botão, Luigi mantêm-se em cena, mas conta com a preciosa ajuda da sua duplicação. Isto é crucial para resolver alguns puzzles e combater alguns bosses, pois quando trocam de personagem, a que abandonam temporariamente continua a realizar a acção que activaram. Por exemplo, podem deixar Luigi a aspirar enquanto controlam Gooigi, que pode também reforçar o poder da aspiração com a sua versão do Poltergust.
Há determinados puzzles que obrigam uma cooperação entre os dois. Por exemplo, podem colocar o Luigi num elevador e trocar para o Gooigi que faz esse elevador subir. O corpo de Gooigi é feito de um material chamado Goo que reage à frequência emitida pelos Boos. Quanto mais próximo estiverem destas icónicas presenças, maior será a vibração sentida. De forma inteligente, Luigi’s Mansion 3 usa a presença de Gooigi para celebrar o multijogador local, com cada jogador a controlar a respectiva personagem. Infelizmente, o clone verde dissolve-se quando entra em contacto, por exemplo, com líquidos – impedimento que atiça o pensamento lógico do jogador e condiciona o raio de acção do companheiro.
A execução de todos estes processos resulta porque recompensa quase todas as acções do jogador. Os encontros com os fantasmas, por exemplo, permitem um estudo dos seus pontos fracos misturando as mecânicas e da acção contra a corrente: quando os fantasmas estão a ser sugados, há uma resistência que é contrariada pelo jogador movendo o aspirador na direcção oposta antes de os fazer embater no cenário. Os únicos problemas estão na falta de praticabilidade que alguns movimentos apresentam quando têm que ser executados sequencialmente de forma astuta e com uma câmara que em trechos onde é fixa não permite a melhor perspectiva da área de jogo.
Cada secção e cada confronto com um boss faz o jogador sentir que está a progredir lascando camadas à situação. Luigi’s Mansion 3 não espera pelo final para fazer sentir que chegamos a algum lado, pois cada botão do elevador recuperado ou cada amigo resgatado é uma vitória que contribui para a grande conclusão. Há coleccionáveis para recolher e dinheiro escondido em diversos objectos. Ou seja, urge passar em revista cada canto do hotel, mesmo quando se sabe qual é o caminho a seguir. O dinheiro pode posteriormente ser usado para comprar itens, como ossos dourados que fazem o Polterpup, o fantasma de um divertido cão aliado, ressuscitar Luigi se o seu contador de corações se esgotar. De notar que tal raramente é necessário, pois a obra não é particularmente exigente, constatação que pode também ser estendida à dificuldade dos puzzles.
Esta recompensa é também notória no design dos níveis e das personagens. Isto faz com que a chegada a um piso novo seja uma descarga de adrenalina motivada pela curiosidade. A Next Level Games tomou algumas liberdades criativas para colocar o Egipto Ancestral ou um combate contra o esqueleto de um dinossauro dentro de um - convém não esquecer - hotel. Contudo, são níveis e confrontos que facilmente ficam na memória. Pode-se alegar que não há uma coordenação unificadora entre pisos, todavia, esta diversidade de temas acaba por derradeiramente ser benéfica para o sentido de aventura.
No momento em que estamos a explorar o tema medieval de um castelo, a medir forças contra um compositor que se transformou num piano ou contra o Kaiju Ghost, uma homenagem a filmes como Godzilla, depois de o realizador Morty nos ter transformado em actores na sua nova película, as emoções são dominadas pela diversão e pela conquista, não pelo questionar a lógica de como isto é possível. Luigi’s Mansion é sobre o escape. Sair do elevador para encontrar um piso dominador pela flora é uma via rápida para o queixo caído e para uma estranha sensação reconfortante encontrada na atenção aos detalhes.
O grafismo e a sonoplastia são o triunfo da minúcia. Cada canto é um pormenor, cada suspiro ou desabafo de Luigi é o seu medo em destaque. A equipa de produção demorou-se em cada piso, em cada traço e efeito que dão uma identidade única ao jogo. Daí a antecipação quando se chega a cada um dos quinze pisos; daí o prazer de nos demorarmos também. É irónico que uma obra que aterroriza o protagonista seja um produto com uma sensação de bem-estar tão proeminente.
É inquestionável que o destaque é a campanha principal, mas Luigi’s Mansion 3 apresenta também dois modos multijogador. Em ScareScraper fazemos parte de uma equipa que pode albergar até oito jogadores. Localmente ou online, há que trabalhar em conjunto para realizar o objectivo proposto, seja derrotar fantasmas ou amealhar dinheiro ou Toads, por exemplo. ScreamPark é composto por três mini-jogos, onde duas equipas competem entre si enquanto tentam amealhar pontos destruindo alvos, derrotando fantasmas, ou amealhando moedas.
Luigi’s Mansion 3 acrescenta algo à série com a sua chegada à Nintendo Switch. Facilmente com mais de uma dezena de horas pela frente, o jogador nunca sente o caminhar em círculos, mas sim o impulso para descobrir o piso seguinte. É uma obra, então, que passeia classe e ambição ciente de que fez bem o trabalho de casa. Confiante, rica em apontamentos e em conteúdo, e com um humor eficaz, a nova aventura de Luigi é um bálsamo de criatividade e carisma.