Paulo Bragança promete um concerto austero, intenso e muito centrado na música

Entre Cativo e o futuro Exílio, o fadista apresenta esta sexta-feira, no Centro Cultural de Belém, uma actuação que promete “objectiva e limpa”. Às 21h, no ciclo Há Fado no Cais.

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Paulo Bragança fotografado para a capa de Cativo LUÍS CARVALHAL

Desde que regressou a Portugal, em 2017, após 11 anos de ausência na Irlanda e uma passagem pela Roménia, Paulo Bragança pisou vários palcos e lançou um EP com duração idêntica à de um LP dos antigos: Cativo, com 38 minutos, lançado em 2018, uma primeira amostra dos temas que preparou e vai gravando. Mas enquanto não surge o prometido novo álbum, que deverá intitular-se Exílio, o músico apresenta-se esta sexta-feira no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, no ciclo Há Fado no Cais, às 21h.

“Será um concerto bastante austero”, diz Paulo Bragança ao PÚBLICO. “As pessoas estão muito habituadas a ir a um concerto e ver muita coisa. E acabam por se desviar do que interessa, que é a música. Muitos até vêem o concerto através de um tablet ou de um telemóvel, e isso não vai acontecer no CCB; que me perdoem, mas não pode ser.”

Com ele, estarão cinco músicos em palco: Luís Coelho na guitarra portuguesa, André M. Santos (dos Melech Mechaya) na guitarra clássica, Tiago Silva na viola de fado, Jorge Carreiro no contrabaixo e Alexandre Tavares na guitarra eléctrica. Além deles, são convidadas as nove integrantes do grupo Adufe & Alguidar. “Vão estar presentes em Caoineadh na dtrí mhuíre, tema gaélico que gravei em Cativo, onde volto à Irlanda e faço a ponte celta: a Irlanda, ela própria, e o adufe, que é um instrumento do Nordeste e do interior português, uma ‘nação’ celta também. É fabuloso ter nove pessoas a tocar adufe, e logo num tema muito religioso, porque é o lamento das três Marias [junto de Cristo crucificado: a mãe de Cristo, a mãe de Tiago e José e Maria Madalena].”

Prós e contras da Internet

O espectáculo, diz, “terá temas de Cativo, outros que estão para chegar e outros que serão uma revisitação do que ficou para trás”, incluindo canções que já não canta “há bastante tempo, como O fado chora-se bem ou Amor e pão quente”. “Passaremos por Coimbra e pela Roménia, país onde só vivi três meses mas pelo qual desenvolvi um grande amor”, detalha ainda Paulo Bragança. Quanto ao formato, insiste: “Vai ser muito intenso mas muito centrado na música, sem distracções. Quero fazer um concerto objectivo e limpo. Não que os outros sejam sujos, mas a Amália correu mundo com três músicos e mais nada. E era fabulosa!”

Esta insistência é consequência da forma como vê o mundo hoje: “Este tempo líquido em que vivemos não é pós-modernismo nem é nada, é tudo muito sem forma. As certezas que havia já não há, nada é o que era e já nem vai ser. Sou de uma geração que ainda foi educada no francês e não no inglês, em que não havia mundo digital e era tudo analógico (ainda fiz exame da quarta classe!), e isso faz-me pensar se ainda vale a pena fazer discos ‘normais’, elementos corriqueiros que se podem devassar. Não sei se não seria preferível fazê-los como obras de pintura, únicos para cada pessoa que os comprasse. É que me perturba muito a actual devassidão da música, e não só; porque se a Internet nos deu muito, também nos tirou muito. Parafraseando Umberto Eco, estamos na democratização da imbecilidade. As pessoas têm as coisas, mas utilizam-nas de uma maneira completamente errada.”

Um tempo de espera útil

Com quatro discos anteriores à sua saída de Portugal (Notas Sobre a Alma, 1992; Amai, 1994, também editado pela Luaka Bop de David Byrne; O Mistério do Fado, 1996; e Lua Semi-Nua, 2001) e um gravado e lançado já após o seu regresso (Cativo, 2018), Paulo Bragança ainda não está na fase de lançar discos como obra única, embora a ideia o seduza. E o prometido Exílio, diz, já estará “cerca de 70 por cento” pronto. “Até temos vindo a pôr temas, em variadas versões, em palco. Mas é preciso juntar as peças todas, masterizar. A coisa mais difícil que eu tenho na minha vida é fechar um tema. Parece-me bem, mas nunca me parece totalmente bem. Por isso, largo-o e digo: decidam.”

O compasso de espera, porém, terá sido benéfico para o resultado final. “Esta maturação também faz bem”, conclui o músico. “Porque ouvir alguns dos temas já feitos passados uns cinco, seis meses, é muito bom, dá-nos uma outra perspectiva. De alguma forma, este tempo de espera até é útil e acabou por alargar o leque: há mais temas e há o desejo de explorar outros lados ainda, em termos musicais. Porém, quando sair, sairá mesmo como todos os envolvidos (que não só eu) esperavam que saísse.”

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