Em Évora, a falta de alojamento é “um problema grave”
Em Évora, um quarto ronda os 200 euros. O número de alunos na cidade alentejana tem vindo a aumentar, assim como as dificuldades de alojamento, sobretudo de estudantes internacionais. O recurso à reabilitação de edifícios devolutos pode ser uma alternativa.
Neste ano lectivo, há 9395 alunos a estudar na Universidade de Évora (UÉ), mais 1400 do que no período de 2018/2019. Como acontece noutras instituições de ensino superior nacionais, o alojamento dos estudantes é dos problemas mais difíceis de superar. Nos esclarecimentos prestados ao P3, a reitora da UÉ, Ana Costa Freitas, adiantou que para suprir estas necessidades foram disponibilizadas “525 camas em residências universitárias e 25 em residências particulares”. E a Câmara de Évora colocou ao serviço dos estudantes duas moradias no bairro da Malagueira com capacidade para 20 camas.
Apesar disso, a falta de alojamento “não deixa de ser um problema grave”, que se complicou nos últimos dois anos, “com o aumento do fluxo turístico” na cidade de Évora, assinala a docente. A pressão exercida no mercado de arrendamento obriga mesmo a UÉ a “recorrer a hostels e à Pousada da Juventude” para satisfazer as solicitações, dadas as dificuldades que os estudantes encontram na obtenção de um espaço em residências particulares. Com uma renda de 200 euros (o preço médio, apurado pela reitoria, do quarto em alojamento particular), “conseguem-se coisas muito boas ou muito más”, sublinha Ana Costa Freitas.
Mesmo assim, os serviços universitários conseguiram abrir o ano lectivo com 200 camas vagas, quando no anterior apenas ficaram por preencher 40, ao não considerarem prioritário o alojamento de alunos não bolseiros. “Podemos assumir que [neste momento] não temos conhecimento que haja alunos sem alojamento”, garante a reitora da UÉ, admitindo, contudo, que a gestão dos alojamentos “continua a ser uma tarefa muito complicada”. “Nada é fácil neste país”, conclui.
Quando existem na cidade 11 edifícios públicos devolutos que poderiam ser recuperados para alojar estudantes, a reitora não deixa de criticar a inércia dos organismos públicos em relação às preocupações expressas pelos responsáveis universitários. “Estamos a aguardar a possibilidade de afectar três edifícios públicos para os adequar a espaço residencial de estudantes e que no seu todo podem facultar 350 quartos”, frisa Ana Costa Freitas, acrescentando que o objectivo é obter uma capacidade de alojamento “acima das mil camas”.
Ana Rita Silva, presidente da Associação de Estudantes da Universidade de Évora (AEUE), admite que os alunos que procuraram apoio social terão conseguido encontrar alojamento, mas, diz, continua “a receber mensagens a pedir apoio na procura de quartos”. “Não sei com que fundamento se diz que não há alunos sem alojamento”, sublinha a dirigente académica, embora reconheça que as alterações efectuadas ao regime de atribuição de alojamento tenham disponibilizado mais camas.
Mesmo assim, são soluções que não permitem superar a falta de casas para os alunos. A propósito, a AEUE distribuiu aos novos alunos t-shirts com uma frase elucidativa: “Mas afinal onde se dorme aqui?”. Ana Sita Silva critica o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior por ter reforçado o apoio ao alojamento universitário nas regiões do Alentejo e Algarve em apenas 4%, um valor que corresponde a apenas 44 novas camas, quando, pelas suas contas, o número de alunos deslocados na UÉ supera os 50%. Serão, estima, cerca de 5320 alunos, que se procurarem quarto no sector privado se vão deparar com preços entre os 220 e os 250 euros, sem despesas.
Recorde de estudantes internacionais
Há uma razão acrescida para estarem a ser reclamadas mais instalações de acolhimento. A UÉ recebeu, neste ano lectivo, o maior número de sempre de estudantes internacionais. Cerca de 600 alunos, oriundos de 22 países, escolheram a instituição para iniciar ou prosseguir a sua formação académica — 233 estão a frequentar a licenciatura e o mestrado integrado, um aumento na ordem dos 50% em relação ao ano lectivo anterior. Somam-se ainda mais de 150 estudantes no âmbito de programas de mobilidade, como o Erasmus+. Estes dados confirmam uma tendência de crescimento no número de estudantes internacionais nos últimos anos, numa altura em que os resultados da 3.ª fase de candidaturas estão ainda por apurar.
É o caso de Samira Pires, de 18 anos, que deixou Cabo Verde para obter a licenciatura em Biologia na cidade alentejana. “Colegas minhas falaram-me do curso de Évora e eu optei”, explica estudante ao P3, ainda condicionada por alguma timidez. Está satisfeita. “Embora ainda não tenha tido tempo de conhecer a cidade para além do espaço universitário, já dá para perceber que estou num ambiente calmo e a gostar muito do modo das pessoas daqui.”
Na universidade e no seu curso encontrou mais conterrâneos, “o que é uma boa ajuda” para combater a solidão, observa a jovem, que diz ter duas opções para quando finalizar a licenciatura: regressar a Cabo Verde ou ficar por Portugal se conseguir arranjar emprego. “Tenho mais irmãos, mas só eu é que estou a estudar”, diz, intuindo-se o esforço que a família fará para financiar a presença de Samira, em Évora. “Não conseguia arranjar alojamento numa residência particular até que recebi a resposta ao pedido que fiz para ter acesso a alojamento numa residência universitária.” Daí o seu contentamento por ter conseguido um lugar disponibilizado pelos Serviços de Acção Social da Universidade de Évora (SASUE).
Rita Martins, coordenadora do gabinete do alojamento dos alunos, confessa ao P3 que os últimos dias “têm sido muitos desgastantes” na resolução dos problemas que afectam os estudantes. Para além de procurarem camas em residências universitárias, os SASUE “ajudam os estudantes a procurar quarto [em residências particulares] e a encontrar [alternativas] temporariamente em alojamentos locais ou em hostels, previamente protocoladas”.
A opção por um quarto em residência universitária “prende-se sobretudo com os preços praticados e as boas condições dos espaços”, explica Rita Martins. As residências, num total de sete com capacidade de 527 camas, têm cozinhas devidamente equipadas, salas comuns e de estudo, rede wifi, lavandarias com máquinas de lavar e secar. Os preços variam entre os 76,26 euros (quarto partilhado para bolseiros) e os 225 euros (apartamento T0). O alojamento é priorizado tendo em conta a situação socioeconómica dos estudantes, sendo primeiramente alojados os estudantes bolseiros deslocados e candidatos a bolsa de estudo deslocados. Mas as dificuldades, apesar de contornadas, não são superadas. “Acalentamos algumas expectativas que as entidades públicas acolham as nossas propostas com vista ao alojamento de alunos”, acentua a reitora da UÉ.