Governo afasta comparações entre serviços mínimos dos motoristas e greve na Ryanair

Paralisação dos tripulantes começa nesta quarta-feira. Há serviços mínimos em voos de e para os Açores e quatro cidades europeias. Companhia não antevê “perturbações significativas”.

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O turismo e as viagens dos emigrantes são duas das razões dos serviços mínimos Reuters/Francois Lenoir

O ministro do Trabalho, José Vieira da Silva, rejeita haver paralelismos entre os serviços mínimos impostos na greve dos motoristas de transporte de combustíveis e o nível de voos obrigatórios decretados para a paralisação dos tripulantes da Ryanair, que se inicia amanhã e dura até domingo.

A posição do Governo de António Costa surge depois de o sindicato que convocou a greve na companhia irlandesa (21 a 25 de Agosto) considerar a dimensão dos serviços mínimos abusiva e condicionadora do “direito à greve” dos trabalhadores.

Confrontado na noite de segunda-feira numa entrevista na SIC Notícias com a posição do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), o ministro começou por responder: “Talvez fosse [de] perguntar ao sindicato quantos voos essa empresa tem agendados para o dia da greve e em quantos foi identificada a necessidade de serviços mínimos”.

Para os próximos dias, a companhia irlandesa não está a prever “perturbações significativas”, apesar de não descartar a possibilidade de haver atrasos e mudanças de voos, segundo admitiu à Lusa. As ligações que terão de se realizar por determinação do Governo – de e para os Açores e quatro cidades europeias – estão “muito longe dos valores de que estamos a falar durante esta greve [dos motoristas de veículos de transporte de matérias perigosas]”, reagiu Vieira da Silva.

O ministro estava em directo na SIC Notícias e a entrevista já tinha percorrido dois temas principais: as alterações ao Código do Trabalho, promulgadas nesse dia pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, e a paralisação dos motoristas.

Antes de a conversa desembocar na greve dos tripulantes, Vieira da Silva tinha sido confrontado com uma pergunta: vai o país assistir a mais greves com o nível de serviços mínimos que se verificaram na greve que ontem terminou? Sem falar sobre o futuro, algo sobre o qual disse não poder responder, Vieira fez a leitura sobre os últimos dias. “Não é típico que, numa greve, existam serviços mínimos com esta dimensão, mas não é típico que uma greve tenha como objectivo a paralisação do país”, justificou-se, sobre o protesto dos motoristas.

Sem ter presente os números exactos em relação à greve dos próximos dias, Vieira sublinhou, no entanto, o facto de a exigência de apresentação ao trabalho se aplicar a uma “escassa minoria” de ligações e deu como exemplo os voos entre a Região Autónoma dos Açores e Portugal Continental. “Isso acontece genericamente, e os próprios sindicatos avançam normalmente com essas propostas, para não pôr em causa a continuidade do território nacional”.

A Ryanair tem “centenas de voos com os aeroportos nacionais e apenas uma escassa minoria” tem serviços mínimos, “muito longe dos valores de que estamos a falar durante esta greve [dos motoristas]”, sustentou o ministro. E fê-lo procurando assim separar as duas realidades, sem, porém, responder de forma directa à acusação do sindicato de que o Governo de Costa está a “aniquilar o direito à greve dos portugueses e, em particular, dos tripulantes da Ryanair”.

Os argumentos do Governo

No despacho onde decreta as ligações obrigatórias, o secretário de Estado do Emprego, Miguel Cabrita, e o secretário de Estado das Comunicações, Alberto Souto de Miranda, referem que o sindicato declarou que não existe necessidade de apresentação de qualquer proposta de serviços mínimos por considerar que existem outros meios alternativos de transporte nos voos para o estrangeiro e que o conceito de “necessidade impreteríveis apenas se confina” aos Açores e à Madeira por razões de coesão nacional mas não é extensível aos voos para outros países.

O Governo, por sua vez, identificou quatro cidades europeias (Paris, Berlim, Colónia e Londres) para onde (em viagens de ida e volta) haverá voos obrigatórios, por haver aí comunidade de emigrantes portugueses.

No despacho, o Governo apresenta as seis razões: a “duração relativamente longa da greve (cinco dias)”; o facto no Verão haver nesta altura mais procura do transporte aéreo; o facto de ser “importante evitar o aglomerado de passageiros nacionais” neste período, uma vez que “tal pode potenciar riscos para a segurança de pessoas e bens”; o facto de o avião ser “a única forma de garantir o direito à deslocação de uma forma célere e eficiente” para os portugueses residentes nos Açores (para onde voa a Ryanair) e na Madeira; a existência de muitos emigrantes em Inglaterra, França e Alemanha, “para quem Agosto é tipicamente o mês eleito para visitar as suas famílias em Portugal”; e o facto de Portugal ser “cada vez mais um destino de eleição para os turistas europeus”.

A resposta do sindicato

Num comunicado emitido na segunda-feira, antes de Vieira da Silva se pronunciar, o SNPVAC insurge-se contra os fundamentos do executivo, começando por ironizar que “os trabalhadores portugueses ficam a saber que para o Governo português só se podem fazer greves de um ou dois dias”.

Depois, acusa o executivo de Costa de considerar que “o direito de deslocação por meios aéreos nas férias” está acima do “direito à greve constitucionalmente garantido”, e defende que há várias companhias de aviação a voar para a Madeira e Açores e que existem ainda mais alternativas à transportadora irlandesa nos países europeus ligados à comunidade emigrante e mencionados no despacho. Sobre este último aspecto, o sindicato diz mesmo que “a única situação que o Governo tenta acautelar é garantir o lucro à Ryanair”.

Em relação ao argumento da necessidade de garantir a segurança dos aeroportos e, perante a greve, se verificar um aglomerado de passageiros, o sindicato diz caber “à gestão aeroportuária [a ANA, do grupo francês Vinci] aplicar medidas que garantam a segurança e comodidade dos passageiros com voos cancelados”.

As reivindicações

Os tripulantes avançaram para a greve alegando que a empresa não cumpriu o protocolo celebrado com o sindicato em Novembro de 2018, no qual “ficou estabelecida a obrigatoriedade do cumprimento integral da legislação laboral portuguesa até ao dia 1 de Fevereiro de 2019, algo que até ao presente não foi concretizado”.

Uma das reivindicações do SNPVAC tem a ver com a integração nos quadros da Ryanair de todos os tripulantes de cabine com mais de dois anos de serviço através de empresas de trabalho temporário como a Crewlink (“sem perda de retribuição, antiguidade e com as mesmas condições fundamentais de trabalho e emprego dos restantes colegas do quadro”).

A atribuição dos 22 dias de férias, o pagamento dos subsídios de férias e Natal, e ainda o cumprimento integral das regras portuguesas da parentalidade são outras das questões que o sindicato reclama serem implementadas.

Serviços mínimos impostos durante a greve:

 - Um voo diário de ida e volta entre Lisboa e Paris

 - Um voo diário de ida e volta entre Lisboa e Berlim

- Um voo diário de ida e volta entre Porto e Colónia

- Um voo diário de ida e volta entre Lisboa e Londres

 - Um voo diário de ida e volta entre Lisboa e Ponta Delgada

 - Um voo de ida e volta entre Lisboa e a ilha Terceira (Lajes) nos dias 21, 23 e 25 de Agosto.

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