Corbyn diz que vai fazer tudo para evitar o no deal, menos abdicar de ser primeiro-ministro

Líder trabalhista apresentará moção de censura ao governo por este planear um “Brexit” sem acordo. Se o governo cair, será preciso um executivo de transição até eleições, mas Corbyn não parece pôr a hipótese de não o chefiar.

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Jeremy Corbyn discursou em Corby HENRY NICHOLLS/Reuters

Jeremy Corbyn, o líder trabalhista britânico, prometeu esta segunda-feira “apresentar uma moção de censura ao Governo, tentar formar um executivo de transição para impedir a saída da União Europeia sem acordo, e marcar imediatamente eleições antecipadas para que as pessoas possam decidir o futuro do país”.

Pouco depois o primeiro-ministro, Boris Johnson, disse que a União Europeia terá de ceder para haver uma saída com acordo – embora Bruxelas já tenha dito vezes sem conta que o acordo que está em cima da mesa é o que foi assinado pela ex-primeira-ministra Theresa May e que a Câmara dos Comuns rejeitou três vezes. Johnson vai estar em Berlim e Paris esta semana para se reunir com Angela Merkel e Emmanuel Macron e discutir o “Brexit”.

O líder do Labour fez antes um discurso em Corby (East Midlands), prometendo que faria tudo para impedir que o Reino Unido saia sem acordo da União Europeia – mas a uma pergunta de um jornalista sobre se isso implicaria abdicar da chefia de um governo de transição, Corbyn foi evasivo: disse que todos os precedentes apontam para que seja o líder da oposição a assumir esse cargo, e que se seguirá uma eleição geral. E repetiu que se os deputados “forem sinceros na intenção de impedir uma saída sem acordo” devem votar a favor da moção de censura.

“Se forem sinceros na intenção de impedir uma saída sem acordo, vão votar para derrubar este governo irresponsável e caberá ao líder da oposição assegurar que a saída sem acordo não acontece e que as pessoas podem decidir o seu próprio futuro”, tinha dito no discurso.

A questão de quem liderará um governo de transição está já a dividir a oposição. A líder do Partido Liberal Democrata, Jo Swinson, rejeitou na semana passada qualquer plano que implicasse ter Corbyn como primeiro-ministro, e apresentou uma proposta alternativa para um outro chefe de governo de transição. Mas o Guardian diz que o partido está sob pressão depois de ter ficado isolado entre os grupos que rejeitam uma saída sem acordo.

Segundo uma sondagem do YouGov, cerca de metade dos eleitores preferem agora que o Reino Unido saísse sem acordo e que Jeremy Corbyn não seja primeiro-ministro. 

Corbyn acusou o Governo de querer usar o “Brexit” para “criar um paraíso fiscal para os muito ricos e assinar um acordo especial com os Estados Unidos”. E avisou: “Não tenham dúvidas de que a saída sem acordo vai servir para destruir os nossos empregos, aumentar os preços dos alimentos, e abrir o nosso Serviço Nacional de Saúde a empresas americanas”, referindo-se a uma sugestão feita por Donald Trump numa visita a Londres.

Propostas eleitorais

O líder trabalhista centrou-se, no discurso, nas propostas do Labour para os problemas do país que são anteriores à discussão sobre o “Brexit”. Atacou os conservadores por terem “virado à direita” e terem “como prioridade descer impostos para as maiores empresas e as pessoas mais ricas” e descreveu as próximas eleições como “decisivas para os serviços públicos”: num governo conservador seriam destruídos, argumentou, “porque não se pode descer os impostos para os ricos e ter os serviços públicos a funcionar”.

Fez uma série de propostas, desde renacionalizar a ferrovia (o que foi especialmente aplaudido), fazer com que o Reino Unido seja o primeiro país a declarar emergência climática, e reduzir as desigualdades de rendimento e poder.

O que levou a um comentário de Simon Jenkins, colunista do Guardian e comentador da BBC: “O discurso de hoje era a hipótese do líder do Labour conseguir uma coligação contra a saída sem acordo. Mas o que ele quer mesmo é uma eleição antecipada”.

Os últimos dias foram marcados por um documento confidencial, revelado entretanto pelo Sunday Times, que detalhava as potenciais consequências de uma saída sem acordo: três meses com escassez de combustível, alimentos e medicamentos – que pode estender-se até seis meses –, caos nos portos britânicos e uma fronteira física na Irlanda.

O relatório deu mais força ao pedido dos deputados a Johnson para interromper a pausa de verão dos trabalhos parlamentares. “Desde a II Guerra Mundial, o Parlamento tem-se reunido excepcionalmente várias vezes em todas as décadas devido a um leque alargado de questões de política, segurança ou economia”, dizem os signatários, de todos os partidos representados na Câmara dos Comuns excepto o DUP (unionistas da Irlanda do Norte).

“O nosso país está à beira de uma crise económica enquanto nos aproximamos de um “Brexit” sem acordo, que terá efeitos imediatos nos fornecimentos de comida e medicamentos, que vai prejudicar a nossa economia, empregos, as finanças públicas, serviços públicos, universidades e a segurança económica a longo prazo”, diz ainda a carta.

O líder do Labour não se referiu directamente a esta carta, mas quando questionado sobre ela, respondeu que apoia que o Parlamento se reúna antecipadamente. Caso isto não aconteça, a Câmara dos Comuns tem marcado o regresso de férias a 3 de Setembro.

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