Morte anunciada para supervisão financeira, drones e residência alternada dos filhos

Falta de tempo ou de interesse dos partidos levaram a que algumas propostas ficassem pelo caminho nesta legislatura. Eis alguns exemplos.

Foto
Nuno Ferreira Santos

O entusiasmo e as promessas foram grandes em torno de temas de peso como a supervisão financeira, o acesso dos cidadãos ao Direito, a regulamentação do uso de drones ou da residência alternada dos filhos em caso de separação do casal, mas todos vão ficar pelo caminho. Com o fim da legislatura, iniciativas como as propostas de lei do Governo, os projectos de lei ou de resolução dos partidos que não forem votados, caducam. Apenas transitam para a próxima legislatura, que começa em Outubro após as eleições, as petições e as iniciativas legislativas dos cidadãos.

Entre as razões para este destino de algumas iniciativas estão a falta de vontade política e a falta de tempo. É o caso da proposta de lei do Governo para regular os drones no espaço aéreo nacional, que foi apresentada em Janeiro e um mês depois baixou à comissão de Economia sem votação. No mês passado foi ouvida a secretária de Estado Adjunta e da Administração Interna, Isabel Oneto, que se mostrou disponível para aperfeiçoar o texto. A proposta foi arrasada por todos os partidos e pela Autoridade Nacional da Aviação Civil, defendendo mesmo que não devia ser aprovada. Nenhuma bancada manifestou vontade de apresentar propostas de alteração ao diploma, o que leva a que fique pelo caminho.

Na reforma da supervisão financeira, entregue pelo Governo no Parlamento em Março e só discutida em plenário a 7 de Junho, os deputados concluíram recentemente que era inviável terminar o processo legislativo até às férias parlamentares, tendo em conta as audições que eram necessárias realizar ao mesmo tempo que decorria a II comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos. A proposta do Governo – que estava prevista há três anos – recebeu fortes críticas por parte do Banco Central Europeu, nomeadamente quanto à designação e cessação de funções do governador do Banco de Portugal. A polémica deverá regressar na próxima legislatura.

Na Comissão de Defesa, foi o Governo que há dias retirou a sua proposta para o Estatuto do Antigo Combatente depois de os partidos terem proposto alterações que corriam o risco de ser aprovadas e que, segundo as contas do Executivo, aumentavam exponencialmente os custos para o Estado.

Soares no Panteão

Depois dos pareceres iniciais sobre as propostas do regime de residência alternada dos filhos em caso de separação terem andado semanas consecutivas a ser arrastados na agenda da Comissão de Assuntos Constitucionais, os partidos decidiram desistir, por agora, do processo. Mas como existe uma petição sobre o mesmo assunto com 4169 assinaturas, esta terá que ser discutida em plenário, prevendo-se que os partidos voltem a apresentar propostas.

Na mesma comissão “morre” a proposta de lei do Governo para o acesso ao direito e aos tribunais, que só entrou em Junho depois de ser prometida durante três anos e meio, e com ela projectos do PS, PAN e PCP – todos tinham descido sem votação, mas já não havia tempo para as audições necessárias – e o mesmo acontece com o regime das perícias médico-legais. Os socialistas também desistiram da sua proposta para regulamentar o chamado “cobrador do fraque”, e o PAN dos vistos green.

Na comissão de Cultura ficou na gaveta, além das propostas do PCP e BE para mudar o modelo de governo da RTP, a proposta do PS de 2018 que permitia trasladar de imediato Mário Soares para o Panteão Nacional depois de a família ter recusado tal honra. E na Comissão de Ambiente acabam por ficar sem efeito diversos projectos de vários partidos que estes integraram, como propostas de alteração, no regime do arrendamento, assim como o estatuto dos territórios de baixa densidade do PSD.

Entre outros pedidos de apreciação parlamentar (quando os partidos chamam ao Parlamento decretos-lei do Governo), caducam diversas em que BE, PCP e CDS queriam revogar as transferências de competências para as autarquias nos domínios da cultura, saúde educação, portos, saúde animal e segurança alimentar.

Para as estatísticas

No final de cada sessão legislativa, os partidos tendem a multiplicar a apresentação de iniciativas no Parlamento, mesmo que já não haja tempo para as debater, mas que servem para compor as estatísticas que a Assembleia da República faz anualmente sobre a produção legislativa de cada bancada. Este ano - ainda por cima em fim de legislatura – não foi excepção.

O presidente da Assembleia da República chamou a atenção, por duas vezes, sobre essa actuação dos partidos, esclarecendo que haverá uma discriminação das iniciativas que deram entrada depois do fecho dos agendamentos em plenário, o que aconteceu no passado dia 12 de Junho. Desde então entraram dezenas de projectos de lei e até três propostas de lei do Governo. Neste caso, fonte do executivo esclarece que as propostas deram entrada depois de aprovadas em Conselho de Ministros, com a expectativa de poder haver um plenário extraordinário onde pudessem ser votadas. Mas isso acabou por não acontecer.

Sugerir correcção
Comentar