Huawei admite queda até 30 mil milhões de dólares nas receitas

O presidente executivo da empresa diz que a tecnológica chinesa não estava preparada para um ataque tão grande dos EUA.

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Zhengfei voltou a comparar a situação actual da empresa com "um avião estragado" Reuters/ALY SONG

O presidente executivo e fundador da Huawei admitiu que, com sanções dos EUA, as vendas de smartphones da marca e a receita global da empresa vão cair a significativamente nos próximos dois anos.

A receita total da gigante tecnológica – barrada de fazer negócios com empresas norte-americanas desde Maio – pode ficar até 30 mil milhões de dólares (26,6 mil milhões de euros) abaixo das previsões iniciais para 2019 e para 2020.

Foi o próprio Ren Zhengfei, que fundou a empresa no final da década de 1980, que revelou os valores esta segunda-feira, em Shenzhen, na China, durante um debate organizado na sede da Huawei sobre o futuro da indústria das grandes tecnológicas globais.

O empresário chinês também confirmou relatos avançados pela agência Bloomberg, este fim-de-semana, de que é provável que as vendas de telemóveis fora da China caiam entre 40 milhões e 60 milhões de unidades antes do final do ano. No último mês, o número de smartphones exportados para fora do país terá caído 40%. O valor deve influenciar a posição da empresa no pódio de fabricantes de smartphones. Há um ano que a empresa ocupa o segundo lugar da lista, atrás da Samsung e à frente da Apple, com 206 milhões de aparelhos enviados para retalho no ano passado (perto de metade foram exportadas para fora do país).

“É como se estivéssemos num avião estragado”, admitiu Zhengfei, esta segunda-feira, ao falar sobre o impacto das relações actuais com Washington na empresa, expressão que se tem tornado comum em entrevistas recentes com jornalistas internacionais. “Quando atingimos um certo nível, sabíamos que ia existir competição. Mas não pensamos que os EUA estivessem tão preparados para tomar medidas tão extremas e tão amplas para limitar a nossa empresa.”

Em 2018, a empresa apresentou receitas a rondar os 107 mil milhões de dólares. Em 2019, a meta era chegar aos 120 mil milhões de dólares. Zhengfei diz que não deve acontecer: “A nossa receita vai estar cerca de 30 mil milhões de dólares abaixo das nossas previsões [nos próximos dois anos]. Por isso, este ano e no próximo, as nossas receitas vão rondas os 100 mil milhões de dólares.”

O foco do debate, que contou com a participação do co-fundador do centro de media do MIT (o Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos EUA) era a encruzilhada actual entre o futuro da indústria, o potencial de novas tecnologias e diferentes modos de ver o mundo. Mas as recentes sanções dos EUA ocuparam grande parte do debate transmitido pelo canal de notícias internacional chinês em língua inglesa do grupo estatal China Global Television Network (CGTN). Além de a empresa estar impedida de fazer negócios (por exemplo, vender e comprar equipamento ou componentes) com empresas norte-americanas, as relações com associações e organizações tecnológicas e universidades também foram limitadas.

“Fizemos algumas preparações”, ressalvou Zhengfei. “Mas protegemos apenas o tanque de combustível”, disse. “Não protejamos outras, as componentes mais pequenas”. E acrescentou: “E não vamos reduzir o nosso investimento na área de investigação e desenvolvimento, porque nos queremos reinventar.”

A situação actual com os EUA resulta de uma declaração de emergência nacional, assinada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, que proíbe empresas dos Estados Unidos de recorrerem a companhias estrangeiras de telecomunicações que representem um risco de segurança nacional.

Apesar de a Huawei desmentir repetidamente as acusações de espionagens, o decreto norte-americano forçou o Google a excluir os telemóveis da Huawei do acesso à Google Play Store e a actualizações do sistema operativo Android fornecidas pelo Google. Os futuros telemóveis da Huawei também vão deixar de ter pré-instaladas as aplicações do Facebook, incluindo o Messenger, o WhatsApp e o Instagram, na sequência das sanções impostas pelos EUA.

Dois anos a recuperar

A recuperação deve demorar pelo menos dois anos. “Em 2020, vamos começar a crescer novamente. Até lá temos de mudar para novas versões de produtos. Temos de nos actualizar. Depois de isso acontecer, vamos estar mais fortes”, disse Zhengfei. A semana passada foi noticiado que a empresa está a registar a marca de um sistema operativo alternativo ao Android, chamado Hongmeng, em vários países, incluindo na União Europeia.

Deixar de colaborar com os EUA, não é o objectivo. “A culpa não é das pessoas americanas”, notou Zhengfei. "E nós não temos medo de usar componentes de origem americana nos nossos produtos.”

Apesar da queda nas vendas e receitas até 2020, a curto prazo poderá haver uma subida na venda de equipamentos na Europa. “Ironicamente, a quota de mercado da Huawei na Europa Ocidental pode vir a crescer no segundo trimestre de 2019 devido ao impulso para escoar os aparelhos que faltam vender”, explicou no Twitter o analista da IDC Francisco Jerónimo. Jerónimo prevê que a Samsung, que actualmente lidera o mercado, saia a ganhar com a situação, com operadoras de telecomunicações e lojas a empurrarem clientes para telemóveis da Samsung quando acabarem as unidades da Huawei.

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