Calculadoras exigidas no exame de Física discriminam alunos com menos recursos, acusam professores

Em causa está o facto de os alunos do 11.º ano serem obrigados a utilizar calculadoras gráficas em modo de exame na prova de Física e Química. Docentes da Secundária Camões, em Lisboa, consideram que esta obrigação prejudica alunos com menos recursos.

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Rxames nacionais arrancam na próxima semana Paulo Pimenta

Os professores da Escola Secundária Camões, em Lisboa, consideram que os procedimentos enviados pelo Ministério da Educação sobre a utilização de calculadoras no exame de Física e Química A, do 11.º ano, constituem, “no mínimo, uma violação clara do que é considerado pedagógica e didacticamente correcto” quando está em causa uma prova de avaliação externa, necessária para “a conclusão da escolaridade obrigatória e até mesmo para o acesso ao ensino superior”.

Numa reunião geral realizada nesta semana, os professores do Camões aprovaram um protesto dirigido ao ME onde contestam a obrigação de os alunos terem de usar calculadoras gráficas com a funcionalidade modo de exame nas provas que se realizam na próxima semana e para a qual estão inscritos cerca de 45 mil estudantes. A razão evocada para este protesto prende-se sobretudo com o facto de os estudantes terem adquirido calculadoras gráficas no ano passado, quando entraram para o 10.º ano, “podendo na altura optar por modelos que não dispõem do modo de exame”, uma funcionalidade que ainda não era obrigatória.

O modo de exame, quando é activado, impede o acesso a outras funcionalidades que não sejam as de cálculo e as gráficas, não permitindo assim que as calculadoras sejam utilizadas, por exemplo, para aceder à descrição de como resolver problemas ou várias outras informações que tenham sido transportadas para a memória destas máquinas.

Em resposta ao PÚBLICO a propósito deste protesto, o Júri Nacional de Exames (JNE) refere que “as escolas têm conhecimento destas medidas há muito tempo”. “Esta tomada de decisão baseou-se, entre outros aspectos, no facto de os modelos das principais marcas de calculadoras gráficas actualmente existentes no mercado possuírem esta funcionalidade, bem como a grande maioria dos modelos mais antigos. Complementarmente, e nos casos em que esta situação não se verifique, pode ser facilmente instalada, mediante a actualização gratuita e online do respetivo sistema operativo, não sendo necessário a aquisição de novas calculadoras, evitando um investimento suplementar para as famílias”, adianta ainda o JNE.

A informação de que estas calculadoras passariam a ser obrigatórias a partir do ano lectivo de 2018/2019, tanto para as aulas, como para os exames, está contida numa nota da Direcção-Geral de Educação (DGE), que seguiu para as escolas em Setembro de 2017.

Já este ano, a DGE informou que “a funcionalidade modo de exame deve ser activada na sala onde se realiza o exame, na presença do professor coadjuvante [vigilante]”. Caso um aluno se apresente com uma calculadora que não tenha esta funcionalidade, “por uma questão equidade deverá proceder à limpeza da memória da calculadora na sala onde se realiza o exame, na presença do professor coadjuvante”. Se não o fizer não poderá realizar a prova.

Sociedades científicas também se opõem

Este procedimento “é no mínimo escandaloso e indignou todos os presentes”, informa o director da Secundária Camões numa nota que enviou ao PÚBLICO. “Todos estes alunos, seja porque não sabiam aquando da aquisição da calculadora no 10.º ano, seja porque ficaram com a calculadora de um irmão mais velho, seja porque simplesmente não têm condições económicas para adquirir uma calculadora gráfica topo de gama, deverão abdicar da informação disponível nas suas máquinas?”

Para os professores do Camões trata-se de “uma clara situação de discriminação socioeconómica” com a qual dizem não ser possível “compactuar”. Segundo o director da escola, dos 240 alunos inscritos para este exame apenas 10% terão calculadoras com modo de exame. Os docentes apelam por isso ao ME que altere os procedimentos previstos para os exames deste ano, o que não irá suceder. Estas calculadoras custam, em média, cerca de 150 euros. 

Os alunos de Física e Química do secundário costumavam utilizar calculadoras científicas, que são as usadas pelos estudantes do 3.º ciclo. Mas no novo programa da disciplina, que entrou em vigor em 2015/2016, defende-se que estes alunos passem a usar calculadoras gráficas, porque tal os pode “ajudar a ultrapassar alguns constrangimentos” existentes quando têm de recorrer a “conhecimentos e métodos matemáticos”.

As sociedades portuguesas de Física e de Química já se manifestaram contra a utilização de calculadoras gráficas em situação de exame por considerarem que tal “impede que se avalie o nível atingido pelo aluno”. “Usar uma calculadora gráfica com os actuais modelos de exame é como autorizar a utilização de um corrector ortográfico nas provas de escrita do 1.º ciclo do ensino básico”, adiantaram num parecer, onde chamam ainda a atenção para o seguinte: “Os alunos com capacidades económicas elevadas estarão beneficiados, pois terão acesso a máquinas com características que outros só podem sonhar.”

Notícia actualizada às 20h45. Acrescenta posição do Júri Nacional de Exames.

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