Cada um é arquitecto à sua maneira e Pedro Ramalho prefere a discrição
A Casa da Arquitectura inaugura este sábado Orgânico Racional Pedro Ramalho, a revisitar meio século da carreira deste arquitecto da Escola do Porto. Uma obra “discreta, elegante e rigorosa”, diz Nuno Brandão Costa, curador da exposição.
“Cada um de nós é arquitecto à sua maneira e esse ser arquitecto releva da sua história pessoal.” A exposição Racional Orgânico Pedro Ramalho, que este sábado é inaugurada na Casa da Arquitectura, responde bem a esta citação com que Pedro Ramalho (n. Caminha, 1937) se apresenta aos visitantes. Trata-se da amostragem de “uma arquitectura discreta, elegante e rigorosa, à semelhança do seu autor”, escreve Nuno Brandão Costa, curador desta exposição que vai poder ser visitada na Galeria da Casa até 8 de Setembro.
Em Novembro do ano passado, na passagem do primeiro aniversário da Casa da Arquitectura, Pedro Ramalho fez a doação dos seus arquivos à instituição de Matosinhos: uma dúzia de maquetas, 60 trabalhos do seu tempo de estudante de Arquitectura na Escola de Belas Artes do Porto (onde se formou na década de 60, e onde depois foi também professor), 140 projectos diversos e cerca de 2600 desenhos.
Foi a partir deste acervo que Nuno Brandão Costa foi convidado a organizar a exposição Orgânico Racional Pedro Ramalho. Optou por fazê-lo com a selecção de uma dezena de projectos de obras construídas exclusivamente no distrito do Porto, desde a Casa Emílio Peres (1963-66), na Foz, até à Casa-atelier Ângelo de Sousa (2007-10), passando também por equipamentos urbanos de grande dimensão, como a Piscina Municipal (1975-79) e o Conjunto Habitacional Sete Bicas (1987-94), ambos em Matosinhos, ou a Biblioteca Geral da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (1988-94).
“A cultura racionalista de Pedro Ramalho explica a formalização de uma arquitectura geometricamente simples, de origem clássica”, escreve Nuno Brandão Costa no catálogo que será lançado na inauguração da exposição. Mas acrescenta também que a sua arquitectura “insinua sempre uma raiz organicista que traduz uma sensibilidade específica relativa aos sítios e aos lugares no momento da construção”.
Pedro Ramalho reconhece-se nesta visão e também no roteiro de Orgânico Racional. “Quando comecei a projectar, no início da década de 60, estava muito evidente essa relação com o organicismo que vinha da arquitectura nórdica e em particular do Alvar Aalto, mas nunca perdi essa ideia da racionalidade dos projectos; a atenção que dava à organização das plantas foi sempre muito racional, e muito de dentro para fora”, disse o arquitecto aos jornalistas, quinta-feira, na visita guiada à exposição.
Racional orgânico reconstitui meio século de actividade profissional deste arquitecto da Escola do Porto, que assume como prioritário conciliar a encomenda e o programa com o sítio da construção, mas também com as circunstâncias históricas – foi um dos intervenientes no Processo SAAL [Serviço de Apoio Ambulatório Local], que nos anos a seguir ao 25 de Abril de 1974 se ocupou em suprir as necessidades mais básicas em habitação social no país, e para o qual desenhou um conjunto habitacional para a zona das Antas, no Porto.
“Eu não sou muito pela exuberância, acho que a arquitectura deve ser discreta”, diz Pedro Ramalho, partilhando a afirmação do brasileiro Paulo Mendes da Rocha quando este defende que “o edifício é muito menos importante do que a cidade”. “Cada vez mais me sinto mais limitado pela envolvente, e não estou nada interessado em entrar numa linha de exibicionismo; não quero deixar essa pegada”, acrescenta.
Pedro Ramalho é autor de uma arquitectura que “associa a ética à estética”, diz Nuno Sampaio, director artístico da Casa da Arquitectura, realçando que Racional orgânico, “olhar de um arquitecto sobre outro arquitecto, é apenas uma primeira leitura” da sua obra com base no acervo doada à instituição.
Além da amostragem dos dez projectos construídos na região portuense – uma mesa com as plantas originais, as maquetas respectivas e fotografias desses edifícios na actualidade de autoria de André Cepeda –, a exposição comissariada por Nuno Brandão Costa contém algumas intervenções feitas expressamente para esta ocasião: uma instalação da artista conceptual de Zurique Marianne Mueller, uma caixa de luz de André Cepeda e ainda três “pequenos exercícios gráficos” dos arquitectos Carlos Prata, João Pedro Serôdio e José Miguel Rodrigues – este último é também o autor de uma entrevista inédita ao também arquitecto da Casa das Artes de Famalicão e da recuperação do Teatro Rivoli (Porto), que sairá no catálogo.