O último coala

Desde 1970 perdemos metade das populações animais até então existentes. Eu não quero assistir à morte do último coala.

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Yves Herman/Reuters

No nosso tempo de vida já assistimos à morte do último macho de rinoceronte-branco-do-norte, da última foca-monge-das-Caraíbas, do último tigre-de-Java, só para citar alguns exemplos. Mais recentemente, em 2018, e 2018 é já ao virar da esquina, perdemos as seguintes espécies: a arara-azul-pequena, o limpa-folha-do-nordeste, o caburé-de-Pernambuco, o puma-de-leste.

Entre as espécies em risco de extinção encontramos a girafa, o lémure, o urso-polar, o gorila da montanha, o panda gigante, o rinoceronte de Java, o coala. A lista continua, como podem imaginar. Vítimas da caça, cobiçados pela sua carne ou pela sua pele, incómodos habitantes de áreas por desflorestar para criação de gado, construção de estradas, vilas e cidades, vítimas do aquecimento global, de chuvas intensas, secas severas, do aumento do nível do mar e da salinização dos rios, vítimas da desertificação e do afogamento, de tempestades e incêndios de proporções bíblicas, a lista de espécies em perigo ou já extintas não pára de aumentar.

Desde 1970 perdemos metade das populações animais até então existentes. 1970 foi há quase 50 anos. E daqui a 50 anos? Assistiremos nós à morte do último elefante africano, do último leopardo das neves, do último lince ibérico, do último coala? Tudo espécies protegidas, por certo, mas que protecção podemos oferecer quando alegremente nos encarregamos de terraformar todo um planeta?

Como se fôssemos extraterrestres envenenados pelo oxigénio da atmosfera e incapazes de viver em ambientes impolutos, sedentos de betão, combustão, dinheiro, viagens, férias, jantares, Facebook, “Insta”, Snapchat, WhatsApp, casas e carros, consumo desmesurado em nome de quê e de quem, vítimas de nós próprios e da nossa ganância.

Os coalas podem vir a ser declarados “funcionalmente extintos”, referindo-se o termo à capacidade de uma espécie para se renovar. Com uma população de 80.000 indivíduos, a destruição dos seus habitats, a consanguinidade e as alterações climáticas são apenas alguns dos factores que rapidamente podem levar à extinção desta espécie há muito em perigo.

Oito milhões de coalas foram mortos até aos anos 20 do século passado. Para fazer casados de peles, luvas e chapéus, muito em voga há data nos países ocidentais. Não quiséssemos casacos de peles, luvas ou chapéus. E eu não quero assistir à morte do último coala. 

Mas esta fé inabalável na natureza e na sua capacidade de recuperação mantém-se. Afinal, basta acrescentar mais uma espécie à lista de espécies em perigo: a espécie humana. Ignorando o facto de viver dentro deste aquário global, rapidamente o ser humano encontrará o seu fim num cataclísmico harakiri climático. 

Livre do Homem, a natureza ressuscitará, voltando a ocupar o lugar que foi sempre seu. Ao fim de poucos séculos não restará nenhum vestígio da nossa presença. Livres, os animais terão todo o tempo do mundo para recuperar as suas populações, crescendo e multiplicando-se. Os coalas incluídos. Até ao raiar de um novo humano daqui por muitos milhões de anos, esperemos que mais sereno, consciente, sensato. Esperemos que mais inteligente. Não é difícil.

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