Sete Anos em Sete Mares: Bárbara escreveu um livro para nos fazer “agir imediatamente”
Uma missão contra a desflorestação da Amazónia levou Bárbara a ficar sete anos no mar. Passou por mais de 80 países para lutar pelo ambiente e pelas pessoas. A aventura resultou num livro, Sete Anos em Sete Mares, que, depois de Lisboa, vai ser apresentado no Porto.
Começou por limpezas de praias e trilhos com amigos, levados pela crença de que, todos juntos, podiam minimizar o problema da poluição. Na altura com 14 anos, Bárbara Veiga ficou “impressionada” com a quantidade de lixo que encontrava nas “praias bonitas e selvagens” do Rio de Janeiro, onde nasceu. E ainda que o pequeno grupo de amigos se tenha transformado num grande aglomerado de pessoas, a activista percebeu que, por muitos que fossem, o problema era “muito mais complexo”. Por isso, dedicou-se à causa: viveu sete anos no mar e passou por mais de 80 países para defender a vida marinha e coleccionar histórias. A aventura deu um livro — Sete Anos em Sete Mares.
“O oceano é enorme, toca em todos os continentes e eu achei que aquele acto [recolha de lixo] ia ser bom no momento, mas não ia resolver o problema — que é o descarte”, conta Bárbara Veiga, ao telefone com o P3. Resolveu começar a trabalhar com organizações ambientais para se poder sentir “mais próxima de uma solução e dar voz a um problema que é global”. A primeira missão, tinha Bárbara “vinte e poucos anos”, foi ao serviço da Greenpeace e contra o desmatamento da Amazónia. Foi o início de uma jornada que acabou por trilhar de uma forma natural: “Quando reparei, já estava envolvida com o trabalho da Sea Shepherd Conservation Society e foi uma decisão muito orgânica, que foi acontecendo.”
Formada em jornalismo, fotografia e artes visuais, a activista de 35 anos aprendeu a navegar e tornou-se marinheira. Actualmente, trabalha como fotógrafa e realizadora: quer documentar e dar visibilidade a questões socioambientais, desde a desflorestação da Amazónia e o desequilíbrio que a acção provoca no ecossistema até à “matança” de baleias que acontece todos os anos na Antárctida, entre Dezembro e Março. Com o pretexto da investigação científica, a frota japonesa captura baleias — mas, “na verdade, a carne de baleia é comercializada”. “Uma baleia pode valer 250 mil dólares e um prato de baleia pode valer 400. E há gente que paga por isso”, indigna-se Bárbara.
Visitou lugares “extremos e inóspitos”, viveu num mundo de homens — o do mar —, passou por situações “hollywoodescas”. No Golfo de Áden, a 35 milhas da costa, foi abordada por quatro piratas, que largaram a âncora e encostaram o seu barco ao de Bárbara, na altura apenas acompanhada por mais um colega. “Tentei comunicar com o homem que parecia o líder, mas não tínhamos nenhum idioma em comum”, relata. Juntou comida numa cesta e entregou-lhe. “Foram minutos de silêncio, sem saber o que ia acontecer, até que ele, com gestos, explicou que estava com uma infecção nos genitais.” Bárbara deu-lhe uma caixa de antibióticos e explicou-lhe, também com gestos, como tomar: “[Passaram-se] Mais alguns minutos de silêncio. Até que eventualmente um desses quatro homens, que estavam desnutridos, desesperados e perdidos, pegou na âncora do barco e foram embora.”
Enquanto os via desaparecer no horizonte, a carioca reflectia sobre o que tinha acabado de viver. “Uma experiência para repensar a vida, repensar absolutamente tudo. A relação com o outro, as dificuldades do outro, a complexidade do mundo.” E o acontecimento reforçou ainda mais a sua “vontade de fazer mais pelo planeta e pelas pessoas”, de lutar pelas questões socioambientais. “Ninguém nasce a querer roubar e matar; as circunstâncias de desigualdade social e económica é que fazem com que essas situações sejam recorrentes”, refere.
Foram estas histórias que foi escrevendo nos cadernos que levava consigo — hábito que tem desde os dez anos, o de “escrever e reler experiências”. “Quando voltei desses anos todos de viagem, apercebi-me que tinha mais de 50 caderninhos com anotações e senti que poderia compartilhar essas histórias e, quem sabe, estimulá-las a pensar mais sobre o consumo e o respeito pelo meio ambiente”, explica.
Nasceu, então, Sete Anos em Sete Mares, o livro, editado no mês passado no Brasil, que conta “essa jornada e essas lutas”. Depois de ter passado, no dia 9 de Maio, pela Fnac Chiado, em Lisboa, a autora vai apresentar a obra esta quarta-feira, 15 de Maio, pelas 18h, na Livraria Lello, no Porto. A escritora espera “contar com o apoio” dos portugueses para, juntos, pensarem “em acções e medidas colectivas”.
“É o momento de agirmos imediatamente”, alerta. Bárbara refere “o desequilíbrio no oceano”, com espécies em perigo de extinção, além da “poluição, descarte e sujeira”, da “grande ilha de lixo que existe no Pacífico” e das “micropartículas de plástico que estão em mais de 90% do organismo de animais marinhos”. Problemas que afectam todos, relembra: “Estamos interligados com outras vidas e dependemos desse equilíbrio para estarmos em harmonia com o todo.”
Apesar de ter esperança na próxima geração, que falta às aulas pelo clima e exige aos governos justiça climática, a activista refere que “é importante fazermos esse movimento juntos porque é colectivo e de todas as idades”. E sublinha a importância de os governos fazerem também parte da mudança: “Claro que cada decisão de um cidadão consciente é importante, mas as respostas mais eficazes e rápidas vêm do poder, dos governos e das corporações, que são responsáveis por oferecer serviços conscientes e de qualidade.” É preciso haver opções: “Para que todas as classes tenham opções de reciclar, reutilizar e fazer um consumo claro, objectivo e consciente.”
Em Março, a activista co-fundou a Liga das Mulheres pelos Oceanos, que pretende reunir mulheres que se unam pelos oceanos, para divulgar exemplos de luta e estudos ambientais. Voltar ao mar? Para já está concentrada no lançamento do livro na Europa, quer aproveitar a “oportunidade de conectar com mais pessoas”. Até porque é preciso “ver uma transformação real do mundo”. “Estamos a precisar de dar esse passo.”