Rui Pinto diz que Portugal é “um país repressivo para denunciantes”

Hacker português recebeu uma distinção da Esquerda Unitária Europeia.

Foto
LUSA/RODRIGO ANTUNES

Rui Pinto, o português na origem de denúncias de alegados casos de corrupção e evasão fiscal no futebol, classificou nesta terça-feira Portugal como “um país repressivo para denunciantes”, esperando mudanças com a lei aprovada esta terça-feira para proteger estas pessoas na União Europeia (UE).

“Portugal é um dos países europeus mais repressivos para os whistleblowers [denunciantes]. Por isso, espero que a nova directiva europeia possa mudar isto, num futuro próximo, e que dê coragem às pessoas que lutam contra a corrupção em todos os níveis”, salientou Rui Pinto.

Esta mensagem de Rui Pinto, que está preso em Portugal desde o passado dia 22 de Março, foi lida na cerimónia de atribuição de um prémio europeu para denunciantes promovido pela Esquerda Unitária Europeia (GUE/NGL), do qual o hacker português foi um dos vencedores.

A mensagem foi lida numa conferência de imprensa por outro denunciante, o auditor francês Antoine Deltour, que divulgou o escândalo financeiro LuxLeaks.

“Planeei denunciar tudo este ano, mas o mandado de detenção executado por Portugal precipitou tudo, incluindo os meus esforços para estabelecer uma colaboração vital com autoridades de outros países para investigar vários crimes”, acrescentou Rui Pinto, referindo que “Portugal tentou tudo para o evitar, mas não conseguiu”.

Sobre o prémio GUE/NGL, que distinguiu “jornalistas, denunciantes e defensores do direito à informação”, Rui Pinto disse ser “uma grande honra” recebê-lo e vincou que fez “isto pelas pessoas, pela verdade e pela transparência”.

“As autoridades portuguesas querem pintar-me como um criminoso e descredibilizam tudo o que fiz ao expor a criminalidade no futebol e noutros sectores”, lamentou.

Na declaração, Rui Pinto reiterou, assim, ter “receio de não ter um julgamento justo em Portugal”.

“A decisão absurda que levou à minha detenção fortalece os meus medos”, adiantou.

Através da plataforma electrónica Football Leaks, o hacker começou a divulgar, em 2015, milhares de documentos confidenciais de contratos e transferências do mundo do futebol, que davam conta desses esquemas de evasão fiscal.

Rui Pinto, hoje com 30 anos, foi entregue pelas autoridades húngaras à justiça portuguesa em Março deste ano e encontra-se em prisão preventiva no âmbito de um inquérito titulado pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal, no qual está indiciado por seis crimes relacionados com acessos aos sistemas informáticos do Sporting e da Doyen Sports e com uma alegada tentativa de extorsão a este fundo de investimento.

Os vencedores do prémio do GUE/NGL foram anunciados à margem da sessão plenária do Parlamento Europeu, que decorre em Estrasburgo, França, e incluem também o fundador da organização Wikileaks, Julian Assange, e Yasmine Motarjemi, denunciante dos lapsos de segurança alimentar da Nestlé.

Esta terça-feira foi ainda aprovada no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, a primeira lei europeia para os whistleblowers, visando uma protecção uniforme e elevada em toda a UE. As novas regras prevêem, por isso, canais de comunicação seguros (internos e externos) para as denúncias e medidas contra a intimidação e represálias.

No caso de Rui Pinto, o hacker não irá beneficiar directamente da nova lei, sendo que não agiu no seio de uma organização, como prevê a directiva, mas pode ser, ainda assim, abrangido pela acção em prol do interesse público, desde logo quando esta legislação é relacionada com outras existentes.