O ministro mais ideológico de Bolsonaro paralisou a Educação e está a prazo

Entre polémicas e demissões, o Ministério da Educação no Brasil tarda em começar a funcionar, quatro meses depois de Ricardo Vélez ter iniciado funções.

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O ministro da Educação, Ricardo Vélez, pode ser demitido já esta segunda-feira AMANDA PEROBELLI / Reuters

Quase cinquenta anos separam o ministro da Educação do Brasil, Ricardo Vélez, e a deputada federal estreante, Tabata Amaral. Mas foi a jovem de 25 anos que se comportou como uma professora exigente, perante um aluno pouco trabalhador. “Em um trimestre não é possível que o senhor apresente um Power Point com dois, três desejos para cada área da educação. Onde estão os projectos? Onde estão as metas?”, questionou a parlamentar no final do mês passado, durante a sessão da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados.

De Vélez, Tabata Amaral nada ouviu. Mas no ar ficou patente a fragilidade de um ministro que parece ter os dias contados. A história dos primeiros meses do Ministério da Educação (MEC) é a de uma sucessão de polémicas, demissões, lutas internas e uma paralisia preocupante, especialmente num país onde os desafios na educação são enormes.

Ter um emprego no MEC tornou-se desde a tomada de posse de Vélez uma espécie de “roleta russa”: em quatro meses, pelo menos 15 funcionários de níveis superiores foram afastados, alguns ao fim de poucos dias. A entrada e saída acelerada de funcionários ministeriais é uma das faces de uma guerra pouco encoberta entre as duas facções que combatem pela influência sobre a Administração de Jair Bolsonaro, os chamados “olavistas” contra os “militares”.

Os primeiros são os seguidores do escritor Olavo de Carvalho – um autodenominado filósofo que durante décadas foi desprezado pelos meios académicos brasileiros mas que viu a sua popularidade disparar graças aos vídeos que publicou no YouTube em que discorre sobre temas como a invasão do “marxismo cultural” e a “ditadura do politicamente correcto” – entre os quais se conta o próprio ministro da Educação de origem colombiana, mas também o ministro dos Negócios Estrangeiros, Ernesto Araújo, e a ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves.

Os seus principais opositores no Governo são os dirigentes recrutados nas Forças Armadas e que, ao todo, chefiam oito ministérios, incluindo três dos quatro sedeados no Palácio do Planalto, sede da Presidência.

A convicção dos militares é de que Vélez está demasiado comprometido com propostas ideológicas para a área da educação, em vez de se concentrar num programa mais pragmático. Curiosamente, as falhas apontadas pelos militares coincidem com a ausência de um programa credível notada pela deputada Tabata Amaral.

“É algo normal que um Governo tenha diferentes grupos internos em disputa, mas no caso do Ministério da Educação, eles estão se boicotando e o ministro e o Presidente não estão sabendo arbitrar”, afirma a investigadora do Centro de Política e Economia do Sector Público (CEPES) da Fundação Getúlio Vargas, Lara Mesquita, citada pela BBC Brasil.

Um dos episódios mais reveladores das prioridades de Vélez foi o envio de uma directiva para todas as escolas brasileiras em que lhes era pedido que gravassem os alunos a cantar o hino nacional e enviassem os vídeos para o ministério – a carta terminava com o slogan de campanha de Bolsonaro, “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”. Alguns professores responderam lembrando que muitas escolas não têm sequer material para filmar e sugeriram que o ministro conhecesse primeiro a realidade das condições escolares no país. A medida acabou por ser retirada.

Esta semana, Vélez voltou a estar no centro de uma nova polémica, ao sugerir, numa entrevista ao jornal Valor Económico, que os manuais escolares devem ser revistos para dar “uma versão mais ampla” do período da ditadura militar brasileira. As declarações do ministro aparecem numa altura em que o Governo ficou sob fogo da justiça por ter promovido actos de comemoração do golpe militar de 1964, que derrubou um Governo eleito e deu início a duas décadas de ditadura.

Para o colunista do jornal O Globo Bernardo Mello Franco, as afirmações de Vélez não passam de uma “tentativa desesperada de bajular os generais do Governo, que já pediram sua cabeça ao Presidente Jair Bolsonaro”. Muito provavelmente terá sido o último acto de Vélez como ministro. Esta semana, Bolsonaro reconheceu haver “problemas” com a gestão do ministério e admitiu que Vélez “não tem tacto político”. Prometeu revelar esta segunda-feira a sua decisão quanto à continuidade no cargo.

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