Défice: para Bloco e PCP o Governo serve mais o PS e Centeno do que o país

Esquerda acusa Governo de ter “centenas de milhões de euros” e não os investir: por submissão a Bruxelas, diz o PCP; por pôr “os interesses do PS à frente dos interesses de investimento no país”, diz o BE.

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Partidos que apoiam Governo criticam Centeno e preferiam ver o dinheiro investido em diferentes sectores Rui Gaudêncio

O coro de críticas vem tanto do Bloco de Esquerda como do PCP. Os dois partidos, que fazem parte da solução de Governo, acusam o executivo socialista de “sistematicamente” ir além das metas definidas para as contas públicas e de ter, afinal, folgas orçamentais que não são usadas para investir no país. “Não é uma pequena folga, estamos a falar de centenas de milhões de euros”, diz a deputada do Bloco, Mariana Mortágua.

Também os comunistas, numa resposta enviada ao PÚBLICO, lamentam que a estratégia do Governo: “Os dados da execução orçamental que têm vindo a ser divulgados, com uma significativa redução do défice das contas públicas e a existência de superavits primários (sem contabilização dos juros na despesa pública) cada vez maiores, mostram que teria sido possível ir mais longe na resposta a problemas e aspirações dos trabalhadores e do povo português, como sempre defendeu o PCP.”

Os dados oficiais serão apresentados pelo Instituto Nacional de Estatística nesta terça-feira, mas há sinais cada vez mais evidentes de que o défice público no ano passado pode ter ficado abaixo da meta definida pelo Governo – é o terceiro ano em que tal acontece. Mais: o ministro das Finanças, Mário Centeno, já revelou que o país se antecipou um ano e poderá atingir, no final de 2019, o objectivo para o saldo orçamental exigido por Bruxelas.

O PCP não se deixa impressionar pelos cálculos de Centeno e acusa o executivo de António Costa de se submeter, à semelhança do que fez a direita, às imposições de Bruxelas: “Não fosse a opção do Governo PS, em convergência aliás com as posições assumidas por PSD e CDS, de submissão às imposições da União Europeia e do euro, e estamos certos de que se teria ido mais longe na resolução dos problemas dos serviços públicos, no aumento do investimento público, numa maior valorização dos salários e das pensões.”

Para Mariana Mortágua, o que está em causa é “uma estratégia do Governo”, de “promoção do PS”, e outra de “promoção pessoal”, de Mário Centeno. “É uma estratégia eleitoral, mas é também uma estratégia de promoção deste Governo lá fora e em Bruxelas. E isso é feito com uma gestão orçamental que é errada”, critica a economista.

“Incompreensível”

“É errada para o país, porque não permite fazer os investimentos necessários. É errada para a economia, porque a falta de investimento também tem um impacto negativo na economia ou, pelo menos, podia estar a acelerar mais do que está. E é errada, do ponto de vista de governação, porque concentra no ministro das Finanças decisões que deveriam estar descentralizadas nos diferentes ministérios”, enumera a deputada, lamentando que, em vez de se “usar o crescimento da economia para reduzir a dívida”, está-se “a reduzir a dívida e prejudicar o crescimento da economia”.

Também para o PCP não se trata de pôr em causa o rigor das contas públicas, mas de seguir outros caminhos que permitam “uma resposta mais profunda e ampla a problemas estruturais” do país. Caminhos diferentes daqueles que, quer a direita, quer o PS insistem em trilhar: “Opções que se distinguem das que unem PS, PSD e CDS, pela prevalência dos interesses nacionais face a critérios que, no essencial, se têm constituído como fortes constrangimentos à melhoria da situação económica do país, das condições de vida da população e da evolução das contas públicas.”

Mariana Mortágua considera que “este Governo tem valores vergonhosos de investimento público” e “despesas correntes fechadas na gaveta de Mário Centeno, durante meses, que põem em causa melhores serviços públicos”. Tudo, prossegue, “porque “Centeno e o Governo adoptaram uma estratégia de querer fazer um brilharete”: “Interessa ao PS fazer este brilharete, quem fica a perder e o que é sacrificado é o investimento público em sectores essenciais”, diz.

Os sectores em que os bloquistas consideram que é preciso mais investimento são vários: saúde, educação, cultura, carreiras dos regimes especiais do Estado, entre muitos outros: “Sempre que se diz que não há dinheiro para isto, somos confrontados, passado um ano, com a existência de uma folga”, sublinha Mortágua.

Para a deputada, trata-se de uma estratégia “incompreensível” e de “uma gestão que coloca os interesses do PS, os interesses de gestão da sua imagem, à frente dos interesses de investimento no país”.

Mariana Mortágua lamenta ainda que os partidos pouco possam fazer para dar a volta a este problema, que tem sido “grave” ao longo da legislatura: “É uma questão muito delicada, porque o Parlamento não tem efectivamente poder para interferir na execução orçamental. Tem poder para aprovar os limites de despesa, para aprovar valores indicativos de investimento no Orçamento do Estado, tem poder até para aprovar reforço de verba em algumas rubricas, e é isso que temos vindo a fazer, mas não temos como obrigar um ministro a gastar o dinheiro.”

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