Condenados por venderem quadros falsos de José de Guimarães

Burlões foram sentenciados a cadeia efectiva, mas falsário nunca foi apanhado. Pintor admite que o sucedido interferiu de alguma forma no seu processo criativo.

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José de Guimarães Daniel Rocha

A primeira obra que chegou aos olhos do pintor José de Guimarães era quase idêntica ao original, mas o artista nem precisou de olhar melhor para ela para saber que era falsa: o original está exposto na sua terra natal, precisamente Guimarães, pelo que não podia ser verdadeira a tela que um marchand lhe tinha ido mostrar por ter dúvidas sobre a sua autenticidade.

Dez anos depois, esta quinta-feira, a justiça revelou-se pouco compreensiva para com os dotes de dois homens que introduziram no mercado das artes oito réplicas de obras do pintor, no valor de dezenas de milhares de euros. Um dos arguidos, um burlão que já se encontra a cumprir pena por outros crimes, foi condenado a sete anos de prisão efectiva, enquanto o outro foi sentenciado a seis. Os seus advogados já anunciaram que irão recorrer. Detalhe que não é de somenos: continua sem se saber quem foi ou onde pára o falsário que não só imitou os originais como lhes introduziu várias alterações de sua lavra. As autoridades só conseguiram deitar a mão aos seus dois cúmplices, mas não ao autor das oito obras – uma das quais só foi apreendida num leilão efectuado no ano passado, já o julgamento do caso decorria no Campus da Justiça, em Lisboa.

“Eram trabalhos horríveis, executados de forma muito rude, a imitar obras minhas dos anos 70”, insurge-se José de Guimarães. Não é a primeira vez nem a segunda que se encontra perante falsificações de trabalhos seus. O facto de ter criado dezenas de telas ao longo dos seus quase 80 de vida facilita o trabalho aos burlões: qualquer imitação passa mais facilmente por ser um original menos conhecido. De resto, o próprio pintor chegou a cair no logro, ao ter passado inadvertidamente um certificado de autenticidade a uma aguarela falsa, da qual lhe mostraram uma foto.

Os falsários recorreram a alguns expedientes próprios do negócio, como o envelhecimento artificial das telas – que eram, na sua maioria, de médias e grandes dimensões. Quando o caso se tornou conhecido nos meios artísticos José Guimarães diz que se deu uma quebra nos leilões das suas obras, e que muita gente que tinha adquirido trabalhos seus lhe pediu certificado. Daí que, para o compensar dos prejuízos materiais e também morais, os juízes tenham decretado que os arguidos Francisco Simões da Cunha e Joaquim Pinto dos Santos lhe paguem uma indemnização de cerca de 147 mil euros. Quantia que o artista já desistiu de vir a receber: “Não tenho ilusões, eles não têm dinheiro.”

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Há vários anos a trabalhar no mundo das artes e das antiguidades, no Porto, os burlões espalharam entre os seus contactos a notícia de que havia um coleccionador de José de Guimarães interessado em vender várias obras. Várias pessoas morderam o isco e fizeram negócio com os dois homens, que para alguns dos quadros forjaram ainda certificados de autenticidade.

O pintor recorda a saga do italiano De Chirico, que passou vários anos da sua vida à procura dos seus falsificadores. “Só descansou quando os meteu na cadeia”, assinala. José de Guimarães não pensa em fazer semelhante coisa, mas admite que o sucedido interferiu de alguma forma no seu processo criativo: “Quando pinto penso nisso. Às tantas uma pessoa tem de arranjar uma técnica difícil de reproduzir.”

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