A história pessoal é a nova arma de campanha de Bernie Sanders

O senador independente fala da sua infância em que o dinheiro era causa de ansiedade. Num campo democrata com concorrentes com propostas semelhantes, Sanders resolveu falar sobre a sua história.

Bernie Sanders: "os eleitores têm o direito de saber as minhas origens"
Fotogaleria
Bernie Sanders: "os eleitores têm o direito de saber as minhas origens" ANDREW KELLY/Reuters
Fotogaleria
Apoiantes entusiasticos apesar do frio ANDREW KELLY/Reuters
Fotogaleria
Reuters/ANDREW KELLY

Ao entrar num campo já com muitos concorrentes, o dos democratas prontos a disputar o lugar de candidato à Presidência, e muitos deles partilhando várias das suas ideias, Bernie Sanders escolheu um lugar que não é a sua casa política, o Vermont, nem nenhum dos locais-chave das primárias. O senador escolheu um local em Brooklyn, "literalmente a poucos metros" do sítio onde nasceu.

E fê-lo, como nota a revista New Yorker, para se reapresentar aos eleitores. Bernie Sanders, 77 anos, está na política há cerca de 40 anos, mas sempre teve grande relutância em falar da sua vida. Uma repórter da revista contou que na campanha anterior o fez em resposta a uma pergunta, mas "após um suspiro de quem tem mesmo de ir àquela consulta de dentista".

Este sábado, no primeiro comício da sua segunda tentativa de ser o candidato democrata à Presidência, Sanders mudou: disse que os eleitores “têm o direito de saber” as suas origens, “porque a história familiar influencia obviamente os valores que desenvolvemos quando somos adultos”. A sua campanha quer que fique mais clara a ligação entre as suas origens e as suas políticas.

Sanders falou do pai, judeu que saiu da Polónia aos 17 anos para os Estados Unidos, e cuja família “Hitler e a barbárie nazi fizeram desaparecer”. Da mãe, que morreu nova, e cujo sonho era ter uma casa, e recordou que, apesar de não ser pobre, “a falta de dinheiro era um motivo constante de ansiedade na família”.

“Vivia num apartamento T1+1 com renda controlada”, contou. “Fui educado em escolas públicas de grande qualidade.”

A imprensa americana notou esta estratégia diferente. As políticas que Sanders defendeu continuam as mesmas: programa de saúde para todos, salário mínimo de 15 dólares por hora, universidades públicas sem propinas. Denunciou as políticas de empresas como a Amazon, Netflix e General Motors.

Na maior parte do discurso Sanders repetiu palavras que já usou antes, como “revolução, “justiça económica", “complexo prisional-industrial”, escrevia o New York Times. “Mas uma palavra foi nova: ‘eu’”.

A sua história também serviu para marcar a diferença em relação a outro nova-iorquino – o Presidente, Donald Trump. E Sanders não se coibiu de fazer comparações directas: “não tive um pai que me desse milhões de dólares para comprar arranha-céus de luxo, casinos e casas de campo”, disse. “Não venho de uma família privilegiada que me preparasse para o entretenimento televisivo, para dizer a trabalhadores ‘estás despedido’”, descreveu o New York Times. “Venho de uma família que sabia demasiado bem o poder assustador que os empregadores podem ter sobre os empregados.”

Sanders tem ficado em segundo lugar nas sondagens, a uma curta distância do antigo vice-Presidente Joe Biden, que ainda não anunciou se irá concorrer. Mas na mais recente sondagem no New Hampshire, o primeiro estado a ter primárias, Bernie Sanders estava com 26%, à frente de Biden, que tinha 22%, seguidos pela senadora Kamala Harris da Califórnia (10%), e Elizabeth Warren do Massachusetts (7%).

Bernie Sanders tem recebido como elogio o facto de ter defendido sempre o mesmo género de políticas. São políticas que levam os republicanos a chamar-lhe “socialista” e que tornaram o senador independente numa espécie de “lobo solitário”, na descrição do Times.

E o que eram propostas políticas vistas como exclusivo de uma ala radical do Partido Democrata são agora muito mais comuns no partido, partilhadas por vários dos candidatos já na corrida como Elizabeth Warren (que há anos defende propostas económicas semelhantes), entre outros.

Segundo a CNN, que cita uma sondagem recente da Gallup, o partido está a tornar-se “menos branco, com mais educação, menos religioso e progressivamente mais liberal desde 2001”.

“Antes de 2016, ninguém falava de cuidados de saúde universais, e de educação universitária universal”, comentou Dave Degner, líder dos democratas do condado de Tama, no Iowa. Mas se foi Sanders quem ajudou a trazer essas propostas para o mainstream, isso não significa que recolha necessariamente vantagens, pelo contrário: “Se aparecer a dizer as mesmas coisas que dizia antes, já não vai ser novo”. 

Sugerir correcção
Ler 5 comentários