Juiz pede auditoria feita à CGD para esclarecer papel de Vara e Sócrates
“A análise deste relatório mostra-se relevante para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa”, justificou Ivo Rosa, juiz de instrução da Operação Marquês.
O juiz de instrução criminal da Operação Marquês, Ivo Rosa, pediu ao Parlamento que lhe envie a auditoria feita à Caixa Geral de Depósitos pela consultora Ernst & Young. Objectivo: ajudar a esclarecer se as decisões de Armando Vara, que é arguido neste processo por causa das decisões que tomou na qualidade de administrador do banco sobre a concessão de crédito ao empreendimento turístico de Vale do Lobo, foram fruto de gestão deficiente ou se, como defende o Ministério Público, configuram crime.
O antigo governante estava no conselho de administração da Caixa em 2006, tendo sido sob a sua égide que nessa altura o banco não só concedeu um empréstimo de cerca de 200 milhões de euros aos accionistas da sociedade gestora do empreendimento como também adquiriu 25% do capital do resort, correspondente a mais 28 milhões. O negócio é considerado ruinoso, defendendo a acusação que Armando Vara recebeu uma contrapartida ilícita de um milhão de euros para franquear os cofres da Caixa Geral de Depósitos aos promotores de Vale do Lobo - Diogo Gaspar Ferreira, Rui Horta e Costa e um grupo liderado por Helder Bataglia, todos também arguidos na Operação Marquês.
A auditoria independente da Ernst & Young à gestão da Caixa concluiu que entre 2000 e 2015 foram aprovadas operações de concessão de crédito superiores a mil milhões de euros sobre as quais existiam pareceres de análise de risco desfavoráveis ou condicionados. É o caso de Vale do Lobo. O que poderá significar que este empreendimento não beneficiou de decisões excepcionais, como disse esta quinta-feira ao juiz Ivo Rosa o director do departamento de risco de crédito da Caixa à data deste negócio, Vasco d'Orey.
Na sequência das declarações desta testemunha que chamou para depor no Tribunal Central de Instrução Criminal, o magistrado oficiou o chefe de gabinete do presidente da Assembleia da República para que este lhe faça chegar o relatório final da Ernst & Young. A Caixa tinha-se recusado a enviar o documento aos deputados, alegando segredo de justiça, mas em Janeiro a comentadora da CMTV Joana Amaral Dias revelou o seu conteúdo na estação televisiva. A seguir, no início de Fevereiro, o líder do banco público, Paulo Macedo, acabou por o entregar no Parlamento, embora da versão que forneceu não constasse a identidade dos grandes devedores, por motivos relacionados com o segredo bancário.
“Tendo em conta os factos em discussão, em particular a operação de financiamento de Vale do Lobo, na qual são arguidos, entre outros, José Sócrates e Armando Vara, a análise deste relatório mostra-se relevante para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa”, pode ler-se num despacho de Ivo Rosa.
A fase instrutória da Operação Marquês prossegue no final do mês, com a audição de várias testemunhas arroladas pelo arguido Henrique Granadeiro, incluindo o ex-ministro António Mendonça. O antigo presidente da Portugal Telecom também tinha indicado o magnata mexicano Carlos Slim, mas o tribunal português não conseguiu notificá-lo. Para Abril está previsto o interrogatório de arguidos do grupo Lena e também de Domingos Farinho, o alegado escritor-fantasma da tese de doutoramento do ex-primeiro-ministro José Sócrates. Os ex-governantes socialistas Paulo Campos, Teixeira dos Santos e Carlos Costa Pina deverão ser ouvidos em Maio. Irão testemunhar a favor do antigo chefe do Governo.
Entretanto, o movimento cívico Revolução Branca, que se tinha constituído assistente neste processo, renunciou a essa condição. Questionado pelo PÚBLICO, o responsável pelo movimento, Pedro Pereira Pinto, explicou que a decisão se deveu a questões logísticas e financeiras, uma vez que o movimento está sediado no Porto e a fase instrutória do processo decorre em Lisboa.