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A culpa é da Eva

Neto de Moura, juiz tristemente famigerado pela sua notável verve e pensamento, arrisca-se a tornar-se o arauto da banalização do femicídio.

As mulheres passaram de vítimas de violência doméstica a quem ninguém prestava a devida atenção a perversas e exageradas que não hesitam em recorrer à denúncia para diabolizar os homens de quem se queixam. Neto de Moura, juiz tristemente famigerado pela sua notável verve e pensamento, arrisca-se a tornar-se o arauto da banalização do femicídio. 

Quando especula sobre a tendência feminina de transformar uma banal discussão doméstica na diabolização masculina, a quem “nenhum crédito pode ser-lhe reconhecido”, este juiz do Tribunal da Relação do Porto desacredita futuras denúncias deste crime público e desculpabiliza futuros agressores. Quando prefere a Bíblia e o Corão a Gustave Flaubert e à sua Madame Bovary para atenuar a brutal agressão com uma moca com pregos a uma mulher, ou quando retira a pulseira electrónica a um condenado por rebentar a soco o tímpano a outra, este juiz desembargador não está apenas a falar-nos das suas leituras predilectas.

Discursos assim, sobre algo tão reprovável como é este tipo de violência, intimidam as denúncias, incentivam os agressores, mas não provocam a significativa indignação social na esfera pública, no Parlamento ou até na classe. António Barreto já o tinha dito aqui no último domingo, manter essa independência judicial intocável “deixa que os valores boçais do preconceito e do desprezo pela dignidade das mulheres (e dos homens...) prevaleçam”.

As denúncias de agressões domésticas só começaram a ser devidamente respeitadas quando foram criados espaços próprios para atendimento às vítimas nas esquadras (um trabalho incansável de Teresa Rosmaninho), casas de abrigo para as acolher e toda a pressão que esteve na origem da classificação da violência doméstica como crime público.

São vários os casos de decisões judiciais que nos comprovam que o tema carece de maior especialização por parte da magistratura e não só. Neste cenário de contemporização generalizada, a criação de tribunais especializados para o julgamento destes casos não é despicienda, tal como não o foi a criação de um atendimento especializado às vítimas que pretendiam denunciar o seu caso. O sistema judicial dirá, na certa, que isso abrirá um precedente. Talvez seja verdade. Mas a maior verdade é que não há um crime desta gravidade que seja tão tolerado como este. É preferível um precedente à prevalência do femicídio

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