Fernando Tordo: “Temos vozes que podem cantar com qualquer cantor ou cantora do mundo”
Fernando Tordo lança o seu novo disco, Duetos, em dois espectáculos. Esta quarta-feira no CCB, em Lisboa (às 21h), e dia 2 de Fevereiro no Coliseu do Porto (21h30). Com um octeto, convidados e algumas surpresas.
O entusiasmo com que Fernando Tordo voltou do Brasil em finais de 2017 para celebrar os 70 anos em Portugal, no ano seguinte, não esmoreceu, pelo contrário. Se em 2018 subiu ao palco do Tivoli BBVA com o espectáculo 70 anos de vida e 50 de canções, agora apresenta em Lisboa e Porto o resultado de um ano de intenso trabalho de estúdio. Chama-se Duetos – Diz-me Com Quem Cantas, é um disco com 17 canções e estará disponível ao público já durante o primeiro concerto, no Grande Auditório do CCB. Esta quarta-feira às 21h, com um octeto e convidados. No dia 2 de Fevereiro será a vez do Coliseu do Porto, às 21h30.
Com canções de várias épocas, umas mais conhecidas e outras menos, participam no disco Héber Marques (HMB), Rita Redshoes, Camané, Maria João, Anabela, Ricardo Ribeiro, Carminho, Rui Veloso, Herman José, Tim, Marisa Liz, Carlos Moisés (Quinta do Bill), Jorge Palma, Raquel Tavares, Os Quatro e Meia, Capicua e Filipe Manzano Tordo, filho do cantor e pianista clássico, que a quipela primeira vez com ele, como diz Fernando Tordo ao PÚBLICO: “Vai tocar Os cantores da minha terra, que tem um arranjo do saudosíssimo José Calvário. Gravámo-lo em Londres, para o disco Adeus Tristeza, numa altura em que até andávamos a contar libras para ver se podíamos contratar um acordeonista! Agora o Filipe (que é professor do Conservatório mas não consegue trabalho como músico em Portugal) vai tocá-la, em rigoroso exclusivo, a meu pedido.” Não só. Também vai tocar uma composição do pianista ucraniano Nikolai Kapustin. “É um extraordinário compositor para música clássica e também para jazz. E a peça, complexa, é extremamente bela.”
Com agendas complicadas, todos gravaram com ele no estúdio (Namouche, em Lisboa). Ou quase: “Gravámos todos em simultâneo à excepção da Capicua, já muito grávida naquela altura, que estava a gravar um disco.” É também a única que ele não conhece pessoalmente, os contactos foram à distância, mas o resultado foi, para ele, muito satisfatório. “Canta fora do tempo mas dentro da ambiência, dá-lhe uma interpretação fantástica no respeito pela letra e surpreende.” Por isso, embora ela também não possa estar agora nos palcos, Tordo arranjou forma de “inclui-la”: “Tenho preparado um momento especial, de gratidão.”
Conjugar vozes e histórias
Como foram escolhidas as canções? E as vozes? Pela conjugação de ambas e de algumas histórias. “Para gravar um disco chamado Duetos tinha de pensar assim: não posso deixar de convidar o Jorge Palma, que vai cantar o Cavalo à solta porque já a queria cantar há muito. Ou o Rui Veloso, com Só ficou o amor por ti. Depois há o N.º 2 – 6.º andar frente, que é uma espécie de ouriço com os picos para dentro, e tem umas palavras, no princípio, que achei que só podiam ser para a Rita Redshoes. Todos eles seguiram esse critério.”
E as ligações foram-se fazendo naturalmente. “Neste disco estou só a apoiar. Por exemplo, é uma sensação fantástica cantar um dos mais belos textos escritos para música minha pelo Ary dos Santos (Se sigo meu amor) ao lado do Ricardo Ribeiro, um dos mais fabulosos cantores que alguma vez apareceu em Portugal.” E Tordo sublinha outras grandes vozes, como as de Carminho (que canta com ele Estrela da tarde) ou Camané (a quem coube Nasceu assim, cresceu assim, com poema de Vasco Graça Moura): “É uma cantiga muito simples, feita originalmente para o Carlos do Carmo, mas o texto é muito bom. E o Camané cantou-a magnificamente.” Isso leva-o a uma conclusão: “Já impressiona um bocado estar a cantar à frente de alguns nomes da música portuguesa. Actualmente temos vozes que podem cantar em qualquer parte do mundo, com qualquer cantor ou cantora do mundo.”
Um café e uma gargalhada
Esta apreciação estende-a também a cantores e compositores de outra geração, como Rui Veloso ou Jorge Palma, enquanto vai falando de casos curiosos ou surpresas, durante as gravações. “O Héber Marques [dos HMB], que eu não conhecia, apareceu com a lição toda aprendida e canta magnificamente. Mal ouviu o playback de Adeus tristeza, engrenou imediatamente e a introdução ficou gravada à primeira.” Como sucedeu, aliás, com a fadista Raquel Tavares: “É uma coisa única, a gravação dela. Cantou sozinha, quando eu estava no estúdio, e chegou ao fim extática, gelada. Sem repetições, à primeira. Fantástico.”
Há ainda o toque único de Tim em O Café ou a gargalhada de Fernando no meio de O rato roeu a rolha, quando Maria João electriza as palavras no seu jeito único. Ou Os Quatro e Meia, de Coimbra. “Têm dois ou três belíssimos músicos, mas principalmente têm dois cantores maravilhosos. Pediram para fazer o arranjo [o anterior era de Pedro Osório].”
Craques das novas gerações
As abordagens musicais variam, das proximidades do jazz à soul, ao rock, ao fado, ao funk. “Isso tem muito a ver com a minha música, que tem essa variedade. E muito a ver também com o trabalho de arranjos do Valter Rolo e do Lino Guerreiro, porque eles quiseram muito gravar este disco comigo.” Músicos das novas gerações, que ele vai conhecendo e elogia, como já aqui fez há um ano. Assim: “Gente muito jovem, mas que já são grandes craques, orquestradores, arranjadores, professores.” E trabalhar com eles já deu este disco.