Investigar corrupção nos prazos legais “é uma ilusão”, avisa novo director do DCIAP

Albano Pinto explicou na sua tomada de posse que subdividir os megaprocessos pode dar mau resultado.

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Nuno Ferreira Santos

O novo director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Albano Pinto, diz que é uma ilusão pensar que a criminalidade económico-financeira mais complexa pode ser investigada nos prazos previstos na lei. Tal como é ilusório, acrescentou, pensar que os megaprocessos se resolvem dividindo-os em inquéritos de menor dimensão, ou que os crimes de "colarinho branco" passam exclusivamente pela prova directa.

O magistrado falava na cerimónia da sua tomada de posse como director do departamento do Ministério Público que se dedica à investigação da criminalidade mais complexa e organizada. O DCIAP inclui não só os delitos económico-financeiros, como também o terrorismo e o grande tráfico de droga. Num futuro próximo, poderá ainda abranger o tráfico de pessoas, em especial o de migrantes.

“É uma ilusão pensar que as formas de corrupção mais engenhosas possam ser investigadas em curto espaço de tempo, nomeadamente nos prazos previstos pelo Código de Processo Penal”, avisou Albano Pinto.

O que tem acontecido nos últimos anos é que os magistrados que têm em mãos este tipo de casos vão sendo autorizados pelos seus superiores hierárquicos a prorrogar o prazo de conclusão das investigações muito para além do previsto na lei. Um procedimento que é tido como legal, uma vez que estes prazos são encarados como sendo meramente indicativos, e não obrigatórios. A Operação Furacão, por exemplo, demorou mais de dez anos a investigar. E até que fosse produzido o despacho de acusação da Operação Marquês foi preciso estender a data-limite do inquérito três vezes. A morosidade própria deste tipo de inquéritos deriva, entre outros factores, da necessidade de perícias financeiras "profundas e esgotantes", mas também da necessidade de as autoridades nacionais terem em muitos deles de pedir diligências a congéneres estrangeiras, que não controlam, justificou Albano Pinto. 

Por outro lado, observou ainda o procurador no seu discurso de tomada de posse, subdividir os megaprocessos pode dar mau resultado: existe o risco de se perderem as conexões existentes entre os diferentes factos em causa, ou até entre os vários arguidos de determinado processo. 

Prova directa é difícil

O novo director do DCIAP mostrou-se ainda surpreendido com os obstáculos que alguns magistrados ainda levantam à apresentação de provas indirectas por parte de quem investiga este tipo de criminalidade – apesar de as convenções internacionais relativas à corrupção o permitirem expressamente.

“É uma ilusão pensar que neste tipo de crimes – como também nos sexuais – a prova possa ser directa. Pensar isso é supor que a psicologia do delinquente tem a suprema cortesia de realizar as acções criminosas diante de um operador cinematográfico para depois ter a satisfação de projectar o filme na sala do tribunal”, comparou. “É surpreendente que de vez em quando, e apesar dos instrumentos internacionais que obrigam a aceitar esse tipo de prova, a questão seja levantada quando estão em causa crimes, sobretudo económico-financeiros, onde o poder e o dinheiro dos seus autores levam à sofisticação da sua prática e ao hermetismo e camuflagem da mesma”, criticou. E todos têm obrigação de lutar contra o enriquecimento ilícito, incentivou o novo director do DCIAP. 

"Se, com receio do erro judiciário, o juiz tivesse de abster-se, mesmo quando a cadeia dos indícios leva, logicamente, a uma conclusão, a justiça penal podia fechar as portas", concluiu Albano Pinto. 

O novo director do DCIAP tem 63 anos e foi escolhido pelo Conselho Superior do Ministério Público para dirigir este departamento nos próximos três anos. 

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