Crónica de uma derrota anunciada
O Conselho Nacional do PSD acabou num anticlímax porque a estratégia pífia e fora de tempo de Luís Montenegro assim o determinou. Mais do que uma manifestação de força de Rui Rio, o que aconteceu foi uma prova de inconsistência e de fraqueza dos seus opositores.
Quando, no sábado, Rui Rio anunciou a sua intenção de apresentar uma moção de confiança no Conselho Nacional do PSD houve quem acreditasse que o seu gesto representava um acto de coragem, quando não mesmo um gesto de compreensão em relação ao pedido de “clarificação” dos seus opositores. Como esta madrugada se confirmou, a iniciativa de Rio esteve longe de ser uma reacção destemida ou uma cedência às pressões da ala Montenegro. Foi apenas um gesto calculado de quem tinha as espingardas contadas e sabia que só a indecisão de uns poucos poderia ameaçar a sua continuidade no cargo. Bastava-lhe mostrar contundência na argumentação, algum dramatismo e, quem sabe, uma pitada de melodrama como a que Luís Filipe Menezes acrescentou, para garantir o poder que jamais lhe saiu das mãos.
O Conselho Nacional do PSD acabou assim num anticlímax porque a estratégia pífia e fora de tempo de Luís Montenegro assim o determinou. Mais do que uma manifestação de força de Rui Rio, o que aconteceu foi uma prova de inconsistência e de fraqueza dos seus opositores. Por muito que a gestão política de Rui Rio seja sofrível e condenável, a turbulência permanente, o ambiente conspirativo, a ausência de substância e a falta de razões maiores para o destituir sem que pudesse mostrar o que vale em eleições são-no muito mais. Por muito dramatismo que o conclave tenha suscitado, a militância do PSD ainda é capaz de distinguir o que é real e o que é encenado e, percebido o logro, foi-lhe fácil optar pelo certo e seguro.
No desespero da causa perdida, restava à oposição maquilhar a derrota com formalismos estatutários sobre a metodologia do voto — uma “fantochada”, disse Pedro Pinto. Era aqui que poderiam encontrar alguma legitimidade para insistir no medo de Rio ou no condicionamento da liberdade dos militantes. Até aqui se percebeu uma disputa entre amadores e um profissional da política pura e dura. Rui Rio deixou marinar a ameaça velada e o protesto para, no final, aparecer magnânimo a pedir o voto secreto. Até neste detalhe se percebeu que o que estava em causa era uma tentativa de destituição do líder sem consistência nem viabilidade.
Terminada a refrega com uma vitória por 75 votos, seria natural acreditar que Rui Rio saiu do Conselho Nacional com o seu poder reforçado. Essa crença, porém, está longe de ser garantida. Rio pode ter calado a oposição interna, mas o partido que lidera ficou mais fragilizado. Alguns dos melhores quadros do PSD serão excluídos, a dissidência estará atenta a deslizes ou aos resultados das eleições europeias e poderá haver quem pressinta que o futuro das suas carreiras políticas acabou ali e se sinta atraído pelo canto da Aliança de Santana Lopes. Acreditar que Rio é dado ao perdão ou sequer à condescendência é desconhecer a sua pulsão autoritária e a sua intolerância à crítica ou ao desafio.
Com o caminho aberto, Rui Rio tem uma segunda oportunidade para colocar o PSD na frente da oposição ao Governo. Com ou sem vozes críticas a criar ruído, vai ter de mostrar mais do que mostrou. Se continuar a ser incapaz de afirmar as propostas que o Conselho Estratégico definiu, se não se libertar da acusação de que é uma muleta de António Costa, se permanecer incapaz de atrair ao PSD quadros qualificados o caminho que hoje abriu levará o PSD ao precipício. Será a última oportunidade para Luís Montenegro e dos seus apoiantes reclamarem os louros da presciência e de afundarem no esquecimento o passo em falso que deram por estes dias.